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Ainda sobre o Estatuto do Líder da Oposição

Por admin

O Parlamento iniciou esta semana os trabalhos da sua Quinta Sessão Extraordinária, tendo também na mesa para apreciação e discussão uma proposta de lei sobre o Estatuto do Líder da Oposição em Moçambique.

Na nossa última edição nos debruçamos sobre esta matéria, considerando que na véspera e logo depois da realização das primeiras eleições gerais e multipartidárias no país, a 4 e 5 de Outubro de 1994, fomos os primeiros a advogar que tal estatuto devia existir. Nessa altura, falava-se de um “Estatuto Especial”, “Estatuto Condigno” e outras designações.

Vinte anos depois, a matéria voltou a ser tema de debate e gira agora à volta da substância do Acordo Político sobre a Cessão das Hostilidades Militares, onde foram anunciadas várias medidas visando a implementação cabal do conteúdo do documento.

Facto curioso é que o que o domingo propunha na altura ainda continua válido. O que dizíamos era o seguinte: “em eleições multipartidárias haverá sempre um partido que se vai posicionar em segundo lugar, liderando a oposição por vontade do povo que nele votou. Assim, a liderança da oposição exerce-se, por direito, em virtude do voto do povo e, por conseguinte, dentro da Assembleia da República.”

Com efeito, em eleições multipartidárias regulares como as nossas, o povo não se pronuncia sobre a individualidade que deve, em termos formais, coordenar as forças da oposição. Pronuncia-se sobre o Presidente da República e sobre o Governo e também, por via disso, sobre a oposição ao Governo.

Neste momento, Dhlakama é, de facto, líder da oposição, porque é de direito, por liderar a Renamo, que ficou em segundo lugar, mas não é líder de direito da oposição. Esta problemática seria menos controversa se Dhlakama colocasse o seu nome na lista partidária para as legislativas, pois a sua situação seria facilmente acomodada dentro da Assembleia da República.

Por isso, volvidos estes vinte anos, a questão da criação do Estatuto do Líder da Oposição em Moçambique afigura-se tão actual e crucial como a necessidade de se promover, na sociedade moçambicana, uma cultura de paz e reconciliação nacional. É que depois deste tempo todo, a Renamo nunca foi para além do segundo lugar nas eleições gerais. Dhlakama, como individualidade, figurou apenas nos boletins de voto dos candidatos à Ponta Vermelha, e foi derrotado nas cinco tentativas que efectuou, mas continuou Afonso Dhlakama, líder da Renamo, com o passado e temperamento que todos nós conhecemos.  

Quando se debate esta questão do Estatuto do Líder da Oposição fazem-se, a nosso ver, também confusões entre duas ordens de actuações distintas: a ordem jurídico-constitucional e as conveniências políticas do momento. A ordem jurídico-constitucional está clara. Agora as conveniências políticas do momento são muitas vezes obscuras. É só ouvir o que o líder da Renamo andou a dizer esta semana sobre a matéria no seu périplo pelo centro do país.

Em nosso entender, e no fundo, o que se quer dar a um líder da oposição no país é um estatuto condigno à sua posição, que, como acima referimos, é-lhe outorgada pelo povo no dia das eleições. Claro, o mesmo se concretiza num conjunto de honrarias e benesses ou mordomias que podem ou não ser questionadas.

O que acontece neste momento é que tal figura de líder da oposição configura-se em Afonso Dhlakama, que não é um cidadão qualquer. Desempenhou papel de relevo na guerra que assolou o país e na paz que se lhe seguiu em 1992, e agora, depois de Santungira.

E há outra questão que quanto a nós foge da discussão que é feita nestes tempos. É de que Afonso Dhlakama, como líder do maior partido da oposição, pode considerar-se de facto como líder da oposição, mas tão-somente e de facto enquanto a Renamo o tiver como seu presidente. Pois imaginemos, por hipótese, que a Renamo resolve destituir Afonso Dhlakama, o que é possível, segundo os seus estatutos, já que Afonso Dhlakama não é presidente vitalício. Ele continuaria a ser líder da oposição? Claro que não. Quem confere a Dhlakama a verdadeira liderança é o seu partido, na medida em que o elegeu para seu chefe.

Aguardamos a apreciação e discussão de tal estatuto para ficarmos a saber com que linhas ele se vai cozinhar, tendo em conta também o nosso texto constitucional.

 

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