Reportagem

Empregos que provocam calafrios no estômago

Textos de Jorge Rungo e Angelina Mahumane, Fotos de Jerónimo Muianga e Fotos de Carlos Uqueio

Trabalhadores de todo o mundo celebraram na passada sexta-feira o Dia Internacional do Trabalhador, efeméride prenhe de história e que serve para manter viva a velha preocupação da massa laboral sobre a necessidade dos patrões “vestirem uma pele diferente”, nomeadamente a de partilha mais justa dos proveitos conseguidos com suor, lágrimas e, por vezes, sangue.

Porque a data coincidiu com uma sexta-feira, e como era de prever, vários grupos de labutadores começaram a dar largas à comemoração na véspera, reunindo-se aqui e acolá para “lavarem o suor” com rodadas de copos, ao mesmo tempo que se replicavam engarrafamentos em quase todas as vias de entrada e saída da cidade e uma sucessão de inevitáveis acidentes de viação aconteceram até ao amanhecer.

No 1º de Maio propriamente dito, milhares de homens e mulheres obedeceram à tradição e, em enormes filas e caravanas, desfilaram empunhando dísticos com os dizeres de sempre, a começar pelo comum “Viva o 1º de Maio”, passando pelo famoso “exigimos salários justos e melhores condições de trabalho” até chegar a denúncias de maus tratos e de salários com meses de atraso.

Enquanto este enredo se desenrolava, a nossa equipa de Reportagem procurava identificar trabalhadores que desenvolvem actividades que exigem um pouco mais do que a simples vocação para, através da sua história laboral e de vida, ajudar a desmistificar a profissão e homenagear a todos os que fazem mais do que estar presentes no local de trabalho a gerir a chávena de chá, entreter os que trabalham com piadas inventadas na hora, entre outros.

As escolhas recaíram sobre dois profissionais de áreas distintas, mas que tem em mãos a vida de centenas de pessoas e, por isso, lidam com ambientes de puro stresse a cada minuto, e tem a obrigação de tomar decisões rápidas e certas, enfim.

Trata-se de um operador de grua de construção civil (grua-torre) e um controlador de tráfego aéreo, profissões que, vistas de longe, pareciam comuns até para a maior parte dos profissionais deste jornal. Porém, depois de alguns instantes de conversa com esta dupla, nos demos conta de que há profissões e profissões.

Por exemplo, o operador de gruas-torre, João Matola, conta que a sua área de trabalho não é para quem quer porque é preciso não ter medo de lugares altos (acrofobia), que é um distúrbio psicológico que pode ser perigoso, uma vez que indivíduos que sofrem dela podem ter um ataque de pânico e desencadearem uma sucessão de situações que podem culminar numa tragédia.

A par de desenvolver a sua actividade laboral lá nas alturas, agora está numa grua-torre com 127 metros, João Matola fica enclausurado numa “cela” tão pequena que só pode permanecer sentado e sozinho até ao final de cada etapa de trabalho, para poder vir tomar uma refeição e desentorpecer os músculos e depois voltar para a sua “gaiola” para esperar pelo fim da jornada.

Também conta que estar ali sentado, sozinho, a ver o formigueiro que as pessoas e viaturas formam cá em baixo não é nenhum problema para ele. Está habituado e lida com isso com a maior tranquilidade. Entretanto, o problema começa quando o estado do tempo entende fazer das suas soltando o vento e seus tradicionais acólitos, nomeadamente trovoadas, relâmpagos e chuva. Aí, sim. A coisa muda de figura.

O controlador de tráfego aéreo que se dispôs a “desmascarar” a sua profissão chama-se Elias Cossa e revela que esta é uma área de trabalho da qual dependem as vidas de todos os que usam aviões. Uma informação, autorização ou sugestão dada de forma irreflectida para um piloto pode redundar numa tragédia monumental.

A maior parte dos passageiros julga que a sua vida está nas mãos dos pilotos, mas Elias Cossa diz que a vida dos pilotos e dos passageiros depende das decisões dos controladores. “Os pilotos só tomam decisões por si quando estão fora das áreas controladas por aeroportos ou aeródromos.

Trocando em miúdos, Cossa afirma que enquanto os aviões estão a circular em pista, a descolar, aterrar ou em cruzeiro dentro das áreas controladas por algum aeroporto, os pilotos dependem da informação que recebem dos controladores de tráfego aéreo.

