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Academia de Namaacha abandonada

Por admin

Texto de Manuel Meque

Quando em 2002 o suíço Joseph Blatter, presidente da Federação Internacional de Futebol (FIFA), perante ilustres personalidades nacionais e internacionais, cortou a fita da inauguração da Academia Mário Esteves Coluna (AMEC), ninguém imaginava que aquela infra-estrutura desportiva de formação de futebolistas muito cedo enfrentasse dificuldades que a levassem a uma progressiva degradação, que periga a sua vida na vila municipal de Namaacha, província de Maputo.

Outrora Clube da Namaacha, tendo chegado a pertencer ao Matchedje e ao Estrela Vermelha, clubes locais, apresentava-se com três campos de relva de bom aspecto.

As boas condições climatéricas que aquele ponto do país oferece eram tidas de mais-valia para o bom funcionamento daquela que se pretendia que fosse realmente uma boa escola de formação de jogadores de futebol. Hoje, não é isso que sucede.

Para além do local servir para lapidação do novo talento, clubes federados e de “bate barrigas” passaram a ser autorizados à sua utilização, o que aos poucos foi adulterando a sua função. O lugar de formação passou a ser de estágio de equipas seniores, se é que nunca lá foram treinadas forças das empresas de segurança.

Aquando da sua inauguração se disse que a Academia de Namaacha estava integrada no Projecto Golo da FIFA, o que dava esperança de Moçambique poder ter por tempo indeterminado onde formar os seus jogadores.

Mas muito cedo se provou o contrário, de formação nada avançava. Passaram por lá técnicos de reconhecido valor, mas a aberração sobreviveu.

Na altura, quem passasse por lá, quer ao meio da semana, quer ao fim de semana via petizes a jogarem a bola nos três campos incansavelmente. Hoje, fica-se toda amanhã de domingo sem ver uma criança a jogar bola nos três campos. Tudo fica em silêncio, ao modo de cemitério rural, onde até se teme chorar.

Está claro que a academia tem servido para formação de treinadores e árbitros e outros agentes desportivos, mas a sua condição física de momento deixa muito a desejar, sobretudo para a formação do futebolista moçambicano, essa que devia continuar a ser a sua principal vocação.

O COLAPSO DA SEGUNDA FASE

A primeira fase da Academia de Namaacha contemplava um campo de futebol para jogos oficiais, apesar de inclinado, com relva natural e sistema automático de irrigação, sistema de iluminação com quatro torres e igual número de holofotes; dois campos para treinos com relva natural, balneário duplo e salão para sessões diversas, para além de casas de banho debaixo da bancada, essa que tem a capacidade para três mil espectadores sentados.

Estava projectado que na conclusão da primeira fase o empreendimento passasse a ter duas piscinas em funcionamento, ora existentes. Seriam melhorados o campo de basquetebol, os dois “courts” de ténis e o parque infantil.

A fase seguinte consistiria na construção de um edifício para serviços diversos (sala de refeições, de jogos, centro médico, ginásio, sala de conferências, sistema acústico e administração).

Basta dizer que as duas piscinas continuam sem água. Houve algumas construções que servem de dormitórios. Para quem?… Mas como esperar algo de bom da segunda fase, se da primeira não se consegue preservar quase nada?  

Vamos acreditar que a Academia Mário Esteves Coluna (cerca de 5000m2) não é só para formação de jogadores. Tem igualmente outras áreas de intervenção a formação de agentes desportivos, estudos e integração desportiva e cooperação.

Mas como tornar tudo isto praticável em uma academia que já precisa de ser reabilitada em tudo, incluindo a mente dos seus responsáveis?

O verde e a esperança desaparecem

A relva verde nos campos de jogos está quase na totalidade substituída pela relva seca. Pode ser por falta de água que se faz sentir em todo o município da Namaacha, mas há sinais evidentes de negligência de quem é responsável daquela Academia erguida com fundos da FIFA. designadamente Federação Moçambicana de Futebol (FMF), que na sua inauguração prometera concluir as obras das fases subsequentes.

Um dos campos construídos ficou com uma baliza, vendo-se a outra caída e sem esperança de vir a ser levantada.

As duas piscinas que ajudariam na formação atlética dos futebolistas continuam secas.

Os balneários andam sujos e com alguma tubagem furada, permitindo o escorrer da água nos dias que chega às torneiras. Em alguns desses balneários, se avistam torneiras e sanitas estragadas. É tudo de arrepiar.

Não há dúvidas que alguns dos compartimentos da Academia à noite acomoda os sem abrigos de Namaacha e marginais, que podem fingir de guardas. Não só, há sinais de que o local, à calada da noite, é “alugado” para sessões de prostituições. Prostíbulo!

Aquilo já não se pode chamar de Academia que forma jogadores de futebol. Coitadinhos daqueles meninos ai “encarcerados” pela FMF. Talvez por terem sido trazidos de famílias pobres consideram aquilo de vida de luxo. Mas um dia compreenderão que estavam a ser aldrabados e que jamais serão futebolistas que um dia sonharam ser.

