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A prática desmente o discurso

Por admin

O direito à saúde faz parte de um conjunto conhecido como direitos sociais e, naturalmente, está salvaguardado na Constituição de Moçambique, que o reconhece como “direito de todos e dever do Estado”. Este desiderato é fundamental se considerarmos que o nosso país ainda enfrenta dificuldades acrescidas em quase todas as áreas.

 Conhecendo a realidade, as autoridades sanitárias, criaram o Serviço Nacional de Saúde que, de entre várias responsabilidades, tem a obrigação de garantir o mínimo de assistência aos enfermos. Entretanto, já não é mais novidade que esse serviço possui diversas falhas e, muitas vezes, coloca em risco a saúde dos pacientes.

Os relatos que nos chegam de quase todos os quadrantes e – imagine-se – até mesmo da capital do país, mostram claramente que há ainda muito trabalho de base a ser feito para que este direito social seja efectivo. Há inúmeros recursos em falta nos hospitais públicos de todo o país. Infelizmente, não é raro que os pacientes sejam atendidos em corredores lotados devido à insuficiência de quartos e de macas. A falta de equipamentos também é um dos grandes problemas. Alguns hospitais têm aparelhos muito velhos ou estragados. Além disso, alguns tratamentos e exames mais detalhados ficam restritos aos grandes centros, obrigando o paciente a deslocar-se em busca de ajuda médica… mas mesmo ai, esbarram em várias dificuldades incluindo a falta de medicamentos!

Só para ilustrar este problema, a farmácia do Hospital Geral José Macamo praticamente só tinha Paracetamol para aviar. Dezenas de doentes viram, ao longo dos últimos dias, goradas as suas expectativas na farmácia em serviço naquela unidade hospitalar. Ali falta tudo até um simples anti-inflamatório. Em Nacala, ainda no quadro dos exemplos, no Hospital Distrital de Nacala (Ceta), o cenário não é diferente. Falta quase tudo. Pior, são relatados casos em que um simples exame de malária leva quase um dia para sair. Semana passada, na mesma unidade, faleceu um jovem na casa dos 15 anos de idade por manifesta falta de atendimento; ele ficou horas a fio deitado numa maca num corredor e só foi levado para observação quando os outros doentes reclamaram, mas já era tarde demais. Outro negócio chorudo está nas transferências; se o doente ou os familiares não têm dinheiro, a transferência para o Hospital de Nampula deixa automaticamente de ser urgente. Refira-se que já é quase uma tradição naquela unidade sanitária os doentes internados terem que pagar aos enfermeiros 100 a 200 meticais para terem o mínimo de atenção. Noutras ocasiões, ligando para um ou outro profissional de saúde, mediante o pagamento de valores que atingem os 3000 meticais, o doente pode ter um tratamento Vip. Ainda na cidade de Nacala, no dia em que o camião chega há todos os medicamentos, mas no dia seguinte já não há nada.

No que diz respeito aos medicamentos, as razões, em sua maioria, denotam a falta de uma gestão logística efectiva para dimensionar recursos financeiros, priorizar insumos de maior utilização, distribuir correctamente esses materiais e medicamentos entre as unidades do Estado e controlar o consumo, para programar a reposição em prazos adequados. Essa falta de controlo acaba resultando em inúmeros problemas, que vão de erros no dimensionamento das compras ao comprometimento na segurança dos tratamentos oferecidos à população. Para piorar o cenário, já que o cabrito come onde está amarrado, os desenrascados surripiam os medicamentos para depois revenderem aos pacientes, isto quando não fornecem às farmácias privadas com as devidas contrapartidas. Não é raro pessoal da saúde indicar com precisão cirúrgica onde se podem adquirir determinados fármacos.

Em razão disto, fica claro que faltam habilidades específicas aos órgãos públicos para manter uma gestão logística eficaz no sector de Saúde, apesar dos discursos optimistas de quem de direito. 

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