O que torna este trabalho invulgar é o facto do mesmo controlador ter o dever de gerir vários aviões que sobem, descem e atravessam o espaço aéreo nacional, passando-lhes informações cruciais para que não colidam entre si e nenhum deles venha embater contra o chão ou edifícios que cercam os aeroportos.    

Revela que os controladores que estão na Torre de Controle do Aeroporto Internacional de Maputo gerem cerca de 90 voos por dia e, cada um destes aviões deve estar no lugar certo na hora certa.

A adrenalina que se vive nesta área de trabalho é tanta que alguns começam a desenvolver doenças cardíacas e alguma desorientação, sobretudo quando um incidente acontece. Por causa disso, as regras internacionais impõem que a reforma aconteça entre os 50 e os 55 anos.  

Fintar o perigo nas alturas

Na capital do país, Maputo, erguem-se edifícios por toda a parte e cada um deles parece desafiar o vizinho pela altura e arquitectura. A ladear cada obra são visíveis gruas-torre amarelas com uma minúscula cabina, onde um homem se tranca durante horas, e, de lá, conduz a distribuição dos materiais. João Matola é um desses homens que superou muitos medos, pese embora ande permanentemente às fintas com o perigo.

João Matola tem uma longa história profissional ligada às alturas. Empregou-se na fábrica Lusalite, no bairro da Machava, em 1982, para operar uma máquina que faz parte do grupo das gruas, porém, denominada ponte rolante.

Por volta de 1986, deixou aquele emprego para seguir para a República Democrática da Alemanha (RDA), onde permaneceu até por volta de 1990 e, quando regressou foi empregar-se novamente na Lusalite, mas desta vez torcia o nariz a cada final do mês por causa do salário que não tinha gorduras. Era um salário “pele e osso”.

Dada a precariedade salarial, Matola desistiu do vínculo profissional, passado um ano e meio, e foi procurar uma vaga na obra de construção da empresa Silos e Terminal Graneleiro da Matola (STEMA), tendo como “trunfo” uma carta profissional de condução de gruas rolantes.

Depois de um ensaio de um dia na presença de um técnico sul-africano, João Matola foi aprovado e, pouco depois beneficiou de uma formação rápida para melhor manobrar o equipamento e lidar com os manípulos.

Conta ainda que em 1995 mudou-se para a empresa Texeira Duarte, onde se tornou o único operador de grua e permaneceu nessa condição durante longos anos, o que lhe enche de orgulho. Aliás, é com orgulho que fala das obras que ajudou a construir.

Entre outras construções, João Matola participou na construção de edifícios que se tornaram referências arquitectónicas da capital como são os casos do Hotel Avenida, Polana Shopping, Ministério das Finanças, construção da ponte Chókwe-Guijá, campus do Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI), localizado no bairro do Zimpeto e o Cenáculo da Fé da Igreja Universal em Maputo.

FINTAR O PERIGO

Por ser uma actividade profissional com riscos a transbordarem por todos os cantos, João Matola diz que não se pode prescindir, em nenhuma circunstância das regras de higiene e segurança no trabalho. É vital. “Antes de me colocar lá na cabina tenho que fazer uma verificação completa da estrutura”, disse.

Entre os itens que é preciso ver com olhos de ver destaque vai para os parafusos, cavilhas, cabos eléctricos e de elevação, manípulos e toda a área circundante da obra para evitar colisões de qualquer espécie. “Isto é básico”, garante.

Indica ainda que é preciso fazer cálculos do peso da carga, porque, máquina que é máquina avaria sem avisar. “As gruas-torre possuem um limitador de peso que pode falhar e desencadearem situações que ninguém pode controlar”.

Insistimos com ele para nos falar dos sustos que tem apanhado naquela minúscula cabine que, como se pode imaginar, são vários e cada um mais medonho que o outro. Apesar de jurar a pés juntos que não tem medo das alturas, confessa que já passou por calafrios de fazer corar a quem presenciou.

Por exemplo, narrou que numa das obras por onde passou e decorria a construção de um silo, sentiu o cheiro da morte por causa do vento que surpreendeu a equipa de trabalho e quase originava um acidente com garantia de perda de pelo menos cinco vidas humanas, incluindo a sua.

