Reportagem

Uma resposta ao futuro

A operacionalização plena do Aeroporto Internacional de Nacala é um desafio que o país vai ter que enfrentar cara-a-cara uma vez que a escassas horas dali, existem dois aeroportos campeões de tipo Cristiano Ronaldo ou Leonel Messi, e com bastante fama pelo mundo fora. Trata-se dos aeroportos de Johannesburg, na África do Sul, e de Nairobi, no Quénia. Pelos vistos, chegou a hora de arregaçar as mangas e entrar para a luta de gigantes usando como armas as vantagens comparativas de que o país dispõe.

A nossa equipa de Reportagem circulou pela cidade de Nacala e ouviu de tudo um pouco sobre esta nova obra. Muitos residentes daquela cidade portuária não esconderam o seu sentimento de alegria por terem um aeroporto internacional à mão de semear, o que, na sua óptica, vai induzir o desenvolvimento de muitas outras infra-estruturas com benefícios sociais e económicos afins.

A par dos que celebravam aquele feito, também encontramos cidadãos cépticos em relação à dimensão do projecto porque, na sua óptica, Nacala ainda “precisa comer muita farinha” para atrair voos de grandes companhias internacionais que tragam e levem, de uma única vez, acima de 200 passageiros e com uma regularidade, por exemplo, semanal.

Jerónimo Tambajane, o director do Aeroporto Internacional de Nacala (AIN), parece estar tranquilo em relação aos comentários dos cépticos porque entende que “os desafios são para ser enfrentados e vencidos”. Conforme afirmou, mostrava-se necessário aproveitar a localização geográfica estratégica de Nacala para erguer uma infra-estrutura capaz de aproximar Moçambique dos principais destinos do mundo.

É claro que esperamos provocar e ter uma forte concorrência, sobretudo de Nairobi e de Johannesburg”, disse para depois acrescentar que o aeroporto de Dar-es-Salam, que se localiza na Tanzânia, não o assusta. “Nairobi é que é o desafio que devemos superar”, sublinhou.

Apesar de estar a projectar o futuro a partir de hipóteses, e não propriamente a partir de um estudo de mercado, Tambajane diz ainda que “havendo um possível tráfego internacional interessado em escalar Nacala, este poderá criar condições para que o tráfego regional e doméstico sejam alimentados a partir do AIN”.

Vantagens por explorar

O que parece ser ideia vincada é que o AIN está banhado de vantagens a começar pelo facto de estar dentro de uma Zona Económica Especial (ZEE) ainda em edificação, o que concorre em larga medida para que venha a ter muita procura por parte de homens de negócios nacionais e estrangeiros.

Em segundo lugar, a projecção daquele aeroporto terá sido feita a pensar na componente carga, coisa que escapa a muitos, daí que a aeronave crítica capaz de aterrar e partir dali seja de tipo Boeing 747 ou Airbus A340 para permitir a confluência com os sistemas ferroviário e rodoviário.

Em relação ao aeroporto de Nampula, que está a 200 quilómetros de Nacala, ou seja, a uns 20 minutos de voo, Tambajane afirma que aquele vai continuar de pedra e cal, pese embora possa ressentir-se de uma pequena redução de passageiros, uma vez que parte dos que voavam a partir de Nampula eram cidadãos estabelecidos em Nacala.

O aeroporto de Nampula está a atender a um tráfego assinalável de nível doméstico caracterizado por dois voos diários para Maputo que estão sempre lotados mas, parte significativa destes passageiros são de Nacala”, disse acrescentando em seguida que o tráfego regional naquele aeroporto não é expressivo.

Sobre o impacto do AIN no aeroporto de Pemba, recentemente reabilitado, o director do aeroporto de Nacala aponta que este está a registar um crescimento de movimento que é fruto das pesquisas de gás e petróleo que estão a ocorrer na Bacia do Rovuma e de algum turismo que começa a ganhar força.

Tambajane diz que a sua certeza no sucesso do AIN resulta do facto desta nova infra-estrutura possuir um carácter integrado com fulcro nos projectos de escoamento de carvão a partir do Porto de Nacala-a-Velha, que se situa a escassos 30 quilómetros de Nacala-Porto e que trazem um imenso movimento de pessoas e bens.

