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Minha mulher não vai jogar

Por admin

“Afinal, o senhor o que tem para com as mulheres? Por que traz bolas e equipamento de futebol só para homens? Nós as mulheres não somos pessoas? Não somos suas conterrâneas? O que não temos de humano?” Isto dito em Sena ou loló, as duas línguas mais faladas em Morrumbala, é muito mais sentimental.

Fiquei comovido após ouvir aquelas mulheres que seguiam de Thunduzi para a vila carregadas de cestos cheios de mangas que iam vender para o seu sustento, já que a fome atingira o pico em Dezembro, com a chuva intensa a não deixar as famílias irem lavrar as machambas.

Fiquei calado a pensar se elas tinham ou não razão ou se era justa a sua reclamação. Tinham razão!

“Passem do campo amanhã para buscarem bola e iniciarem treinos. Se chover vão jogar no domingo, a anteceder o jogo dos homens”, disse para elas, que se puseram a pular de alegria com todo cuidado de não entornar as mangas para o chão.

“Vou arranjar calções específicos para vocês”, acrescentei.

Depois da notícia do ano, as mulheres terão ficado a pensar que eram iguais aos homens.

No mesmo dia reuni com os meus colaboradores a quem os transmiti a decisão de incluir nas nossas actividades o futebol feminino. Eles longe de pensarem que as jogadoras seriam senhoras, dentre elas suas esposas, concordaram. Mas a partir do momento em que começaram a perceber que o jogo não seria de menininhas comecei a sentir que a ideia não era toda ela bem-vinda.

No entanto, as mulheres da aldeia só falavam do jogo e prometiam show de futebol.

“Ainda bem. Vamos ter oportunidade de mostrar aos homens que nós também podemos jogar futebol ao agrado deles.” Este pronunciamento irritava aos mari

jogarem futebol, ainda mais de calções e camisetes. Talvez de capulanas! Ninguém admitia que um dia a sua esposa se apresentasse de calções acima de joelho ou de pernas nuas e ao vivo. Isso não!

Comecei a perceber que a ideia tinha criado mau ambiente nos lares, alguns de jovens de menos de vinte a anos de idade. Cada vez que se aproximava o dia de jogo eu era aconselhada a desistir da ideia porque podia provocar pancadarias entre esposas e originar divórcios.

Houve mesmo quem dissesse: Senhor jornalista, juro que minha mulher não vai jogar.

 Então, propus um jogo só de mulheres solteiras, sem sucesso. É que, marcado o jogo só de solteiras, algumas mulheres podiam simular divórcios só com a intenção de jogar futebol.

E agora, quem ajuda a impor com o futebol a igualdade de género em Morrumbala? Sozinho não aguentei.

PS: Dedico esta crónica a uma mulher moçambicana de nome Maria Manuela, praticante de boxe,  a quem foi retirada bolsa de Solidariedade Olímpica a favor de um homem.

Manuel Meque

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