O preço dos combustíveis poderá registar subidas nos próximos tempos mercê da aplicação efectiva do Decreto 45/2012 de 28 de Dezembro, o qual determina, entre outros, que “os preços de qualquer produto petrolífero devem ser revistos mensalmente sempre que houver uma variação superior a 03 por cento no mercado internacional ou ocorrer uma alteração do valor das imposições fiscais”. Com esta medida, o consumidor passará a pagar o preço real de cada litro de gasolina e gasóleo como se faz em todo o mundo.
Dados bastante precisos a que tivemos acesso mostram que está para breve a eliminação dos subsídios que são concedidos às empresas gasolineiras para permitir que o mercado funcione por si só e possibilitar que o Estado rapidamente se veja livre de encargos financeiros associados ao assunto.
Por exemplo, e como tem sido amplamente noticiado, a dívida acumulada junto das empresas do ramo no exercício económico de 2016 a esta parte já ultrapassa os 70 milhões de dólares. Também soubemos que em 2015 o Estado pagou 2,5 biliões de meticais, dos cerca de cinco biliões que tinha em dívida e só em 2014 é que pagou a factura resultante dos subsídios na totalidade.
A subida dos preços dos combustíveis, mais do que devolver a solvabilidade às empresas de distribuição e venda de combustíveis, vai tornar possível a reorientação de recursos financeiros usados para compensar as gasolineiras para o financiamento, por exemplo, da aquisição de meios de transporte público e infraestruturas sociais.
Conforme apurámos, a subida de preços de combustíveis será feita de forma gradual e mensal, conforme indica o Decreto 45/2012 que define o regime a que ficam sujeitas as actividades de produção, importação, recepção, armazenamento, manuseamento, distribuição, comercialização, transporte, exportação e reexportação de produtos petrolíferos.
O referido decreto reza que “os preços de qualquer produto petrolífero devem ser revistos mensalmente, e devem ser actualizados e comunicados às distribuidoras devidamente licenciadas na terceira quarta-feira de cada mês, ou, se esta for um feriado, no dia útil imediatamente seguinte”.
Assim, e em obediência a este instrumento, os preços dos combustíveis passarão a ser mexidos para cima ou para baixo “sempre que houver uma variação superior a 03 por cento no mercado internacional ou ocorrer uma alteração do valor das imposições fiscais”.O decreto a que temos feito alusão também indica que compete aos ministros que superintendem as áreas da Energia e das Finanças, procederem à alteração dos preços dos produtos petrolíferos, desde que o preço de venda ao público de qualquer produto não varie em mais de 20 por cento, face ao preço em vigor.
Por outro lado, é da competência do Conselho de Ministros proceder à alteração dos preços dos produtos petrolíferos, sempre que a variação do preço de venda ao público de qualquer produto seja superior a 20 por cento, face ao preço em vigor.
DOBRO DO PARQUE AUTOMÓVEL
Sabe-se igualmente que aquando da introdução do sistema de subsídios aos combustíveis, há cerca de sete anos, o parque automóvel nacional consumia algo em torno de 800 milhões de litros de combustíveis por ano e, por isso, a capacidade de geração de receitas internas permitia a liquidação regular desta dívida.
Entretanto, a realidade económica nacional mudou e, por exemplo, o parque automóvel cresceu a ponto de ser necessário importar e comercializar 1600 milhões de litros por ano, o que representa o dobro do que se importava e se consumia por volta do ano 2010. Só os transportes semicolectivos (chapas) hoje já são mais de sete mil.
Para além do crescimento do parque automóvel, observa-se que o panorama financeiro nacional deteriorou com a conjuntura interna e externa e as perspectivas de retoma da economia são agora vistas com prudência acrescida.
Estes e muitos outros condicionalismos estão a levar a que se cogite como inevitável a retirada dos subsídios para se devolver à economia o seu curso normal e fazer com que o mercado funcione com preços reais e o desenvolvimento seja igualmente real.
Ao mesmo tempo, faz-se uma análise do negócio regional de combustíveis e nota-se que Moçambique é o único na Austral de África que socorre-se de subsídios que tornam o combustível mais barato, até mesmo comparando com os países do interior do continente que tem custos logísticos maiores.
Aliás, o preço da gasolina e do gasóleo é mais barato no nosso país (50.02 e 45.83 meticais, respectivamente) do que na África do Sul (73.60 e 73.04 meticais), quando este último possui refinarias próprias e importa petróleo bruto e Moçambique importa o produto acabado.
Para além de Moçambique pagar mais caro pela importação de produtos refinados, ainda enfrenta o dilema de não dispor de infraestruturas que lhe permitem armazenar o produto em grandes quantidades, o que influencia na determinação de preços no país.
Outro exemplo que salta à vista é que Moçambique, Namíbia e Tanzânia recebem combustíveis na sua linha de costa e, por isso, não possuem custos logísticos elevados como acontece com a República Democrática do Congo, Zâmbia e Malawi. Entretanto, Moçambique tem o preço mais baixo de venda em cerca de 10 meticais quando comparado com Namíbia e Tanzânia.
SUBSÍDIOS: VELHOS ENCARGOS
Na verdade, os subsídios aos combustíveis são um velho tema de debate em diversos fóruns por se entender que estes criam uma destorção no mercado, gerando no cidadão a falsa ideia de que “está tudo bem”, quando a situação pode ser dramática.
