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Tragédia em alguns (poucos) actos…

Por admin

As tragédias isabelinas de Shakespeare (que incluem enredos com projectos trágicos, como Ricardo II, demonstram sua independência relativa aos modelos clássicos.

Na referida peça, Ricardo, Duque de Gloucester, começa com um monólogo no qual fala do fim da guerra, da paz que então impera na casa real inglesa e de seu descontentamento pelas festividades nas quais não pretende engajar-se, por se sentir desfavorecido pela sorte. Ele fala da sua sede de poder e dos ardis que criou para jogar o irmão George, Duque de Clarence, contra seu outro irmão, o rei Eduardo IV – uma profecia pela qual um certo “herdeiro de Edward” seria o assassino do rei.

Não se espantem por Bula-bula exibir algum conhecimento sobre o teatro. É que foi aprendendo ao assistir uma série de peças teatrais protagonizadas por algumas figuras ilustres do nosso imaginário político e não só.

Mas como para todo efeito há sempre uma causa, vale lembrar que Bula-bula convocou William Shakespeare para este terreiro por causa de uma tragicomédia isabelina testemunhada por meio mundo quer via televisão quer via facebook e whatsapp

Mas, como numa peça teatral, vamos por actos:

ACTO I: BALAS SALGADAS

A semana finda foi marcada por um acto de todo condenável: o baleamento de Jaime Macuane por indivíduos desconhecidos, na manhã da última segunda-feira, na zona de Marracuene, ao longo da estrada Circular de Maputo.

Macuane, para além de comentador no programa Pontos de Vista da STV, exibido todos os domingos, em que se faz análise política de vários assuntos que marcam a semana, é docente na universidade pública, Eduardo Mondlane (UEM).

Há poucas informações a respeito deste crime violento.

Entretanto, os juízes de plantão já descobriram o vilão por detrás do crime. Que só pode ser fruto de quem estando no poder se sente incomodado com as opiniões do Macuane. Não é esta a primeira vez que os “juízes” julgam e condenam em plena praça pública.

Bula bulatambém condena o acto mas não avança culpados porque não dispõe de matéria bastante para tal audácia. É que essa coisa de lançar búzios e fazer premonições não está ao alcance de qualquer um. Parabéns aos iluminados!

Mas não é sobre isso que Bula- bula quer falar; é de outra coisa bem estranha. Algo que também pode ser testemunhado via televisão, facebook e whatsapp. Entre várias personalidades que visitaram Macuane no leito hospitalar, uma figura chamou particular atenção de Bula- bula; não tanto pela beleza mas pelo discurso.

Ela, a referida figura, por sinal sobrinha de um grande chefe, lamentou a cena do Macuane e exigiu justiça; que não havia direito e que aquilo constituía uma contrariedade para um Estado de direito.

Se fê-lo de coração nunca saberemos mas a verdade é que no mesmo dia os colegas dela, lá nas bandas de Morotone, assaltaram um autocarro e mataram 6 pessoas igualmente inocentes. Estas seis juntaram-se a outros tantos somando números gordos de vítimas da luta pela democracia protagonizada pela Renamo. Pelo que se viu pelas imagens postas a circular, nenhum dos mortos era militar. Civis puros. Quer dizer quando as balas são da Renamo não há sociedade civil, nem Liga, nem outra coisa que se mova…

Então como pode uma pessoa condenar uma acção – o ataque a Jaime Macuane – e ser co-responsável pela matança em curso no país? Ali, pergunta-se Bula- bula, o que estava a fazer a ilustre figura? Um ensaio para uma comédia? Ou será apenas o aproveitamento da oportunidade?

A verdade é que esse episódio lembrou o discurso de Ricardo, na peça de William Shakespeare, falando da guerra e da paz. Ernest Hemingway, o escritor, disse uma vez que “toda a maldade começa em algo verdadeiramente inocente”.

Bula- bula assina em baixo!

ACTO II: BALAS AÇUCARADAS

Semana passada também registou uma agressão a um colega de profissão de Bula-bula; Cremildo Lipangue. O jovem foi violentado e ainda por cima tiraram-lhe o carro. Um four by four que certamente permitia-lhe maior mobilidade – coisa fundamental para quem quer ser jornalista de verdade – já deve estar algures bem longe ou escondido em alguma cave.

Quer dizer, não bastava tiraram-lhe o carro. Tinham que espancar o pobre moço. Deixaram-no em muito mau estado. Intriga a Bula-bulao tipo de sociedade civil que “de quando em quando” temos. Quando certo caso tem alguma conotação política, movem-se à velocidade da luz. Multiplicam-se os queixumes sob os holofotes da imprensa. As televisões são convocadas para cobrirem os gestos de solidariedade e de repúdio – apontam invariavelmente os canhões para o partido no poder – muitas vezes patéticos e claramente ensaiados para a fotografia.

Pode ser que entre os protagonistas, alguns estejam mesmo a ser sinceros. Que estejam sentidos. Mas há muitos que estão lá só para o inglês ver. E isto porquê? Porque tal sociedade civil escolhe os “alvos” a quem prestar solidariedade…

Bula-bula acha estranho que duas figuras públicas – com as devidas diferenças, obviamente – tenham sido agredidas na mesma semana mas só uma – a que está conotada com política – é que recebeu ilustres visitas que aproveitaram a ocasião para escarnecer do partido no poder. O outro cidadão, nem um pio.

Dirão alguns queBula-bula está ofendido porque Lipangue é colega de profissão e Macuane não. Errados. Estão redondamente errados. A indignação é que a história repete-se. Foi assim com o assassinato de Paulo Machava o homem do “Onda Matinal”. Ninguém tugiu, ninguém mugiu. Lembrem-se que depois houve um verdadeiro pandemónio por causa da morte de Cistac.! Agora foram-se mais seis num ataque assumidamente da Renamo. Silêncio total!

Está certo que as pessoas não são iguais mas aqui parece haver claramente umas que são mais iguais que as outras.

Viva a solidariedade que claramente está visto que todos querem ir para o céu, mas ninguém deseja morrer!

 

                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

 

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