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O “conclave” onde se fortaleceu a unidade partidária

Por admin

A III Sessão Ordinária do Comité Central da Frelimo arrisca-se a entrar, com letras de ouro, na história deste partido e bem como na memória colectiva dos moçambicanos, no geral, em razão da multiplicidade de decisões importantes que nela foram tomadas.

 Avultam de entre os vários assuntos ali tratados a eleição do Engenheiro Filipe Jacinto Nyusi, com uma margem expressiva de 68 por cento (depois de amealhar 135 votos num universo de 197 eleitores) como candidato do partido no poder às eleições presidenciais de 15 de Outubro, a eleição de um novo Secretário-Geral, Eliseu Machava, e sobretudo do lançamento das premissas para o desanuviamento do “clima de tensão” que precedeu aquele memorável “conclave”.

 

Estamos a falar de um encontro que antes mesmo de começar já fazia correr muita tinta. Foi tema de acesos debates, inspirou profecias e até se tornou no assunto mais badalado nas incontornáveis redes sociais. Aliás, esta III Sessão do CC chegou mesmo a assemelhar-se, a dado momento, a um verdadeiro Congresso a avaliar pela forma e conteúdo das discussões ali havidas. Foi uma sessão que esteve, desde o princípio até ao fim, envolta de uma expectativa invulgar dentro e fora do próprio partido. Na véspera do encontro dos “camaradas” era indisfarçável o clima de “ alta tensão” que pairava no seio da família do “batuque e da maçaroca”.

A atmosfera de tensão agudizou-se depois de toda polémica que caracterizou a fase imediatamente a seguir à eleição, pela Comissão Política, das três figuras para pré-candidatos da Frelimo às presidenciais de Outubro próximo, nomeadamente Filipe Nyusi, Alberto Vaquina e José Pacheco.

Nesse contexto, a direcção do partido viu-se confrontada com uma inesperada proposta avançada por alguns veteranos da Luta Armada em sede da Sessão do Comité Nacional da Associação Nacional dos Combatentes da Luta de Libertação, para abertura de espaço para que mais nomes pudessem apresentar as suas pré-candidaturas ao que aquela anuiu tendo subido para 5 o número de concorrentes internos à posição de candidato da Frelimo para as eleições presidenciais de Outubro próximo (surgiram adicionalmente as propostas de Luísa Diogo e Aires Aly).  

Esse foi apenas o prelúdio de sucessivas cenas de interpelação ao presidium da III Sessão do CC, onde Armando Guebuza, na sua qualidade de presidente do partido Frelimo, mostrou-se tranquilamente firme na condução daquele “efervescente encontro” ao ponto de, contra muitas expectativas, ter acenado a favor da participação, a título excepcional, nos trabalhos em plenário (mas sem direito a voto) dos membros fundadores e os chamados históricos da Frelimo (e inteligentemente induziu os membros do CC a fazerem o mesmo). A proposta nesse sentido foi apresentada pela senhora Graça Machel, que ao que consta foi uma das defensoras acérrimas da necessidade da abertura para a apresentação de mais pré-candidaturas.   

Como é óbvio, Guebuza foi à Escola Central do Partido Frelimo com a “lição estudada” e de sobreaviso em relação a todos avisos de “mau tempo”. Sintomático ou não, a verdade é que o presidente da Frelimo recebeu quase todas propostas, críticas e reclamações com um “romantismo” quase atípico para alguém que se assume publicamente como pessoa que não se deixa facilmente derrotar nas suas convicções. 

Consta que de entre várias propostas “picantes” que foram lançadas e aceites (sem ser necessárias acesas discussões) no decurso dos trabalhos da CC, mais precisamente na véspera do processo de eleição, uma delas sugeria não só a presença dos convidados e outros agentes (menos a imprensa) durante as diferentes fases da eleição até ao escrutínio e, inclusive, observadores de cada um dos pré-candidatos, cenário algo impensável em muitos encontros do género.   

Chegado o momento mais esperado assistiu-se à realização de um exercício espectacularmente democrático, mas que se assemelhou, em muitas situações, a um derby  “impróprio para cardíacos”.

Aliás, basta dizer que foi necessária uma segunda volta entre Filipe Nyusi e Luísa Diogo para se apurar o candidato da Frelimo. E enquanto isso roeram-se muitas unhas, coçou-se muito couro cabeludo e houve pelo menos duas evacuações de participantes à sessão por motivos ligados a subida drástica de pressão arterial.

