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A Igreja deve promover a paz e harmonia social- defende Alberto Vera Aréjula

Por admin

Sua Santidade Papa Francisco, nomeou, semana passada, o Padre Alberto Vera Aréjula, que é delegado Superior Provincial dos Mercedários em Moçambique e Pároco em Xai-Xai, para Bispo Auxiliar da Diocese de Xai-Xai, na província de Gaza, tendo-lhe sido atribuída sede titular episcopal de Novabarbara. Em semana pascal para os cristãos, domingo entrevistou o padre nomeado, que destila aqui as suas ideias sobre o papel actual da Igreja Católica em Moçambique e no mundo e sobre a situação no país. Segue-se a conversa com o clérigo em discurso directo.

 

Como encarou a notícia da sua nomeação como Bispo Auxiliar de Xai-Xai pelo Santo Padre?

Com dois sentimentos: por um lado, com grande surpresa porque não esperava. Aliás, quando me notificaram, pensei que Xai-Xai também tivesse pessoas que pudessem ser bispos e com melhor preparação do que eu. Porém, não sei qual foi o motivo que levou o Papa a pensar nesta decisão. Por outro lado, senti-me chocado por isto constituir uma mudança total na minha vida. Mas bem, durante os 33 anos que sou sacerdote sempre respondi a Deus pelo que posso servir a Ele e ao povo moçambicano que tanto amo com muita felicidade. No meu Ministério de Bispo, o que vou fazer é servir as pessoas, ao povo moçambicano, em particular, aqui em Gaza, não só aos católicos mas também a todos especialmente aos pobres.  

Que balanço faz da sua vida cristã e das dificuldades que foi encarando ao longo da sua missão?

A minha vida cristã foi muito rica graças a Deus, porque desde que fui ordenado sacerdote, depois de ter estado três anos numa Paróquia, trabalhando com jovens na cidade de Valência, na Espanha, fui enviado para Guatemala numa época de conflito de guerra civil durante nove anos. Essa vivência, experiência e sofrimento de tantas pessoas provocados pela violência por razões políticas amadureceram-me bastante e fizeram-me encarar a vida com muito optimismo. Entretanto, mais tarde tive de regressar para Espanha porque a minha única irmã adoeceu, obrigando-me a assisti-la de perto. Enfim, tinha metido na cabeça que ia morrer na Guatemala.

TRAJECTÓRIA EM MOÇAMBIQUE

E como parou em Moçambique?

Olha! Passados alguns anos, depois que a minha irmã recuperou, pediram-me que fundasse a nossa comunidade em África, neste caso na Manhiça, na província de Maputo. Ali, aprendi a falar português com o padre Joaquim Mabuiangue (ora falecido). Mais tarde, Sua Eminência Cardeal Dom Alexandre Maria dos Santos, Arcebispo de Maputo, ofereceu-nos a Paróquia de Nossa Senhora de Livramento, no bairro T3, arredores do município da Matola, na província de Maputo.

O que fizeram nessa Paróquia?

Porque houvesse muitos jovens sem ocupação estudantil e profissional, juntamente com outros padres, abrimos a Escola Secundária Nossa Senhora do Livramento, ali mesmo no Bairro T-3 que era frequentada por cerca de mil e 500 alunos da décima primeira e décima segunda classe. Estive lá entre 2000 e 2012, altura em que vim para Xai-Xai.

Que memórias guarda dessa Paróquia no T-3?

Boas memórias! Foi uma experiência muito feliz. Recordo-me que na missa de despedida disse-lhes que muito amava Moçambique e os moçambicanos e por essa razão me sentia moçambicano. Sinto que vale a pena viver lutar sempre para que este povo continue em frente.

Que valores devem, na sua visão, prevalecer no centro da vida cristã?

A caridade divina vivida em comunidade numa perspectiva em que se olhe sempre para os outros e não apenas para si de forma individualizada. Isso para mim é mais importante e fundamental.

Na qualidade de novo Bispo Auxiliar de Xai-Xai, como pensa que isso se pode materializar?

Tenho estado a pensar ter um escudo simbolizado pela espiga de trigo e pelo vinho, uma vez que sou oriundo de camponeses e vou servir uma Diocese maioritariamente representada também por camponeses.  

Pode explicar melhor esse simbolismo?

Na espiga temos muitos grãos e quando se juntam podem alimentar e matar a fome. No caso concreto de Moçambique, é possível satisfazer-se as necessidades básicas, que são muitas, através da unidade entre as pessoas. Como cristão, considero algo importante viver em união na família, nas escolas, nos bairros, etc.

E quanto ao vinho?

O vinho expressa a festa e quando há unidade pode-se viver também em alegria. Quando o povo expressa alegria significa que as pessoas, mesmo pobres encontram na festa a felicidade desejada.  