No referido dia, disse que seguiu todos os procedimentos de segurança e instalou-se comodamente na cabine para dar início ao dia de trabalho. Aliás, é importante notar que o operador de grua é o primeiro a ocupar o seu posto. Porque se tratava de uma estrutura sem escadas, a grua devia servir de elevador e a equipa, composta por quatro pedreiros, devia ser içada dentro de um “cesto”.

Os quatro trabalhadores posicionaram-se nos devidos lugares e João Matola recebeu ordens para elevar o “cesto”. Tudo corria lindamente. O sol brilhava e uma leve brisa alegrava a pele. De repente, o vento intensificou-se enquanto o grupo de operários ainda ia a meio do seu trajecto.

Para complicar as contas que cada um fazia à vida, as garras de amarração que seguram a grua aos trilhos desprenderam-se e a estrutura começou a rolar em direcção ao vazio. Houve pânico e uma única certeza. “É o fim. Vamos morrer”.

Milagrosamente, quando já ninguém gritava, a grua parou a escassos 20 centímetros do final dos trilhos. Ninguém acreditou. Ficaram todos embasbacados e desceram trémulos com um misto de calor e frio. Mal se falaram nos instantes que se seguiram. “Ufff…”

EXPERIÊNCIA CONTA… E MUITO

João Matola diz que o que lhe tem ajudado muito é a mescla de falta de medo das alturas e a experiência que já acumulou. Esta mistura ajudou-o a sair com vida de um episódio onde até o engenheiro responsável pela obra já tinha coberto a cara com as mãos certo de que a grua ia se desfazer no chão e que o operador morreria infalivelmente.

É preciso ter experiência, porque há situações em que se deve trabalhar com ventos que vão até 50 quilómetro por hora, o que exige um enorme discernimento e concentração, sob pena de tudo dar para o torto”, afirma.

Conta que numa outra obra tinha que levantar uma chapa de cofragem com cerca de 700 quilos para ser montada no vão de elevador do prédio que estava em construção. O processo correu normalmente até a chapa ganhar uma altura considerável.

Do nada, o vento começou a soprar e a chapa de cofragem, com todo o seu peso, esvoaçou como se fosse um “papagaio”, ou pipa, como lhe chamam os brasileiros. O engenheiro responsável e outros colegas roeram as unhas e gritaram mergulhados no pânico. Pouco ou nada havia a fazer. Era só esperar para ver o fim.

João Matola diz que buscou dos seus reflexos e fez o braço da grua rolar para a direcção favorável ao vento e, em poucos minutos conseguiu dominar a força da chapa e do vento. Mais uma vez tudo terminou sem estragos de qualquer tipo.

O engenheiro convidou-me a um almoço num restaurante chique e disse para escolher o que eu queria comer. Abri o menu, revirei-o e disse-lhe que o que eu queria não constava naquele menu. Ele me perguntou o que era e eu disse que queria um aumento salarial. Ele disse o que já previa. Que não dependia dele. Rimo-nos e almoçamos”, recorda. É óbvio que nós também nos rimos.

O terceiro episódio aconteceu numa obra onde João Matola levantava um balde carregado de betão. Entretanto, o equipamento de elevação perde os freios e o balde despenca rumo ao local onde se encontrava um pedreiro completamente alheio ao que se passava um pouco acima da sua cabeça. “Tive que fazer uma manobra difícil para desviar o balde do corpo do colega. Felizmente, correu tudo bem”.

Na sua longa história, já enfrentou situações assustadoras de ventos de 80 quilómetros por hora que, por ironia do destino, logo a seguir houve um corte de energia, trovejou, relampejou e choveu. Dada a força do vento era impossível controlar a grua que girava para todos os lados. “Tive que abandonar, não havia hipótese”.

TRABALHAR NO AR CONDICIONADO

No meio de tanto susto, João Matola afirma que uma das coisas que lhe traz alegria é o facto de estar a haver uma evolução em termos de segurança e também da comodidade no interior daquelas cabines. Por exemplo, algumas já possuem aparelhos de ar condicionado. “As gruas evoluíram muito”, diz.

Entre os sinais de evolução que estes equipamentos já possuem, também se destacam painéis que fornecem um vasto conjunto de informações cruciais, tais como a intensidade e direcção do vento, o peso da carga que se vai içar ou fazer descer, entre outros.

Outro dado que anima aos operadores de gruas-torre da actualidade é o facto de poderem receber, por meios electrónicos, dados sobre as oscilações que a estrutura faz quando está carregada. “Lá de cima é possível saber para que direcção posso rodar a máquina com uma determinada carga”.

