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Perigo à espreita

Por admin

·Em insegurança total, crianças pilotam canoas transportando pessoas e bens para uma ou outra margem do rio

Na travessia do rio Incomati, de Manhiça a Calanga, não há garantia de segurança para pessoas e bens. Com efeito, a mesma é feita de canoas pilotadas por crianças até 14 anos de idade, o que periga a vida de todos: transportados e transportadores. A situação complica-se nos dias em que o rio aumenta de caudal e as águas tornam-se furiosas.

A travessia do rio Incomati para Calanga a partir da zona da Manhiça esconde grandes perigos. A segurança não existe. Os utentes das canoas que ali fazem este serviço fecham o olho à situação. As autoridades também. Mas um dia, se não se intervir para melhorar a situação, acordaremos com gritos de choros e luto.  

Ainda não há registo de nenhum naufrágio no local, mas o apetite de querer encher o bolso mais rapidamente que se pode, e a ingenuidade da idade, faz com que as crianças que pilotam as canoas se aventurem a realizar o seu negócio em dias desaconselháveis.

domingo esteve no local e testemunhou esta situação de perigosidade na travessia para Calanga. Conversou com os meninos-pilotos das canoas transportadoras de gente que vivendo na Manhiça e tendo machambas na zona de Calanga, assim como com os utentes destas embarcações. Todos disseram não verem perigo na forma como são transportados e nem tinham medo de crocodilos, mesmo sabendo que abundam e matam no rio Incomati.

De manhã e à tarde atravessam para a zona de Calanga residentes de Manhiça que têm daquele lado suas machambas junto às plantações da empresa açucareira de Maragra. Um único “bilhete” de cinco meticais basta para uma pessoa ir e voltar. 

Os transportados dizem que não correm nenhum perigo de vida e os transportadores afirmam que nada pode acontecer de mal. Mas todos são unânimes em dizer que “quando o caudal aumenta, sobretudo em tempos chuvosos, não vale apena atravessar”, o que nem sempre é obedecido, pois, aventureiros não faltam.

Os transportadores fazem escala para levar gente para a outra margem do rio. Cada operador tem uma semana para transportar pessoas e seus bens e depois cede lugar a outros. Enquanto espera a sua escala, algumas canoas vão sendo utilizadas para a actividade pesqueira, também exercida pelas crianças e seus pais.

Facto curioso é de haver atrevidos que fazem a travessia andando a pé, mesmo com a água ao pescoço. Desses sem medo fazem parte crianças, que nadam de uma margem para outra sempre com a esperança de que os crocodilos não andam por perto.

E é por não temer de crocodilos que, em dias de calor, mulheres e homens de Manhiça descem para a travessia, nadam e curtem a vida como se estivessem numa verdadeira praia oceânica.

 “Aqui não há crocodilos. Só lá naqueles charcos das machambas de açúcar é onde por vezes surgem jacarés”, explicou-nos o velho Samuel Ngulele, depois de desembarcar de Calanga na companhia da sua família.

Entretanto, depois da nossa jornada de trabalho, que nos levou ao rio Incomati através de um perigoso declive, concluímos que a vila de Manhiça é mais do que aquilo que está ao alcance dos olhos de quem a atravessa via Estrada Nacional Nº1 que a divide. Com alguma aplicação das autoridades municipais, o turismo pode muito bem ser assentado junto ao rio Incomati, desde que todos os perigos estejam acautelados. Mãos à obra!

Assim ganhamos pão

e material escolar

– Defendem-se as crianças

Paulo Micas Macuacua e Lucílio Manuel Macuacua são irmãos. O primeiro tem 11 anos e frequente 4ª classe na Escola Primária da Manhiça, onde seu mano, com 13 anos é aluno da 5ª classe.

Encontramo-las a limparem a sua canoa que entraria em acção na semana seguinte. À primeira pareciam tímidas, mas aos poucos foram compreendendo que estavam perante pessoas de boa fé que as vinham visitar.

“A canoa é do nosso pai, que é trabalhador da Saúde. Quando não estamos na escola, estamos aqui a ajuda-lo a ganhar algum dinheiro para compra de pão, comida e material escolar”, explicou Paulo.

“ Hoje não estamos a transportar as pessoas porque a semana não é nossa”, acrescentou Lucílio. E nós ficamos sem saber o significado da expressão “a semana não é nossa.”

“Estamos a preparar a nossa canoa para a semana que se segue, que é nossa”, mais confusão para as nossas cabeças, mas do questionamento ficamos a saber, primeiro, que a travessia custa cinco meticais ida e volta.

“ Cada pessoa que quer atravessar paga cinco meticais para ir e voltar. Cinco meticais servem para ida e volta. É como se ida custasse dois meticais e meio, assim como o regresso. Cada canoa tem uma semana de trabalho. Da escala, nós entramos em acção na próxima segunda-feira ”, narrou Paulo.  

Um outro grupo de crianças não perdeu tempo em nos vender o peixe que acabava de pescar, ao preço de 200 meticais seis unidades. Deu para um almoço inesquecível à beira do rio Incomati, cujas águas serviram para o nosso banho do dia, já que fomos convencidos que os crocodilos não nadavam por perto.

Manuel Meque

Fotos de  Inácio Pereira

 

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