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CENOE estuda pára-raios tradicionais

Por admin

O Centro Nacional Operativo de Emergência (CENOE), instituição subordinada ao Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), está a levar a cabo um projecto sobre protecção contra descargas atmosféricas (relâmpagos ou raios) com a finalidade de incluir os resultados num manual de procedimentos no qual a ciência e a tradição vão se abraçar, casar e caminhar de mãos dadas com vista a reduzir as mortes provocadas por este fenómeno.

O estudo sobre as práticas tradicionais de protecção contra trovoadas e relâmpagos ainda nem chegou a meio e tudo o que foi encontrado até aqui faz rir e ao mesmo tempo obriga a uma reflexão, pois a maior parte dos entrevistados acredita que alguns relâmpagos não são tão naturais assim. “São criados por feiticeiros para acabar com a vida de um vizinho bem-sucedido”, dizem.  

Crenças a parte, este estudo resulta do facto do Governo ter constatado que depois do INGC ter conseguido dominar as cheias, através do estabelecimento de um sistema eficiente de Aviso Prévio e boa prestação dos Comités Locais de Gestão de Calamidades (CLGC), os raios estão a causar vítimas mortais um pouco por todo o país, impondo-se alguma intervenção neste domínio.

Dados referentes à época chuvosa de 2012 e 2013 indicam que pelo menos 43 pessoas morreram e um número não especificado de infra-estruturas foram danificadas depois de atingidas por relâmpagos, o que leva o INGC a acreditar que nos dias que correm as cheias matam menos que as descargas atmosféricas.

Assim sendo, o Departamento de Monitoria do CENOE foi recentemente instado a realizar um estudo sobre os hábitos tradicionais das comunidades no que se refere à protecção contra este fenómeno natural, o qual já cobriu várias localidades do distrito de Inharrime, na província de Inhambane, e deverá prosseguir no distrito de Íle (na Zambézia), Zóbwe ( em Tete) e no distrito de Catandica ( na província de Manica).

A escolha destes locais, conforme apurámos, foi feita mediante o grau de vulnerabilidade que pode ser fruto de questões climáticas, vegetação, tipo de infra-estruturas e altitude, ou até mesmo pela combinação destes e outros factores.

COLHER DE PAU

“AFUGENTA” RELÂMPAGOS

Do pouco que foi colhido até agora sobram evidências de que a mente humana é assustadoramente fértil quando o assunto é buscar formas de se manter vivo perante ameaças naturais. Salvador Domingos, oficial de Monitoria do CENOE, conta que as populações até agora ouvidas usam plantas e utensílios domésticos para se defenderem dos raios.

Para se chegar aos resultados pretendidos, técnicos do INGC e do CENOE elaboraram um questionário que, depois de preenchido no contacto com as comunidades, vai oferecer informações sobre a periodicidade e impactos dos trovões e relâmpagos.

Segundo aquele técnico, a população de Inharrime acredita que uma casa que tem bananeiras (sim, aquela árvore que dá bananas) está menos exposta aos relâmpagos. Como se isso fosse pouco, outros levam a sério a ideia de que quando as trovoadas começam a intensificar, o melhor a fazer é expectar uma catana ou enxada no quintal para “afugentar” os raios.

Porque a mente humana é fértil por excelência, a equipa de Salvador Domingos, profissional de meteorologia, ficou boquiaberta ao ouvir de líderes comunitários que na época chuvosa, a população de certas partes de Inharrime coloca colheres de pau por cima das casas e, pronto. Já tem um pára-raios.

A ideia de recolher este tipo de informação, segundo Maurício Xerinda, director do CENOE, visa fazer um casamento entre os métodos cientificamente provados de protecção e os hábitos das comunidades para se produzir um manual único que será difundido nas comunidades.

Com efeito, em algumas comunidades, a crença de que os relâmpagos matam porque são “encomendas” ou “mísseis” está tão fossilizada na consciência geral que alguns líderes comunitários, ao ouvirem que uma equipa do INGC/CENOE está a recolher informação sobre como fogem dos relâmpagos, pedem a intervenção dos técnicos para a detenção dos “produtores de mísseis”. “Somos obrigados a explicar que o que queremos é perceber o que eles fazem para se protegerem, quais são os seus meios de defesa, e não procurar culpados”, explicaram técnicos do INGC.

Para além de colheres de pau, bananeiras, catanas e enxadas, existe a ideia de que a aspersão de sal e cinza pelos cantos da casa pode afugentar eventuais “maus espíritos”; que um palito de fósforo colocado por cima da orelha ou no cabelo durante uma noite de insónia, pode afastar os pesadelos para bem longe, enfim. No desespero, outros acreditam que num banho em água salgada desvia o olhar do diabo.

Voltando aos relâmpagos, Salvador Domingos aponta que em Inharrime acredita-se que uma planta conhecida por “Nhanga Nhafula”, quando plantada nos quatro cantos do quintal pode funcionar como fio-terra, ou se preferirmos, como um potente antimíssil.