Porém, mesmo com toda essa assessoria tecnológica, João Matola diz com todas as letras que “para mim, na grua tudo é perigoso. Não há coisa que posso escolher como tranquilizador ou fácil. É verdade que a partir dos 50 metros de altura faz-se a amarração da grua ao edifício, mas… é preciso ter muita responsabilidade”.

E mesmo a propósito de responsabilidade, este operador explica que ciclicamente é submetido a vários exames sanitários e não pode desprezar nenhum sintoma de mal-estar ou dor. Por sua iniciativa obedece a algumas regras para não cair no sono ou sentir vontade de satisfazer alguma necessidade biológica estando no seu posto.

Uma delas é evitar almoçar como se estivesse a despedir-se da comida. Outra regra é fugir dos copos. Aliás, os empregadores submetem alguns trabalhadores ao bafómetro, quando há suspeitas de que andou pelos bares e barracas na véspera.

Onde a “porca torce o rabo” é quando dá uma vontade de urinar. Conforme revelou, quando um operador está lá em cima, não pode andar em vaivéns porque pode comprometer a entrega de materiais e equipamentos imprescindíveis. Por causa disso, procura fazer tudo em terra firme porque, de outro modo fica tudo muito complicado.

FAMÍLIA PESQUISA PREVISÃO DO TEMPOSobre a forma como a família lidou com o facto de ter o esposo e pai “pendurado” a mais de 100 metros do chão e exposto às intempéries, João Matola conta que foi difícil. “Disseram-me para ir pedir um aumento salarial e tive que lhes recordar que eu é que fui pedir emprego e não o contrário e que se eles pudessem fazer isso por mim, seria muito bom para todos”.

Depois de muita conversa e entendimento por parte da família, João Matola conta que o seu agregado já ajuda a projectar o dia seguinte. “Ficam atentos à previsão do tempo e alertam sobre a possibilidade de haver ventos superiores a 35 quilómetros por hora”.

Outro detalhe que lhe dá orgulho é o facto de ter servido de instrutor de três jovens que são uma promessa no sector. Eles também já andam a fintar o perigo lá nas alturas.

Decisões na ponta da línguaA profissão de controlador de tráfego aéreo é pouco conhecida porque só se fala dela quando algo corre muito mal com alguma aeronave. Para muitos, os pilotos são tudo. Eles é que colocam os aviões no ar e trazem-nos de volta à terra. Porém, a verdade é bem outra. A segurança dos próprios pilotos e respectivos passageiros depende em larga medida das decisões que os controladores devem tomar quase que sem pestanejar.

 

Os contactos feitos com os gestores da empresa Aeroportos de Moçambique culminaram com a escolha de Elias Cossa, um controlador de tráfego aéreo com cerca de 24 anos de carreira e que garante que esta profissão é boa, sim senhor, e recomenda-se.

Apesar de considerar que este ofício é dos melhores que se pode ter, Cossa também confessa que os calafrios estão ocultos por detrás de cada segundo porque todas as aeronaves que estão em terra ou no ar, dentro da área controlada pelo aeroporto (os controladores chamam de aeródromo), devem receber informações certas no instante em que são solicitadas.

As situações nunca são iguais e algumas exigem soluções imediatas. Não posso pedir a um piloto para aguardar porque quero pensar. Tenho que ter a solução naquele instante e essa solução deve ser a mais acertada possível. Os procedimentos tem que estar na cabeça”, explicou.

Segundo ele, caso haja um erro, centenas de pessoas podem perder a vida o que pode levar o controlador a adquirir uma incapacidade temporária ou permanente por ter dado instruções erróneas. “Quando isso acontece, a pessoa fica sem condições para voltar a trabalhar e pode precisar de acompanhamento psicológico”, diz.

Mesmo a propósito de situações aflitivas, Elias Cossa conta que já se deparou com várias, mas destaca o dia em que fazia o acompanhamento de uma aeronave que descia em direcção ao Aeroporto Internacional de Maputo e o tempo apresentava-se mau.

Conforme relata, o céu estava coberto de nuvens escuras e densas, chamadas cúmulo-nimbo, daquelas que podem ter quilómetros de altura e produzem trovoadas e respectivos relâmpagos, fortes chuvas e por vezes granizo. A uma certa altura, a comunicação entre a torre de controlo e a aeronave cessou sem mais nem menos.