A nossa Reportagem não tinha na sua agenda a verificação do cumprimento dos acordos de patrocínios que têm vindo a ser rubricados com determinados parceiros visando ao fornecimento de produtos alimentares e de higiene aos atletas internados na Academia de Namaacha, como o assinado ano passado com a Mega & Carry, firma que se dedica ao comércio geral.

Na altura, Feizal Sidat, presidente da Federação Moçambicana de Futebol (FMF), dizia que 2013 era ano zero da Academia de Namaacha e que o ano de 2013 seria do crescimento, porque, entendia ele, que era consensual a necessidade de melhor aproveitamento dos talentos espalhados pelo país.

“Temos muitos talentos escondidos e não queremos que se percam, por isso, convidamos aos treinadores para aproveitarem esta academia, que ainda tem espaço para acolher jovens”, observava Feizal Sidat da importância de uma academia de futebol no país, experiências que noutros país tem resultados positivos.

Quando este ano por lá estivemos só podemos ouvir de dois miúdos, dos cerca de quarenta que aí frequentam futebol, dizer-nos, em resposta a uma nossa “provocação”, que “não estamos a passar mal, nem morremos de fome, muito menos dormimos em más condições.”

Não entramos para os seus camarotes nem para o seu refeitório para qualquer confirmação.

Visitamos toda a infra-estrutura desportiva propriamente dita da ex- Academia Mário Esteves Coluna (dizemos ex- Academia Mário Esteves Coluna, porque já não ostenta este nome no defronte da mesma, em letreiro descerrado no dia da sua inauguração, na presença do presidente da FIFA, Joseph Blatter.)

Vamos acreditar que a Academia da Namaacha é mais um elo de unidade nacional, por reunir jovens de todas as províncias do país, como defendia o seu director, Razaque Manhique, o ano passado. Mas isso não basta!

As condições precárias do recinto desportivo da Academia de Namaacha já preocupavam Sascha Bauer, o treinador alemão em Moçambique desde Outubro de 2011.

Aliás, no seu primeiro ano de responsável pela formação na Namaacha, Bauer enfrentou dificuldades como de falta de campo em boas condições, falta de boa alimentação e até gerir atletas que se despediam do internato que iam à escola quando na verdade iam para as barracas. E defendia que era crucial que aos atletas estudassem, porque não basta que se alimentem bem para se tornarem estrelas de futebol.

O treinador alemão acreditava que em 2013, por a chuva ter caído bem, os campos iam se apresentar “em bom estado.” Parece que não bastou a chuva ter caído bem, faltou bom tratamento da relva por parte dos seus responsáveis.

Apagado Mário Esteves Coluna!

Na fachada, em letras garrafais ficou baptizado: Academia Mário Esteves Coluna. Desse modo a FIFA procurou homenagear um dos maiores futebolistas da década sessenta, o capitão do Benfica e de Portugal, depois seleccionador nacional de Moçambique e presidente da FMF, o “Monstro Sagrado”, Mário Coluna.

Quem passasse pela vila da Namaacha lia esse letreiro e se rendia ao “Mostro Sagrado.” Via na Academia um legado que Coluna deixaria para gerações vindouras do futebol moçambicano.

Foi isso que se pretendeu com a criação daquela que devia sempre merecer bom tratamento. Infelizmente, a Academia de Namaacha vai morrendo como morreu seu patrono, a olhos dos que continuam vivos.

Há quem alie a retirada do letreiro “Academia Mário Esteves Coluna” com o litígio que opõe a direcção da Federação Moçambicana de Futebol e de cidadãos que reclamam a devolução da infra-estrutura ao dono, que é Clube de Namaacha.

Recordar que os membros de direcção do Clube da Namaacha chegaram de trancar com cadeados os portões de acesso à infra-estrutura, exigindo a retirada imediata da federação.

No entanto, a direcção da FMF vem dizendo que as exigências daquele grupo não fazem sentido, alegando que foi o próprio Governo que legitimou a reabilitação do local para funcionamento da Academia Mário Esteves Coluna. A disputa será resolvida em sede de tribunal.

Investidos dez milhões de meticais

A Federação Moçambicana de Futebol investiu cerca de dez milhões de meticais nos últimos anos na Academia Mário Esteves Coluna, não se vislumbrando onde foi aplicado esse montante.

No Relatório de Contas referente ao ano de 2013 apresentado na última Assembleia Geral realizada semana finda em Maputo, o elenco de Feizal Sidat indica que houve na Academia de Namaacha um investimento acumulado de 10.386.077.23 meticais.

No entanto, a FMF reconhece que a academia teve um fraco desempenho do ponto de vista de receitas provenientes de arrendamentos, à semelhança do campo 1° de Maio.

 

 

 

 

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