Qual éo papel da Igreja para amenizar os problemas políticos, sociais e económicos que atravessamos agora em Moçambique?

O papel da Igreja é de ser mãe, porque a mãe na família sempre procurou que os filhos dialoguem e se relacionem bem, aproximando-os, mesmo com ideias diferentes e contrárias. Ninguém deve-se servir das suas ideias para odiar os outros. Portanto, a Igreja, no sentido em que me coloca a questão, tem a função de aproximar as pessoas, motivá-las para o diálogo e despertá-las para um sentido democrático de convivência, de modo a assumirem os valores da paz e harmonia.

Como superar as desigualdades sociais que se registam agora no país?

A igualdade é impossível de superar na vida, porque cada um de nós tem as suas próprias condições. Mas também, a Igreja pode despertar para a justiça. Vou dar um exemplo, quando em 2000 cheguei a Moçambique, o país era o quinto ou sexto país mais pobre do mundo, de acordo com o registo das estatísticas na altura. Hoje em dia a situação mudou drasticamente e o país está a ser alvo de muitas descobertas de recursos naturais que muitos países do mundo não possuem. Nesse sentido, penso que os governantes do país e os que tenham responsabilidades sobre ele devem colocar a mão na consciência, fazendo com que tais recursos não sejam para poucas pessoas. Penso que os recursos devem ser partilhados em benefício do povo no geral, criando-se trabalho e esperança a juventude e assim se avançar para frente.  

Como equacionar isso num contexto em que fazem discursos políticos não abonatórios à harmonia e pacificação?

Penso que os partidos políticos numa sociedade são uma boa coisa e as leis que o país possui também são boas. Agora, o que acho não ter sentido é fazerem-se discursos que estejam fora da lei. Isso é que não faz sentido. Penso que um partido que esteja a governar ou na oposição deve ter as suas políticas capazes de mudar as leis se estas não forem justas para o povo, mudando o sistema ou a estrutura administrativa. Se estivermos fora da lei viramos bandoleiros.

Como vê o futuro da Igreja Católica em Moçambique e no mundo?

Com um futuro promissor…

Porquê?

Porque em cada dia que passa ela tem as portas e janelas muito mais abertas. Já não há leis e normas, queremos anunciar um Senhor que se chama Jesus Cristo. É próprio Jesus quem convoca, que nos namora e nos atrai. Não há nada que ocultar, não há nada de tenebroso.

Quem é o padre Alberto Aréjula?

Nasci num povo de camponeses duma comunidade autónoma da Espanha, chamada Aréjula,bastante famosa pelo vinho que produz, e pertenço à Ordem Nossa Senhora das Mercês existente há cerca de 800 anos com vocação de trabalhar com reclusos nas cadeias e marginais em diferentes campos. A nossa Ordem estende-se pela América Latina, Itália, Estados Unidos da América, Índia, Angola, Camarões e Moçambique.

O BI do novo Bispo Auxiliar de Xai-Xai

O padre Alberto Vera Aréjula nasceu a 8 de Abril de 1957 (faz esta semana 58 anos de idade), em Aguilar delRíoAlhama, na Diocese de Calahorra y La Calzada-Logroño, na Espanha. Depois dos estudos primários e secundários em 1967, ele entrou no Seminário Mercedário de Réus (Tarragona) e continuou com a formação religiosa, tendo emitido a primeira profissão em 1975, no Mosteiro de S. Ramon Nonato (Lérida), e a profissão solene, ao 19 de Março de 1981, no Mosteiro de Puig (Valência).

Obteve o Bacharelado em Teologia, frequentou o primeiro ano de Licenciatura em Teologia Sistemática em 1982, na Faculdade de Teologia de Catalunha (Barcelona). Depois de completar o segundo ano de Psicologia na Universidade de Valência em 1985, em 1987 concluiu o Curso para Professores de Filosofia na escola secundária na Universidade  Francisco Marroquin, em Guatemala. Foi ordenado sacerdote ao 22 de Agosto de 1981.

Depois da ordenação, o Padre Alberto Vera Aréjula desempenhou, entre outros, os seguintes cargos: Vigário da Paróquia de Nuestra Senora de E1 Puig (Valência); Formador de postulantes e promotor vocacional no Vicariato da América Central na Cidade da Guatemala; Conselheiro Provincial e Responsável da Pastoral Juvenil e Vocacional da Província de Aragão; Superior da Comunidade da Matola-Moçambique, Reitor dos Estudos do Seminário Mercedário; pároco da paróquia de Nossa Senhora do Livramento; Delegado Provincial dos Padres Mercedários em Moçambique; e Superior da nova Comunidade de Xai-Xai (Moçambique), na nova Paróquia Nossa Senhora das Mercês.

Artur Saúde

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