Chamei a aeronave durante cinco ou 10 minutos e, nada. O avião estava incomunicável. Gelei. Felizmente, algum tempo depois o piloto entrou em contacto com a torre e conseguimos conduzi-lo até à pista sem mais problemas”, conta.

Segundo ele, quando há mau tempo o trabalho dos controladores se torna penoso porque os pilotos não podem se socorrer de referências visuais para realizarem a aproximação à pista. Nesses momentos, os tripulantes dos aviões dependem apenas dos instrumentos (aquele conjunto de manómetros, altímetros e sensores que se veem na cabine dos pilotos) e das informações que lhes são passadas a partir da torre de controlo.

Quando isto acontece, Elias Cossa diz que os pilotos e controladores devem estar sincronizados. “Se dou uma instrução, tenho que ter a certeza de que o piloto está a obedecer para que possa fazer a sequência de aproximação de outra aeronave”.

Outro factor que torna os dias de mau tempo mais stressantes é a necessidade de trazer os aviões para pontos quase próximos do chão e isso faz com que o trabalho do controlador de aproximação de torne mais longo e obriga a uma atenção redobrada.

INGLÊS EM CÓDIGOS

Para ser capaz de ter respostas “na ponta da língua”, os candidatos a esta área profissional são submetidos a uma formação na única Escola Nacional de Aeronáutica, cujo acesso se faz por via de exame de admissão nas disciplinas de inglês, matemática, geografia, acrescido de um exame psicotécnico.

Depois de aprovados nestas cadeiras, os candidatos são submetidos a uma formação específica sobre Legislação Aérea, Aeródromos, Busca e Salvamento, Comunicações, Gestão de Serviços de Tráfego Aéreo, Altimetria, Procedimentos de Navegação Aérea e Princípios de Voos. Aliás, os pilotos aprendem parte destas disciplinas.

O facto dos pilotos e controladores aprenderem algumas matérias comuns ajuda a quem vai assumir a posição na torre de controlo porque “sabendo como os aviões operam, somos capazes de dar autorizações porque conjugamos esse conhecimento com os procedimentos para manter os aviões em voo”, justifica.

A primeira fase de formação compreende sete a nove meses de banco de escola, onde se tem contacto com a teoria e depois se segue para a torre de controlo onde o treinamento prático é desencadeado com a finalidade de se obter a qualificação que é concedida depois de cerca de 450 horas.

Aliás, a qualificação é obtida no aeródromo onde o candidato a controlador vai prestar serviços. Assim sendo, se um futuro controlador vai ser destacado para trabalhar no Aeródromo de Pemba, deverá realizar a sua formação prática em Pemba, e por aí em diante.

As formações são contínuas e permanentes nas áreas de aproximação, área, supervisão e podem ser feitas especializações e cursos em áreas relacionadas”, afirma indicando que existem cursos em instrução, busca e salvamento e de examinador.

Outra particularidade desta profissão é o uso de códigos durante a comunicação com as aeronaves. Elias Cossa explica que a linguagem usada no sector é denominada de “fraseologia aeronáutica” que é inglês com códigos padronizados pela Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO). “Esta linguagem permite que os pilotos se possam comunicar com os controladores de qualquer espaço onde se encontrem e vice-versa”.

A VIDA DOS QUE ESTÃO

A VOAR DEPENDE DE NÓS

Para Elias Cossa, quem exerce a profissão de controlador de tráfego tem uma imensa responsabilidade porque a vida das pessoas que estão para voar e a voar depende das autorizações que forem dadas a partir da torre de controlo. Se forem erradas, podem se gerar colisões.

Usamos uma frequência de rádio apropriada para dar autorizações, informações e sugestões meteorológicas, estado dos equipamentos de Rádio Ajuda, entre outras, para que haja uma condução segura e eficiente dos voos”, disse.

Essencialmente, os controladores de tráfego aéreo dão autorizações que garantem que nos voos irão acontecer separados e num fluxo ordenado, nomeadamente para o controlo das aeronaves que estão em terra, a subir e a descer, e para as aeronaves que estão em cruzeiro evitando acidentes na área de jurisdição.

Esta profissão cria muito stresse exige muita concentração e contribui para que não nos sintamos sempre confortáveis. Cada sessão de trabalho é de sete horas contínuas, mas não nos queixamos. É uma boa profissão. Recomenda-se”, garante.

