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A nossa missão é garantir a continuidade da marrabenta

Por admin

A persistência é uma das características do grupo H2O. Começaram sem nada. Tiveram que percorrer distâncias a pé para poderem gravar suas músicas. Já com 13 anos de carreira como banda, dizem sentir-se mais responsáveis por transmitir valores musicais do que disputar protagonismo com aqueles que consideram ser mais novos. Com sobriedade afirmam: “queremos passar o testemunho”.

 

Têm legitimidade para falar como falam. Não fossem eles autores de temas popularíssimos como “Hora de ponta”, ““Xikweneti”,Vovoti”, etc. 

H2O hoje é composto por três membros, nomeadamente, Daniel Manhiça, conhecido por Vice, Francisco Manhiça, artisticamente conhecido como Del e Eugénio Lisboa, de nome artístico Treta. Pretendem alargar o agrupamento e, por conta disso, estão a trabalhar num projecto denominado “A Maneira Music”.  

Ao longo destes anos de estrada, os H20 disponibilizaram ao público três álbuns de originais. Têm projectos em manga, mas evitam falar porque consideram que os planos são sagrados e devem ser guardados a sete chaves. Mas, ainda assim, fazem uma revelação.

H2O é um nome divino, segundo contam. Foi escolhido por Daniel Manhiça, mais conhecido por Vice. Segundo ele, sendo a água um bem precioso e vital para a vida do Homem, a música compara-se ao precioso líquido, quando funciona como espelho do que acontece no dia-a-dia, mas proporcionando, ao mesmo tempo, esperança de dias melhores.

A nossa conversa acontece numa Lounge da capital do país. Chove a cântaros. Coincidência. Distraem-se com o flash da lente da câmera que, a cada segundo, regista o momento de desatenção da banda. Os H20 parecem ter medo da H20.

Originariamente constituído por artistas jovens todos nascidos no bairro de Chamanculo, na cidade de Maputo, o grupo foi oficialmente formado em 2005, quando se assumiram como artistas daquele estilo musical.

Segundo contaram, fugiram do Hip Hop para a Marrabenta, concretamente nos grupos Troços do Gueto e Bio Tec. Hoje assumem que naquele estilo musical estavam no anonimato e que mudar foi uma escolha acertada.

As coisas estavam pesadas no Rap, nós queríamos aparecer, mostrar nosso trabalho e isso era complicado. Começamos a escrever algumas letras em changana, não nos imaginávamos a “reppar” em língua changana e decidimos experimentar com a música “Xikweneti”,conta Vice.

Contudo, gravar revelou-se um bicho-de-sete-cabeças. Segundo os artistas, o estúdio da 9 FM era o mais acessível da capital, mas também concorrido. A fila era enorme, existiam muitos artistas de renome que lá gravavam e era difícil para nós. Muitas vezes ficávamos todo dia sem comer nada, a espera de oportunidade, para no fim dizerem que não íamos gravar, lembra Francisco Manhiça, artisticamente conhecido como Del. “Mas depois de muita paciência e persistência conseguimos”.

 O estrondo e a visão social

A carreira dos H2O começou e teve, de imediato, aceitação por boa parte do público. O tema “Xikweneti” foi a primeira a ser produzida pelo grupo e a dar visibilidade ao mesmo. A canção narra a história de um homem que tendo pedido emprestado dinheiro se recusa a pagar. O palco escolhido para cantar essa atitude é um bairro do imaginário do subúrbio da cidade de Maputo. Eles também são nados dessa vivência.

 Os H2o também são conhecidos pela expressão “A maneira phelasse” ou seja por nick name, um código que os identifica. Nas ruas cantarolam-se temas como “Mbuya” (amante), onde descrevem uma situação de um homem que garante melhores condições de vida a amante, negligenciando a esposa. Roçam também a pobreza urbana, na música “Marrapoi” (repolho), para além dos problemas de transporte na “Hora da ponta”.

