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O MEDO INJUSTIFICADO PELOS CADÁVERES

Por admin

“Mas o varão vigoroso morre e jazendo prostrado; sim, rendendo o homem o espírito, então onde está ele?” – Job (Jó) 14:10

Neste mundo em que vivemos, todos temos medo de alguma coisa, alguns, devido a uma experiência amarga, outros por simples irracionalidade. E os donos da língua que nos serve de veículo de comunicação entre nós e com o resto do mundo ensinam-nos que o nome genérico de qualquer temor chama-se fobia, resultado da aversão ou medo psiconeurótico a objectos ou situações particulares. Portanto, os nomes das fobias são derivados da conjunção do nome grego que indica a coisa ou objecto temido ao sufixo fobia. Por exemplo, o medo pelos mortos chama-se necrofobia; e o medo doentio pela morte iminente chama-se tanatofobia. Muita gente vive convencida que é imortal e, por isso, à medida que a pessoa cresce e o seu corpo consolida o seu aspecto físico, contemplando-se ao espelho cheia de narcisismo e, convencida, acha-se perfeita, e a mais bela e atraente das criaturas produzidas pela “Mãe-Natureza”. Algumas pessoas rendem-se a si próprias, homenagem, desabafando de ombros inchados, algumas até inventam canções enaltecendo a sua beleza física e com ar presunçoso, gritam: “eu sou bonita, sou fofuda!” (ni xongi njani). A pessoa esquece-se que só um dia, num abrir e fechar de olhos, um dos grandes mistérios, que é o maior presente com data de validade inadiável e irrevogável de que a “Mãe-Natureza” a dotou, a VIDA, irá abandonar aquele “escafandro”, e aí aquilo de que tanto se orgulhava irá transformar-se inexoravelmente num cadáver. Num lixo. Um esterco sem proveito, destinado a ser enterrado o mais profundo possível ou reduzido a cinzas, para não constituir um incómodo para os que ainda vivem. Afinal, como escreveu Fernando Pessoa: “Todo o Homem é um cadáver adiado”. Sem o maravilhoso fôlego da VIDA, o corpo, nem a beleza, nem os perfumes nem as maquilhagens, nem as mentiras do espelho, lhe valerão de nada. É que a “Mãe-Natureza” fez-nos assim mesmo: voltados e apegados a nós próprios, esquecendo-nos de que mais tarde ou mais cedo o corpo abandonado pela alma de nada servirá senão para o gáudio dos vermes ou das labaredas do fogo. Ao contrário dos defuntos, pessoas que morreram faz muito tempo, esses, são idoltrados por muita gente, alegadamente porque lhes podem proteger lá do além onde “se encontram”. Exemplo disso estão as inúmeras visitas que os vivos fazem às campas dos seus finados. Quanto aos cadáveres ainda frescos, de um modo geral, são temidos.Perante um cadáver, as pessoassentem a sensação de pavor, de saber que um dia elas também estarão naquele mesmo estado. Eu penso que esse medo é injustificado, porque não há qualquer risco de acidente para quem está morto. A morte é algo que não se experimenta: uma vez morto, não há mais que temer e por isso, quando chegar a morte de cada um, a pessoa morre a sua morte e não contagia a ninguém, salvo se tiver morrido de uma doença contagiosa! Concluindo, e sem querer inocentar o pai, que provavelmente já não consegue reconhecer o corpo duma filha nua, mas a mãe, essa não tem perdão. Enterrar o corpo duma desconhecida por medo de não o observar demoradamente, acho ser uma estupidez. Os violadores das campas já provaram que um corpo sem vida não faz mal a ninguém. Apelo, pois, para prestarmos a última homenagem aos nossos entes queridos que nos deixaram, sem confundí-los com outro alguém. É muito lamentável enterrar alguém duas vezes! Que a “Mãe-Natureza” nos dê a devida coragem. Amém!

Kandiyane Wa Matuva Kandiya
nyangatane@gmail.com

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