Por se tratar de uma actividade profissional que pode gerar emoções a qualquer instante, Elias Cossa diz que os controladores são submetidos periodicamente à Junta Médica para uma “bateria” de exames e análises.

A mescla de prazer e dor é tanta nesta área que até os métodos de trabalho misturam vantagens e desvantagens. Por exemplo, na Torre de Controlo do Aeroporto Internacional de Maputo, que é um dos mais modernos do país, ainda se usa o procedimento convencional de controlo das aeronaves.

No tal método convencional, o controlador não vê a aeronave que está no ar por via de um ecrã. “Temos que confiar nas palavras do piloto que nos reporta a sua posição e nós fazemos o reporte dessa informação”. Apesar de funcionarem até agora com esta técnica tem corrido tudo bem.

A outra alternativa seria o uso de radar que passa a informação para um painel e o controlador faz as necessárias leituras das posições de todos os aviões para que lhes possa dar as tais autorizações, informações e sugestões. Porém, este método que é moderno tem o seu senão. O controlador não pode permanecer por quatro ou mais horas a olhar para o ecrã porque, a dada altura, confunde os códigos dos aviões que ali aparecem e pode haver um caos.

Com o chamado método convencional, o controlador usa fitas de papel para registar os indicativos de cada avião que parte (fita azul), que chega (fita amarela) e que está a operar localmente (fita cor e rosa). “Pergunto a posição da aeronave, reporto essa posição fornecida, dou instruções e passo para o voo seguinte, assim sucessivamente”.

CADA UM POR SI

Depois de formados e devidamente treinados, os profissionais de controlo de tráfego aéreo tornam-se capazes de solucionar os problemas que lhes são colocados pelas tripulações das aeronaves sem ter que recorrer aos colegas que estão de folga ou aos colegas de lado que estão empenhados nas suas tarefas específicas.

Em princípio, todos tem o mesmo conhecimento e cada um pode resolver os problemas que vão surgindo. Contudo, temos um supervisor para eventuais auxílios. Mas, o controlador tem que ser capaz de gerir o tráfego”, afirma Elias Cossa.

Tanto é que o Aeroporto Internacional de Maputo ainda não atingiu o máximo da sua capacidade, pelo que Cossa garante que cada um dos controladores ali presentes consegue gerir 30 aeronaves em simultâneo. “Quanto maior é o número de aeronaves, maior é a necessidade de analisar cuidadosamente cada situação antes de dar instruções”.   

Mais adiante, o nosso entrevistado disse que entre os cuidados a tomar para assumir a posição de trabalho, um controlador deve evitar consumir bebidas alcoólicas oito horas antes de assumir o posto e, igualmente não consumir qualquer medicamente que lhe possa causar sonolência.

No que se refere ao tempo de vida útil de um controlador, Elias Cossa afirma que normalmente devia os profissionais desta área deviam se afastar das suas posições na torre entre os 50 e os 55 anos. Porém, acabam “esticando” um pouco porque a formação destes é muito cara. “É difícil ter um controlador porque a sua formação requer equipamentos muito dispendiosos, como são os casos de simuladores”, concluiu.

Trabalhadores querem

paz e salários justos

Angelina Mahumane

vandamahumane@gmail.com

O Presidente da República, Filipe Nyusi, saudou os trabalhadores moçambicanos, no solo pátrio e na diáspora pela celebração em todo o país e no mundo do 1º de Maio, Dia Internacional do Trabalhador.

Nyusi estendeu as suas felicitações para a Comissão Consultiva do Trabalho, que integra o Governo, empregadores e sindicatos pelos resultados consensuais que tem alcançado no diálogo nos processos negociais do salário mínimo por sector de actividade.

Isto revela maturidade, tolerância e cultura do diálogo no seio desta plataforma. No presente ano comemora-se a data com o sentimento dor e consternação porque ainda estão vivos na nossa mente os episódios tristes da violência xenófoba protagonizada por nossos irmãos sul-africanos”, disse.

As comemorações centrais desta data tiveram lugar na cidade de Maputo onde milhares de trabalhadores participaram no seu desfile. Mas também cada província, distrito, localidade teve um movimento dos trabalhadores locais.

Todos trajados a rigor, para além de apresentarem dísticos onde estavam patentes as suas preocupações dirigidas ao patronado e ao governom, ao mesmo tempo que alguns trabalhadores procuravam exibir o que é feito no seu dia-a-dia nos seus postos de trabalhos.