Vamos matar a sede, foi o álbum de estreia dos H20. Lançado em 2005, possui 13 faixas. Seguiu A maneira em 2007, contendo oito temas e por fim Phelasse, com 13 músicas, em 2013. Já colaboraram com o grupo artistas como Mr. Bow, Lourena Nhate, Tabazilly, entre outros.

A produção do primeiro e segundo álbum foi da responsabilidade de Mr Dino. O terceiro foi dividido com Dj Ardiles. Os vídeos, quase todos, são gravados no bairro de chamanculo, pelas mãos de La Filmes e Dr Avo Produções. A composição é conjunta, com alguma responsabilidade imputada ao Del, responsável por compor coros das canções.

Referir que quase todos os temas dos H20 são interpretados em changana. Eugénio Lisboa, de nome artístico Treta explica porquê: fazer música enquanto se vive na cidade não significa cantar só em português. Nós sempre pensamos em pessoas que consomem e buscamos algo de qualidade. Lançar músicas sem temas fortes é como mascar pastilha e jogar para o público. O facto é que o povo precisa acreditar em alguma coisa.

Oxigenação de H2O

resulta em A Maneira Music.

O grupo conta actualmente com a participação de mais dois jovens. Dizem que a família vai crescer, pois pretendem convidar mais duas mulheres para completarem a banda. O nome desse novo agrupamento é A Maneira Music.

Revelaram que este ano pretendem lançar um CD na qual contarão com a participação dos todos integrantes. “A ideia é expandir a Marrabenta, transmitindo aos mais novos os valores da música moçambicana. Abrimos espaço para metermos novos jovens e deixarmos o nosso legado. Não é fácil caminhar sozinho. Sabemos como é isso e não queremos que jovens passem por tudo o que sofremos. O projecto vai levar três anos, disse Del.

O plano, acrescenta, inclui uma digressão pelo país e além-fronteiras vivendo os problemas sociais da comunidade e vai procurar mostrar isso nas letras. Para continuar com a caminhada da música moçambicana precisamos dessas pessoas.

FESTIVAIS

Treta, assim como o resto da banda, defende que os festivais de música devem acontecer constantemente porque fazem bem para a evolução da arte e transmitem aos artistas o espírito de reconhecimento do seu trabalho.

Segundo confidenciou-nos, H2O já participou em festivais como Marrabenta e Festival de Pandza. Sobre as viagens, a memória lembra-se vagamente de terem ido a África do Sul, para além de já terem tido a oportunidade de conhecer toda a pérola do Índico.

É gratificante ser convidado num festival, isso mostra a saúde que a nossa música tem e devem (os festivais) continuar. Achamos que a presença dos mais velhos lá é sempre boa, pois há sempre encontro de gerações e acaba se transmitindo experiência.

Sobre referências no mundo da música, nada se pode declarar. Os músicos dizem serem espelhos deles mesmo e que não nutrem admiração por ninguém. Acrescentaram que há muito que conseguem fazer o que “as estrelas” da música moçambicana fazem. Quando começamos a cantar esse ritmo, olhávamos o grupo Xtaka Zero como nossa referência, remata Treta.

Patrocínios? Andamos muito a pé

Falar de patrocínio parece ser um assunto proibido no meio do agrupamento. Ao nosso jornal, contaram que poucas vezes tiveram apoio e que muitas vezes tiveram de tirar dos seus bolsos para custear as despesas das suas músicas.

 Andamos muito a pé e ficávamos horas na porta do estúdio a espera de qualquer oportunidade. Nossa primeira música custou um valor de 300 meticais só na captação. Na altura isso era muito. Mesmo para as músicas passarem na rádio era difícil por falta de qualidade e em algum momento imaginamos que fosse discriminação por estarmos a vir de chamanculo, mas não havia qualidade mesmo, contou Del, com um sorriso no rosto.

 

 

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