Por outro lado, o governo aprovou um mega projecto turístico denominado “Crusse-Jamal” e um projecto agrícola interprovincial conhecido por ProSavana, ambos com investimentos avultados e necessidades de mão-de-obra interna e externa.

Outro ponto de suporte para a implantação daquele aeroporto internacional em Nacala chama-se “Aeroporto-Cidade” que, conforme apurámos, consiste na construção várias infra-estruturas multiuso em Nacala, no quadro de Parcerias Público Privadas (PPPs).

Fontes ligadas ao assunto indicam que esta iniciativa está muito avançada, o que equivale a dizer que tem “luz verde” para a construção de unidades hoteleiras, residenciais, comerciais, entre outros sob a égide do grupo Visabeira. “Como se pode ver existe um suporte para o AIN vingar”, afirma Jerónimo Tambajane.

Aeroporto à medida das necessidades

Conforme referimos no início desta Reportagem, paira uma certa preocupação em relação a tudo o que cerca o AIN. Ouvimos munícipes de Nacala que questionam o tamanho do aeroporto. A questão que colocam é, porquê construir um aeroporto enorme com base em expectativas de um eventual movimento futuro.

Levamos a pergunta a Jerónimo Tambajane que respondeu de pronto e a seco. “Este aeroporto não é maior que as projecções. Ele foi concebido para ser a porta de entrada e de saída para atingirmos o mercado europeu, asiático e americano. É essa a intensão. Aliás, pode ser necessário ampliá-lo daqui a uns 10 anos sem termos que paralisar as operações”, frisou.

Certo de que os desafios que se avizinham serão duros, mas superáveis, o nosso interlocutor espreitou a sua cábula e rematou que o AIN está preparado em termos de recursos humanos para atender a todas as operações contando com mão-de-obra jovem e recrutada e formada a nível local, aos quais se juntam alguns técnicos com mais experiência seleccionados de outros aeroportos.

Aliás, testemunhámos no local que as instituições de Estado que se relacionam com matérias aeroportuárias, nomeadamente Polícia, Alfândegas, Bombeiros, Saúde, Agricultura e Migração destacaram equipas de trabalho que já se familiarizaram com os equipamentos, cantos e recantos daquela infra-estrutura.

O dilema dos cortes de energia 

Conforme referimos ao longo desta Reportagem, o AIN é uma pêra mas, como todas as outras empreitadas que se erguem na região norte do país, está a receber energia da rede nacional “aos pingos”. Cortes de energia são tão frequentes que o director técnico do projecto, António Loureiro, classifica de “complicado”.

A Electricidade de Moçambique (EDM) já anunciou que está a busca de financiamentos para construir uma segunda linha para alimentar toda a zona norte do país que, até agora, conta apenas com uma linha de transporte que percorre mais de mil quilómetros desde a subestação de Chimuarra, na Zambézia, para fornecer energia às províncias de Nampula, Zambézia, Cabo Delgado e Niassa.

A par desta linha, a EDM diz que dentro em breve vai concluir a montagem de bancos compensadores nas subestações desta região para melhorar a qualidade do fornecimento. Porém, para o AIN todo este esforço pode se afigurar pequeno, na medida em que esta infra-estrutura, sozinha, consome cerca de quatro megawatt, o que equivale à energia eléctrica consumida por toda a cidade de Pemba.

Por causa disso, e conforme apurámos, a EDM está a ser impelida a, rapidamente, construir uma linha dedicada a este novo aeroporto que se vai conectar aos diferentes geradores que esta infra-estrutura possui e que, até agora, garantem a redundância para que os equipamentos e máquinas ali instalados funcionem em estágio permanente.

Afinal, havia muita

procura e nenhuma oferta

Jorge Rungo

jrungo@gmail.com

O Aeroporto Internacional de Nacala (AIN) já está a receber aeronaves da empresa Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) em regime experimental e com a anuência do Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IAC). A rota Maputo-Nacala está a ser explorada através de uma aeronave de tipo Embraer-145, com capacidade para 50 passageiros e, ao que tudo indica, a LAM poderá estar na contingência de usar um aparelho maior porque há demanda.

Recebemos a missão de escalar Nacala numa altura em que as Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) ainda mantinham em segredo o projecto de lançar voos directos de Maputo para Nacala, cidade que, à semelhança de Tete e Pemba, está na moda, tendo em conta os musculados investimentos que acolhem no quadro da pesquisa e exploração de recursos naturais e não só.