A Praça dos Trabalhadores, na baixa da cidade, palco do desfile, foi o ponto de romaria de homens e mulheres de diferentes sectores de labor, assim como organizações da sociedade civil e, comparativamente com os anos passados, o desfile começou ligeiramente tarde e, por conseguinte, terminou tarde, por volta das 14:00 horas, o que levou a que muitos trabalhadores não acompanhassem os discursos de forma presencial, optando por fazê-lo via de meios de comunicação como a televisão e a rádio.

Aliás, muitas avenidas da Baixa da Cidade de Maputo estiveram bloqueadas no período da manhã para permitir que a marcha acontecesse sem sobressaltos.

Um dos aspectos que saltou a vista na organização deste ano foi que os trabalhadores não desfiram por ordem dos sectores. Era possível encontrar bancários misturados com trabalhadores do sector de construção, via-se, por exemplo, o subsector da energia a marchar no meio de associações diversas.

Apelos a estabilidade política, consolidação da paz, não à xenofobia, salários justos e igualdade entre os trabalhadores moçambicanos e estrangeiros eram a tónica dominante dos dísticos apresentados na marcha. Algumas associações pediam ao Governo pensão igual para todos e a protecção da pessoa idosa. Enquanto isso, oFórum Mulher exigia 90 dias de licença de maternidade.

Os funcionários públicos que se fizeram presentes no desfile reclamavam dos cinco por cento de aumento salarial decidido na concertação social de 2015. Estes referem que os mesmos não condizem com o cabaz mínimo nacional. Tinha empresas que destacavam a promoção de emprego digno, decente e seguro, justiça laboral e social, respeito e consideração.

Outro grupo de trabalhadores reclamavam dos contratos precários e despedimentos sem justa causa, descontos não canalizados ao Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), a não observância das medidas de protecção, higiene, saúde e segurança no trabalho. A falta de transporte público condigno também constituiu uma das preocupações apresentadas pelos trabalhadores.

Entretanto, o Secretário-geral da Organização dos Trabalhadores de Moçambique – Central Sindical, Alexandre Munguambe, disse que espera que o novo governo cumpra com as suas promessas, nomeadamente o respeito pelos trabalhadores, que se crie condições para que o diálogo social seja uma realidade e que se trabalhe para melhorar os instrumentos que regulamentam a área laboral.

Munguambe reconheceu ainda que os resultados alcançados durante a negociação do reajustamento dos salários mínimos estão longe de oferecer aos trabalhadores e suas famílias condições de vida dignas, tendo em conta o actual preço dos produtos e serviços essenciais.

Falando para os trabalhadores, Munguambe apelou ao Governo para a necessidade da revisão urgente do decreto que versa sobre a matéria da pensão da velhice e do estatuto orgânico do INSS por entender que a medida vai ajudar a melhorar a qualidade de vida dos aposentados que clamam por uma pensão que os dignifique e compense o esforço empreendido ao longo dos anos de trabalho.

O movimento sindical congratula a decisão sábia do INSS de isentar as multas e reduzir os juros de mora em 50 por cento para as Micro, Pequenas e Médias Empresas devedoras de contribuições, o que permitirá que mais de 117 mil trabalhadores, incluindo as suas famílias, tenham acesso aos benefícios da segurança social”, aludiu.

Por seu turno, a Comissão dos Trabalhadores Mineiros na África do Sul congratulou o facto de terem conseguido desbloquear a exigência do governo daquele país que obrigava os nacionais a entrarem apenas com o passaporte biométrico, o que deixaria cerca de 35 mil mineiros desempregos.

Num outro momento, a comissão solicitou às entidades de direito a nível nacional para facilitarem a obtenção do documento biométrico, pois podem perder emprego se até Novembro deste ano não o apresentarem.

Pedimos a OTM e ao Ministério do Trabalho para resolver, entre outros, o problema da pensão para os trabalhadores mineiros, na África do Sul, que ainda não foi implementado e constitui o sonho de todo o mineiro, o enquadramento dos antigos trabalhadores em diferentes áreas mineiras no nosso país e o tratamento prestado as viúvas também nos preocupa”.

 Textos de Jorge Rungo e Angelina Mahumane, Fotos de Jerónimo Muianga e Fotos de Carlos Uqueio

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