Opinião

Estádio da Machava

"Se confias demasiado, poderão enganar-te.

Mas, se não confias o suficiente, a tua vida será um tormento" (Frank Crane)

Vou directo ao assunto: chegou-me a informação de que um certo entourage decidiu que o Estádio da Machava devia deixar de ser Estádio da Machava. Para o efeito, já haviam sido escolhidos 5 possíveis nomes para o mítico campo: Estádio dos Ferroviários. Estádio Nacional da Machava. Estádio da Independência. Estádio Samora Machel. Estádio 25 de Junho. Em princípio, do crivo, deverá deste lote sair o nome definitivo!

Muito bem… reacção primeira: porquê mudar o nome daquele Estádio?

Segundo: Quais são as dinâmicas emotivas que acontecem nas pessoas quando devem enfrentar mudanças? Só de ouvir a palavra mudança, o risco é que a primeira reacção seja de medo e, se esse sentimento inibir a curiosidade e o desejo de experimentar algo novo, pode contribuir decisivamente para a falência do projecto.

Como seres humanos, nós crescemos, aprendemos a andar, falar, brincar, e assim por diante, sempre enfrentando as mudanças da vida. Por meio de contínuos ajustes, tentamos encontrar o nosso lugar no mundo, realizar-nos pessoal e profissionalmente e construir uma identidade. Se as transformações da vida nos confirmam que tudo tem um tempo finito, frente às mudanças precisamos de ter uma atitude e uma postura adequada para estarmos abertos a acolhê-las, pois só assim podemos visualizar as novas possibilidades presentes na situação, estimulando a mobilidade mental.

Outrossim, quando ela – a mudança –  acontece por variáveis da vida não controláveis por nós, tendemos a querer perpetuar velhos esquemas de pensamento e comportamento. Não sabemos deixar lugar ao novo. E nos perguntamos por que os acontecimentos da vida desestabilizaram os nossos planos, colocando em dúvida as nossas certezas. Ao invés de enfrentar as mudanças como oportunidade de crescimento, passamos a resistir, criando conflitos, dor, sofrimento e uma sensação de perda de controlo da situação.

Se assim é, então porquê o meu estômago ficou de avesso diante da possibilidade de mudança de nome do Estádio da Machava?

E a resposta veio fria e sublime: porque não há, objectivamente, necessidade dessa mudança. Provavelmente o Estádio precise de obras de melhoramentos aqui e ali, incluindo a relva que, ao que se sabe é sintética, por uma natural… sei lá! Mas o nome? Não parece razoável.

Passam por ai 40 anos que o Estádio Salazar passou a Estádio da Machava. Ali foi assinalada a passagem de uma era para a outra com a Independência Nacional. Ali a Selecção Nacional fez história mas também fez-nos chorar de raiva. Para as pessoas da minha geração não é fácil engolir essa de mudança de nome. O estádio da Machava está incrustado na Machava. Nada mais natural que exaltar esse nome!

Eu sou o primeiro a reconhecer que nem sempre estamos preparados para as voltas que a vida dá. Em se tratando de mudança, muito menos. Mudar significa reconstruir, tirar daqui, colocar ali. Às vezes passamos por sofrimento, dor, angústia. Remexer no nosso interior é sinónimo de medo, e medo pode ser apenas falta de informação. É preciso coragem para abandonar velhos hábitos e começar um novo. Atino também que quando isso se apresenta, muitas pessoas travam uma luta interna gigantesca, pois a mudança mesmo que benéfica pode gerar medo. Nos acostumamos, permanecemos na zona de conforto por muito tempo e qualquer pequena modificação no rumo de nossa vida gera desconforto. Esse medo em algumas oportunidades pode nos impedir de evoluir espiritualmente, de vermos a vida sob um novo contexto.

Entretanto, enquanto não me chegar uma justificação plausível, refutarei essa ideia mirabolante saída de uma cartola de um qualquer mágico de rua. Sou apenas eu que vejo o absurdo disso? Pode ser mas não me calo. Acho que o Ferroviário deve ter outras tantas preocupações que não serão ultrapassadas com uma mudança de nome. E essa coisa de nomes tem muito que se diga: olhe-se para o Benfica. Alguém se lembra que o nome oficial é George Dimitrov? Ou que o Choupal é 25 de Junho?

Se o meu voto contar para alguma coisa, por favor deixem o Estádio da Machava em paz. Há ali uma profusão de histórias de vida que não cabem num gabinete onde alguns iluminados, ao sabor de descafeinados, parecem ignorar.

Não nos façam pensar como Andrew Carnegie que disse, depois de ver tantas asneiras que à medida que ia envelhecendo, importava-se cada vez menos com o que dizem os outros. Agora, apenas observava o que faziam!

Belmiro Adamugy
belmiro.adamugy@snoticicas.co.mz

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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