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O efeito caranguejo dentro da Renamo

Por admin

No momento em que escrevo este texto, adensam-se com intensidade, nos círculos da oposição, os rumores sobre o interesse material de Raul Domingos em regressar à Renamo, com um objectivo 

muito bem identificado: assaltar a liderança da Renamo.

Num partido como a Renamo, que foi praticamente “o pai” dos outros pequenos partidos emergentes, como o MDM e o PDD, e cuja história política é feita de deserções, traições e incongruências de todo o tipo, este possível regresso de Raul Domingos não surpreenderia a ninguém.

Domingos foi um pacato jovem cidadão raptado pela Renamo e que subiu dentro do partido até chegar à negociador chefe nas conversações de paz de 1990-1992, e à posição de figura sénior da Renamo na Assembleia da República. Depois das eleições de 1999, foi ele quem negociou com a Frelimo a oferta sem precedentes de permitir a Renamo ter governadores em 3 Províncias (J.Hanlon&A.Nuvunga: Awepa:2003).

Nessa altura, Afonso Dhlakama, bom “tangala” que é, achou que Raul Domingos podia ser uma ameaça e rejeitou o acordo com a Frelimo, dizendo que não aceitava menos de 6 governadores e expulsou-o do partido. Domingos manteve-se na AR como independente e estabeleceu uma ONG chamada IPADE, que conseguiu apoio dos doadores, muitos dos quais antigos apoiantes da própria Renamo.

Estes doadores esperavam que Raul Domingos viesse criar a muito desejada “terceira força” fora da Frelimo e da Renamo. Dhlakama via, por sua vez, o IPADE, que mais tarde deu lugar ao partido PDD, como uma ameaça séria ao seu lugar e na CNE instruiu os seus representantes a adoptarem uma postura rígida e inflexível para com os candidatos do IPADE. Os que eram de Tete e Moatize, círculos importantes para a Renamo, foram expulsos. Foi nessa altura também que ele deixou de falar com Raul Domingos.

Renamo como machamba do MDM

Daqui Dhlakama partiu para a expulsão de Daviz Simango, levando este também a fundar um partido político, que arrastou muitos quadros dissidentes da própria Renamo, entre eles o notável político e académico Ismael Mussá. Na altura, Arnaldo Chalaua, que era porta-voz provincial da Renamo em Nampula, acusou Simango, de “fazer da Renamo a sua machamba, onde vai angariar membros” (Savana: 12/06/2009).

Comentando sobre o novo partido que acabava de surgir, o líder da Renamo disse que o MDM “não é nada”, acusando o Bispo Dom Jaime Gonçalves de ter sido o mentor ideológico do MDM.

“O Bispo Dom Jaime sempre vinha colaborando com o partido (Renamo), mas não sabíamos que ele estava a nos espionar. Mas nós já sabíamos com quem estávamos a lidar, por isso que experimentamos dar-lhe pão e ele queria levar consigo a manteiga sem alguém ter-lhe servido”, disse Dhlakama, entrevistado pelo Savana do dia 17 de Abril de 2009.

Os quadros expulsos da Renamo são os mesmos que passaram para o MDM e que, tendo sido também mandados embora ou se retirado do MDM, agora ensaiam, aparentemente, um “regresso a matar” à Renamo, porque já se aperceberam do desnorte em que ela se encontra. Quanto mais a Renamo estiver fragilizada, e Dhlakama perder a pouca lucidez que ainda lhe comanda o instinto, é melhor para eles.

Entre essas pessoas está o moribundo do Manuel Pereira, conhecido no mundo pelo seu plano de dividir o país a partir do Rio Save, usando cancelas.

A postura adúltera e de dissimulação usada há longos anos pela Renamo é uma estratégia de sobrevivência já conhecida. No pacote de reivindicações que enceta com o Governo, no Centro de Conferências Joaquim Chissano, a Renamo, tal como em 1999, apresenta um ponto famoso que chama de “questões económicas”.

Quem não conhece a história da Renamo e se cruza com esse conceito pela primeira vez, pode pensar que este partido está genuinamente preocupado com a “inclusão económica e política” e com aquilo que ela chama de “justiça social” do povo moçambicano em geral.

Mas o que preocupa a Renamo, na verdade, é conseguir dar emprego aos seus membros, através da CNE e do STAE, onde reivindica a paridade. Quando negociava com Joaquim Chissano, e dentro das mesmas “questões económicas”, Afonso Dhlakama chegou a exigir “dinheiro vivo” ao Governo, como condição para abandonar as suas reivindicações na altura.

Se isto for verdade, quer dizer que o Estado tem que pagar à Renamo para ela ir às eleições, pagar à Renamo para ir ao recenseamento eleitoral, pagar à Renamo para ela ficar calada, pagar a Dhlakama para ele vir a Maputo, etc.

