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As viúvas de Magude

Por Idnórcio Muchanga

As viúvas de Magude são cheias de atitude. As suas virtudes ultrapassam as fronteiras do que se assume como marcadamente feminino. Dispensam o verniz, cerram o punho e exibem músculo, para enfrentar qualquer ser humano (homem ou mulher) que transgrida os limites da sua paciência. A sua desenvoltura assusta inclusive os afoitos. Elas são elas. Aquelas que não se desmancham em fofurices. O seu lema é trabalhar. Casar outra vez?! Nem pensar… Após a perda dos respectivos companheiros, mergulham no labor e cuidam com amor de quem resolveram trazer ao mundo.

Esta é a filosofia que norteia a vida de 5 mulheres viúvas de Magude, um pedaço da província de Maputo, com mais de 63 mil habitantes.

domingo esteve lá, registou e trouxe estratos de conversas sinceras e descontraídas com Otília Ngwenha, mãe de 6 filhos, Albertina Mazive, também de 6, e Sandra Mundlovo, mãe de 3 filhos. Ranita Cossa, de 34 anos, e Lúcia Chongo, de 41, completam esta selecta lista de mulheres que se assumem como poderosas no sustento do lar e sem vontade de casar mais uma vez.

Os seus relatos são surpreendentes.

Sandra Mundlovo, de 29 anos, agricultora, mãe de 3 filhos (o mais velho com 18 anos de idade), dá o pontapé de saída nesta viagem pelo espaço. Perdeu o marido em 2017, em circunstâncias por esclarecer. Suspeita que tenha sido envenenado, a avaliar pelos sintomas que o levaram à morte.

Conta que a chamaram para um local onde se acredita que o finado teria ido parar com o intuito de recolher uma bicicleta que lhe pertencia. “Quando cheguei, encontrei-o rodeado de pessoas. Ninguém me disse o que realmente tinha acontecido. Ele tirava espuma pela boca. Carreguei-o para casa, onde morreu poucos minutos após a nossa chegada”, conta.

O episódio deixou marcas em si. E para piorar a situação afirma que o secretário do bairro impediu-a de chamar a Polícia mediante a suspeita de envenenamento. O seu companheiro foi sepultado sem que se esclarecesse o caso e “se fizesse justiça”, denuncia.

Cumprido o luto, assumiu os comandos da família, pois havia que garantir alimentos e dinheiro para custear outras despesas do dia-a-dia. Passou a viver do trabalho da terra e de outros que vêm surgindo esporadicamente em casas de família: “lavo a roupa, cultivo terrenos…”, aclara. Ao que tudo indica, não foi encontrada outra alternativa para suprir a falta que o seu esposo –que até à altura da sua morte trabalhava em Incomáti como guarda –faz.

Mas, diga-se de passagem, o desaparecimento físico da sua cara-metade, descrita por si como “estranha”, tornou-a incrédula em relação a qualquer facto, pessoa ou destino…

Sublinhe-se ainda que o presente não tem sido nada fácil. A actividade agrícola é dificultada por questões climatéricas. O sucesso depende totalmente da ocasião, sendo que, por estas alturas, a natureza não tem ajudado tanto assim. Não chove em Magude. Consequentemente, falta comida, dinheiro e alento. E não só! Afinal, quis o destino que o seu marido perdesse a vida tão cedo quanto se esperava. Esse infortúnio destroçou o seu coração, mas também o de Albertina Mazive, de 55 anos, que ficou sem o marido há aproximadamente 1 ano, vítima de doença.

O seu companheiro era um homem idoso, nascido em 1932, com um espaço imenso no seu coração. “Ele tinha muitas mulheres (oficialmente 4) e eu era a mais nova”, diz. A união com Albertina ocorreu numa altura em que ele já tinha uma idade avançada. “Já não dava muita ‘conta do recado’”, revela aos risos. De qualquer modo, dona Bête adicionou-se a esse ninho e tornou-se mais uma esposa do velho madjoni-djoni.

Texto de Carol Banze
carol.banze@snoticicas.co.mz

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