CASAMENTO COM A CIÊNCIA

O que anima neste projecto é que, no final, o CENOE pretende fazer uma espécie de intercâmbio de técnicas tradicionais e cientificamente comprovadas para fundi-las num manual de procedimentos que deverá ser divulgado nas comunidades para a protecção das mesmas.

No tal manual, o capítulo reservado à ciência deverá conter elementos como a necessidade de se evitar usar aparelhos eléctricos e electrónicos enquanto houver descargas atmosféricas, como por exemplo, fazer chamadas telefónicas.

Por outro lado, os cientistas entendem que num momento de ocorrência de trovoadas e raios deve-se evitar ao máximo dar braçadas em piscinas ou rios. De igual modo, recomenda-se que se evite estar próximo de curais com vedação metálica, abandonar lugares abertos, como campos de futebol e não se abrigar debaixo de árvores.

Mundo curva-se

aos “pés” do INGC

A Organização das Nações Unidas para a Redução de Risco de Desastres (UNISDR) esteve recentemente reunida em Abuja, capital da Nigéria e, mais uma vez, teceu rasgados elogios a Moçambique pelos progressos que vem registando na gestão de calamidades naturais, o que tem ajudado, em grande medida, a reduzir o número de óbitos .

Os elogios das Nações Unidas coincidiram com a divulgação de um estudo realizado pela Universidade de Texas, dos Estados Unidos da América (EUA), sobre Alterações Climáticas e Estabilidade Política Africana, no qual se aponta que Moçambique possui uma das mais importantes histórias de sucesso em África em matérias de gestão de risco de desastres.

O referido estudo, de mais de 200 páginas, analisa o estado de prontidão de dez países africanos, nomeadamente Senegal, Gâmbia, Gana, Togo, Etiópia, Quénia, Zâmbia, Malawi, Zimbabué e Moçambique na prevenção e reacção aos desastres naturais, nomeadamente inundações, secas, sismos e tempestades tropicais.

Entre outros elogios, aqueles investigadores argumentam que o facto de Moçambique ter registado uma redução substancial do número de mortos e feridos resultantes de desastres naturais “é mérito de conquistas genuínas”.

A mesma opinião é partilhada por representantes de instituições africanas ligadas à gestão de calamidades naturais, universidades, da União Africana e da UNISDR que entendem que Moçambique fez “excelentes progressos” desde o dramático cenário que o mundo assistiu no ano 2000. Aliás, elogio semelhante tinha sido feito em Genebra, capital suíça, há cerca de dois anos e constou de um importante relatório divulgado na época.

Reunidos para harmonizar a posição africana sobre a segunda fase da Plataforma de Acção de Hyogo, que vai ser ratificada em Março do próximo ano na cidade japonesa de Senday, aqueles representantes do continente africano sublinham as conclusões do estudo da Universidade de Texas.

Com efeito, Maurício Xerinda, director do Centro Nacional Operativo de Emergência (CENOE), que participou no encontro de Abuja, aponta que as razões que levam o mundo a se curvar aos pés de Moçambique vão desde a superação feita desde o ano 2000 até às reformas institucionais, organizacionais e legais.

O mundo elogia o facto de termos feito uma estruturação e alteração do objecto do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), para deixar de ser reactivo e passar a ser mais preventivo e por termos criado condições para que todos os actores que operam no domínio da gestão de calamidades e de redução de risco de desastres passem a obedecer a um comando único do governo, coisa que não acontecia até ao ano 2000”, disse. 

Por outro lado, Moçambique é assumido como pioneiro, em África, no estabelecimento de uma estrutura que abarca Governo, sociedade civil, sistema das Nações Unidas, organizações não-governamentais e sector privado. Por outro lado, este continua a ser um dos poucos países africanos que possui um sistema de Aviso Prévio que envolve as comunidades, através dos Comités Locais de Gestão de Calamidades Naturais (CLGCN).

No que se refere à legislação, Moçambique também faz parte de um restrito grupo de países que possui uma Lei de Gestão de Calamidades a que se agregam leis assessórias como a Lei de Conservação e a Estratégia Nacional de Adaptação e Mitigação de Mudanças Climáticas.

Hoje Moçambique demonstra um nível considerável de capacidade institucional para a gestão de desastres graças a um elevado nível de percepção do risco, que contribui para encorajar o Estado a investir em programas e políticas, e também pelo facto de a economia continuar a crescer e haver apoios externos consideráveis para apoiar esses programas”, indica a equipa da universidade de Texas.

Na reunião de Abuja, para além de acolher elogios intermináveis, a delegação moçambicana deu a conhecer os progressos que o país tem estado a registar no quadro da Primeira Plataforma de Acção de Hyogo (HFA1), apresentou as actuais políticas e nível de organização institucional e a experiência que tem estado a colher pela simbiose de informação meteorológica e hidrológica para a previsão de calamidades e face às mudanças climáticas, entre outros.

 

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