A estabilidade política em Moçambique não está à venda, é uma conquista de todos, incluindo da Renamo. Talvez a do vizinho Madagáscar ou a do Egipto…

O que a Renamo quer é satisfazer-se a si própria e esse interesse económico tem uma explicação: As pessoas que davam dinheiro à Renamo, porque deixaram de acreditar que ela seria uma verdadeira alternativa à governação, a partir de 1999, deixaram de apoiar simplesmente ao partido.

Renamo cai nas urnas e patrões recuam

O apoio do eleitorado da Renamo está a desaparecer vertiginosamente. As eleições gerais (presidenciais e legislativas) tiveram lugar em 1994, 1999, 2004 e 2009, estando previstas também para 2014. Nas eleições legislativas de 1994 a Renamo teve 37,78%, o correspondente a 112 assentos parlamentares, contra 44,33% da Frelimo e 129 assentos; Em 1999 a Renamo teve 38,79% e 117 assentos, contra 48,55% da Frelimo e 133 assentos; Em 2004, a Renamo reduziu o seu voto para apenas 29,73% contra 62,03% da Frelimo, que ganhou 160 assentos. A Renamo só teve nesse ano 90 lugares na AR (MARP:2010).

Nas presidenciais, os resultados foram os seguintes: Em 1994 Dhlakama teve 33,7% e Joaquim Chissano 53,3%; Em 1999 o líder da Renamo teve nas urnas 47,7% e Joaquim Chissano 52,03%; Em 2004 Dhlakama, já com Guebuza como concorrente, a cifra foi de 31,74%, contra 63,74% do candidato da Frelimo. Nas eleições de 2009 Afonso Dhlakama voltou a perder por números ainda mais pesados nas urnas.

O esmorecer da Renamo começou a levantar dúvidas sobre a sua capacidade de governar o país e os doadores que apoiam Dhlakama entenderam isso e passaram a dar o dinheiro da Renamo ao MDM, com a esperança de que este fizesse o que a Renamo não conseguiu fazer em 20 anos da sua ténue história como partido político.

A crise interna e a falta de democracia interna na Renamo, que levou de expulsão em expulsão de uns e de outros, fez com que Afonso Dhlakama, uma carta importante no baralho da paz em Moçambique, ficasse politicamente isolado, destroçado e sem mais fôlego para correr em urnas.

Este é mais um caso daqueles em que só muda a merda, mas as moscas são as mesmas, porque tanto na Renamo assim como no MDM as pessoas parecem ser, praticamente, as mesmas, nas suas práticas políticas e no seu nível de ambição e falta de sentido de militância.

 

 

MDM é pior que a Renamo

Fazendo fé a entrevistas dadas na comunicação social por Ismael Mussá, quando foi expulso do cargo de Secretário-geral do MDM, o MDM é pior que a Renamo e a Frelimo juntas em nepotismo.

“Aquilo é tudo família Simango”, queixava-se Mussá, destacando a falta de separação entre o Município, o MDM e a família Simango. O Dr. Ismael Mussá, que foi uma pessoa muito importante para a génese do MDM, e com a inteligência intelectual que tem, pegou nesse expediente sujo dos Simango e foi aos patrões do partido, na Europa, “queimar” praticamente o MDM.

Esta ficha menos credível despoletada por ele na Europa explica a decadência crescente de apoios externos ao MDM, e o recurso contínuo de Daviz Simango aos bens públicos e aos dinheiros do Município da Beira, para cobrir despesas do seu partido e fazer política contra a Frelimo.

As organizações e países que apoiavam a Renamo e ao MDM sentem, aparentemente, goradas as suas expectativas políticas em relação a estes partidos, e preferem investir numa alternância política em Moçambique, através de organizações da sociedade civil e da comunicação social independente.

Ismael Mussá, um homem brilhante e cheio de ideias que eu pessoalmente admiro, deu uma entrevista ao semanário “Público”, há um mês, em que anuncia publicamente a intenção de concorrer ao Município de Maputo, como independente. Esta é, digamos assim, mais uma partida, com ou sem regresso, de tantas outras partidas anteriores.

Afonso Dhlakama, porque gosta de poder a todo o custo, é uma pessoa intolerante a desobediências e insubordinações, mas resta ver como vai ele comportar-se e lidar com estes possíveis novos regressos ao seu partido. Porque na Renamo a questão material é que conta mais conta. A política activa e séria, tal como Maquiavel E Rousseau a definiram, pode ficar para depois. E Dhlakama é um líder que não faz e não deixa ninguém fazer.

Vamos ver se, no estágio em que se encontra a Renamo agora, Dhlakama vai preferir um fim horrível ou um horror sem fim!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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1 comment

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