Por exemplo, em finais de Abril de 2011, já havia sinais de alerta de que a manutenção dos preços dos combustíveis levaram à insustentabilidade dos subsídios alocados às gasolineiras, cuja factura ultrapassava aos 160 milhões de dólares no ano anterior, 2010, e chegou a 114 milhões de dólares no ano de 2009.
Com o receio de esta situação descambar numa roptura de stock, o Governo da época decidiu repor a modalidade de ajustamento normal de preços com a finalidade de aproximá-los à realidade do mercado. Foi por essas alturas que a gasolina passou dos anteriores 40 para 44 meticais por litro e o gasóleo subiu de 30.98 para 34.08 meticais.
Naquela altura, a compensação mensal às gasolineiras variava entre 10 e 12 milhões de dólares americanos, o que deu azo a questionamentos sobre a viabilidade e sustentabilidade da medida, uma vez que a mesma beneficiava de forma generalizada, inclusive, a pessoas singulares e instituições que dele não precisavam.
Por outro lado, observou-se em 2011 que o subsídio aos combustíveis tornava-os mais baratos no território nacional, o que animava aos revendedores dos países vizinhos, sobretudo do Zimbabwe, Malawi e Zâmbia, que poupavam o seu esforço de importar da origem para se abastecerem no nosso país.
Por causa deste cenário, no período que foi 2008 a 2010 o Governo se viu forçado a prescindir de 2476 milhões de dólares americanos para financiar a conta dos combustíveis, quando este dinheiro poderia ter sido usado para fins sociais, incluindo a melhora da rede de transportes de que o povo tanto se queixa.
Por outro lado, observou-se que a empresa mais prejudicada com todo este processo foi a Petromoc, por ser a única com obrigações sociais de assegurar o abastecimento em todo o país numa altura em que a factura de importação de combustíveis ainda girava em torno de 530 milhões de dólares (em 2010) contra 400 milhões de dólares de 2009. Hoje a factura de importação mais do que duplicou.
GASOLINEIRAS PREOCUPADASO facto é que os operadores nacionais do ramo, representados pela Associação Moçambicana de Empresa Petrolíferas (AMEPETROL), também concordam que, caso não se altere o actual sistema de compensações, a situação tem o potencial de provocar uma rotura de produtos petrolíferos nos diferentes terminais marítimos.
Em carta aberta largamente difundida nos meios de comunicação convencionais e nas redes sociais, aquela agremiação lamenta o facto de continuar a operar sob um comando que “obriga a que os mesmos sejam fixados abaixo do seu custo”.
“Fundamentalmente, o que está a acontecer com as companhias gasolineiras é o mesmo que comprar por exemplo um produto por 10 para depois vender por cinco e isso não é fazer negócio”, aponta a colectividade na missiva.
Nas contas daquela entidade, o Governo deve estar a ver crescer a sua actual dívida de 70 milhões de dólares pois, mensalmente a factura de compensações varia entre sete e 10 milhões de dólares. Segundo a AMEPETROL, este valor pode aumentar caso os preços no mercado mundial continuem com a tendência de subida que se tem vindo a verificar de há alguns meses a esta parte.
Esta agremiação também concorda que a manutenção dos subsídios faz com que o combustível comercializado em Moçambique seja o mais baixo de toda a região da África Austral e, provavelmente, dos mais baratos a nível mundial, razão pela qual, “muitos consumidores dos países vizinhos preferem abastecer as suas viaturas em Moçambique”.
Segundo a AMEPETROL, a situação é mais dramática na província central de Manica, em Moçambique, onde camiões cisternas idos do vizinho Zimbabwe atravessam a fronteira exportando combustível ilegalmente.
“Vemos, diariamente, grandes camiões de longo curso a entrar em Moçambique vindos da África do Sul na N4 e, se cada um daqueles camiões abastecer apenas 600 litros em Moçambique, isso multiplicado por cerca de 1.200 camiões por dia, representa um grande fardo para a economia moçambicana”, referem.
Da parte dos parceiros internacionais, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) também tem estado a recomendar que se proceda a reformas ao actual sistema de subsídios aos combustíveis e também no de importação que, na sua percepção, tem estado a sobrecarregar as contas do país.
Em diversos relatórios divulgados dentro e fora do país, ambas as instituições referiram que, em Maio de 2015, o Governo precisou titularizar cerca de 100 milhões de dólares de dívidas devidas aos distribuidores de combustíveis para saldar parte dos subsídios acumulados em 2014 devido, em grande parte, a ineficiências no sistema de importação.
Tal como é reconhecido por vários sectores, o FMI sublinha que o custo da importação de combustíveis para Moçambique é mais alto do que para a maioria dos países da região, devido a uma série de ineficiências no sistema de importação, sobretudo desde Abril de 2014.
Para não se ficar pela crítica, aquelas instituições de Bretton Wodds defendem que o país deveria adoptar medidas que poderiam ajudar a melhorar o sistema, nomeadamente a permissão aos distribuidores de produtos petrolíferos e às grandes empresas de recursos naturais para importar combustíveis e mobilizar financiamento directamente, de acordo com as suas necessidades de mercado.
Texto de Jorge Rungo