No exercício da medicina em Moçambique deve haver uma relação de complementaridade entre a tradicional e a moderna. Está opinião é do jovem e curandeiro, Rafael Bila, dono de uma
farmácia, instalada no distrito de Massinga, província de Inhambane.
Bila sustenta que os médicos de diversas especialidades e os curandeiros têm ambos a mesma missão: tratar pessoas, sendo por isso importante que as autoridades governamentais autorizem os curandeiros a fazerem consultas nos hospitais aos doentes internados, assim como os enfermeiros ou médicos apoiarem os curandeiros no tipo de tratamento a administrar aos doentes também de baixa nas suas ‘clínicas privadas’.
“Devemos estar de mãos dadas. Lutamos pela mesma causa, salvar vidas humanas”,lembra Bila, tendo adiante referido que, “um dia, gostaria de entrar numa enfermaria do hospital e poder apontar para aquele cuja doença não será curada antes de passar por um curandeiro e, na sequência, aconselhar o médico para deixar que esse doente passe antes pelo curandeiro e só mais tarde retomar à medicina moderna.”
A completar 39 anos no próximo mês de Junho, dos quais 27 passados nesta actividade, incluindo sete anos de aprendizagem na vizinha Suazilândia, Rafael Bila explicou que o seu estabelecimento, farmácia tradicional que funciona há um ano na Massinga, veio para responder às necessidades de procura de fármacos para curar algumas doenças tipicamente tradicionais
Destaque vai ainda para o facto de sua mulher ser, igualmente, curandeira. “E é trabalhadora da minha farmácia. Por vários anos, continua,foi ajudante de um curandeiro, e isso contribui para que neste estabelecimento, não só se venda raízes, mas também se faça consultas para perceber efectivamente se o medicamento pedido é ou não propício para a doença apresentada”, explica Bila.
Não curamos SIDA
mas temos antiretrovirais
Na entrevista concedida pelo proprietário da farmácia tradicional perguntamos se como curandeiro, que herdou o dom do seu avô paterno, antigo e famoso curandeiro Xipanela, curava SIDA, ao que respondeu: “Não existe curandeiro nenhum no mundo que tenha curativo dessa doença. Todavia, tal como acontece nos hospitais, alguns curandeiros, mas muito poucos, têm algumas raízes para atenuar as dores. Por exemplo, eu tenho aqui AV e NB. Estas duas misturas combinadas funcionam como antiretrovirais, portanto temos capacidade para minimizar os efeitos desta mortífera doença.”
Sobre o que seria NB e AV Rafael Bila explica: “NB é resultante da trituração da raiz de uma planta chamada na língua local de Xitshwa, Nembenembe, e AV é a solução da preparação da batata africana, um tubérculo famoso em tratar várias enfermidades, nomeadamente asma, tensão arterial, entre outras doenças.”
E existe, também, o KN. Este “é utilizado também para curar hemorróides”, explica.
No seu leque tem medicamentos para lavagem estomacal, impotência sexual nos homens, tuberculose e aquilo que chamou vitaminas, cujos curativos são através dos compostos que receberam nomes de VS, HV e XF, não indicando o nome das raízes ou folhas das respectivas plantas.
“Para as doenças mais frequentes e comuns nesta região, não posso revelar os nomes das plantas ou raízes que utilizo como remédio. Sabem todos que o segredo é alma do negócio, lembra,se eu dissesse onde busco as raízes e as folhas, como preparar para tudo se tornar em medicamento, se calhar ninguém viria para a minha farmácia, atiça.
Conservação dos medicamentos preocupa
Instalada que está a farmácia tradicional, a primeira que funciona oficialmente na província de Inhambane, o próximo passo de Rafael Bila é encontrar formas de conservação dos medicamentos já processados, principalmente em forma líquida.
“Estou preocupado porque não temos equipamento de frio”, revela.
Para a concretização deste sonho, Bila não afasta a possibilidade de solicitar apoio junto do governo distrital.
“Não sei se o meu caso é elegível ao Fundo de Desenvolvimento Distrital. Se tivesse certeza, faria um projecto e o enviaria ao conselho executivo distrital”,disse a terminar.