Concorriam ainda para a mesma posição Alberto Vaquina ( que obteve  37 votos) , Aires Aly ( 19 votos ) e José Pacheco  ( com 3 votos ) os quais reconheceram a derrota e classificaram o processo como tendo sido conduzido de forma transparente (até as urnas eram de material transparente) e esteve dentro dos parâmetros  da democracia interna do partido de tal sorte que só poderia vencer o mais votado.

A eleição de Nyusi, de 55 anos de idade, decorreu em duas voltas em virtude de na primeira os dois candidatos mais votados, nomeadamente Filipe Nyusi (com 91 votos ) e Luísa Diogo (com 46 votos) não terem conseguido atingir 51 por cento dos votos validamente expressos ou, seja, para se sagrar vencedor  um deles deveria obter 50 por cento dos votos e mais 1 ( 50% mais 1 voto), como vem consagrado na Directiva sobre Organização de Eleições do Partido Frelimo.  

Quando finalmente saiu o “fumo branco” imediatamente ouviram-se aplausos e gritos polvilhados pela entoação de canções revolucionárias da Frelimo, com destaque para a célebre “Frelimo ayina mwisho” (o mesmo que “a Frelimo não tem fim”, em swahili). Foram abraços e saudações intermináveis e que denotavam uma espécie de “suspiro de alívio” por se ter atravessado tranquilamente o deserto e/ou se achado o almejado oásis no meio do deserto. Auguram-se, outrossim, momentos de muito investimento na reunificação de todas as tendências no seio da família Frelimo e uma espécie de “armistício” entre as diferentes tendências ou correntes de pensamento (há quem prefira chamar alas) para todos se concentrarem na estratégia que deverá ditar a vitória da Frelimo e do seu candidato, Filipe Nyusi, nas eleições gerais aprazadas para 15 de Outubro do ano em curso.

E, pronto, seguiram-se os abraços e saudações efusivas ao eleito e o cenário que se instalou parece ter demonstrado o grau de consenso entre os “camaradas” em torno da figura de Nyusi, onde até os outros pré-candidatos reconheceram prontamente a derrota e, como manda a praxe, cumprimentaram o candidato da Frelimo para as eleições presidenciais de 15 de Outubro. Luísa Diogo arrancou fortes aplausos quando visivelmente emocionada dirigiu-se a Nyusi e deu-lhe um abraço e felicitou descomplexadamente pela proeza.

E estava aparentemente assim transposta uma fase meio turbulenta na vida contemporânea do partido Frelimo onde a união e coesão chegaram a estar abaladas por conta de fricções de vários tipos e origens, onde a conotação e manipulação perniciosa de questões étnico-tribais parecem estar muitas vezes como uma constante motivacional. Esse continua a ser um dos maiores escolhos que a direcção e militantes da Frelimo ainda precisam de lutar para extrai-lo. 

Na ocasião, o Presidente da Frelimo, Armando Guebuza, que saiu daquela sessão com o seu peso político e liderança revigoradas, endereçou uma saudação especial ao vencedor e fez questão de sublinhar que a Comissão de Eleições fez um trabalho justo e transparente e até o escrutínio foi feito na presença de todos.

Dirigindo-se ao candidato, o timoneiro do partido no poder desafiou-o a ganhar as eleições de Outubro porque e frisou: “é para vencer as eleições de Outubro e todos unidos marchemos para a vitória.

Nós dissemos em cada uma das nossas intervenções de que havemos de escolher o nosso candidato. O candidato de toda a Frelimo e que nós acreditamos que é candidato de grande parte do povo moçambicano. Vínhamos muitos, todos nós, contribuindo para se encontrar a melhor solução e depois escolhemos o nosso candidato. Os camaradas que concorreram prestaram um grande serviço não só à Frelimo mas também à nação moçambicana”, disse Guebuza

Importa referir que Filipe Jacinto Nyusi é natural de Namau, distrito de Mueda, província de Cabo Delgado, formado Engenharia Mecânica e Mestrado em Gestão pela Universidade de Victoria, em Manchester, Inglaterra. Até à data da sua eleição Filipe Nyusi desempenhava as funções de Ministro da Defesa Nacional e é membro do Comité Central. É casado e pai de quatro filhos. 

 

José Sixpence, Jaime Cumbana e Abibo Selemane

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