Quando a ligação directa entre a capital do país e Nacala foi finalmente anunciada, “estalamos os dedos” e, em poucas horas, fomos integrados na lista de passageiros do voo inaugural desta rota, cujos passageiros mais destacados eram quadros de topo das LAM e da Moçambique Expresso (MEX), do Instituto de Avião Civil de Moçambique (IAC) e jornalistas dos mais variados órgãos de informação.

Com um atraso de cerca de 25 minutos, resultante da finalização dos arranjos que nos pareceram incontornáveis, o pequeno jacto de marca Embraer-145, rolou pela placa e se pôs no ar, a mais de 300 quilómetros por hora, sob as ordens do experimentado comandante Amílcar Polana, um homem maduro, cuja pujança física denuncia muita experiência de vida, de voo e traquejo na manipulação de aeronaves.

A manhã era de céu limpo, o que não impedia que o avião, de 50 lugares todos preenchidos, e com uma velocidade de cerca de 850 quilómetros por hora, a voar a mais de 11 quilómetros do chão, oferecesse aquela trepidação que deixa qualquer passageiro a pensar numa viagem por terra que, ao contrário do que se pensa, é estatisticamente mais arriscada do que a viagem por ar.

Aliás, já no destino, um dos funcionários da torre de controlo do Aeroporto Internacional de Nacala (AIN) esclareceu que céu limpo não é proporcionalmente directo a voo tranquilo. Antes pelo contrário. O mesmo funcionário, que assegura a aterragem de aviões, também prefere viver e ter o pé em terra firme. Pelos vistos, esta coisa de voar é mesmo para pássaros.

Passada uma hora, a aeronave cruzou os céus da cidade da Beira e lá veio uma “Light Turbulence” (pequena turbulência) que o comandante Amílcar Polana não pôde esconder.

Mantenham-se sentados e com os cintos de segurança apertados”, disse, para a inquietude dos que experimentavam aquela sensação de solavancos aéreos pela primeira vez na vida. Mas, passados cerca de cinco minutos, o sinal de apertar o cinto se desligou e lá seguimos sob a presença de um abanãozinho aqui e outro ali até ao destino.

Voos lotados

Por volta das nove horas, os medos “se evaporaram” pois, a aeronave já estava em terra firme. Alguém (das LAM) bateu palmas e os restantes passageiros seguiram-lhe o exemplo. Pelas janelas, era visível um aparato pouco comum junto ao edifício principal.

Estava ali todo o governo do distrito e do município de Nacala, funcionários do AIN e das LAM perfilados para receberem os primeiros passageiros. Só faltaram batucadas, cânticos e danças. O resto houve, incluindo foto de família (entre a tripulação e passageiros), brindes e champagne. O Corpo de Bombeiros lançou jactos de água para o avião. Era o baptismo do primeiro voo comercial que o AIN acolhia.

Enquanto outros trocavam palmadas nas costas e abraços efusivos, abordamos o administrador comercial das LAM, Carlos Fumo, o qual assegurou que existe um estudo que indica que “há um grande mercado por explorar em Nacala por se tratar de uma cidade portuária coberta pela Zona Económica Especial (ZEE)”.

Segundo Fumo, aquele primeiro voo para o AIM foi “excelente” porque não foi largamente publicitado e, mesmo assim, as solicitações de passagens ultrapassaram a capacidade da aeronave usada. “Nos próximos tempos poderemos considerar a possibilidade de usar o Embraer-190 (avião com capacidade para cerca de 100 passageiros) porque as indicações são muito boas”, sublinhou.

Fumo asseverou que os voos Maputo-Nacala-Maputo não vão afectar as ligações entre a capital do país e os aeroportos de Nampula e Pemba pois, segundo ele, a ideia é fazer a diferença encurtando o tempo de viagem de quem pretende escalar Nacala em cerca de duas horas.

O resultado da ousadia da LAM parece estar a surtir efeito uma vez que nos dois voos subsequentes (de quarta e sexta-feira) o Embraer-145 teve os lugares completamente preenchidos e o balcão de emissões instalado no AIN começou a dar sinais de ser pequenino para tamanha demanda.

Enquanto a LAM celebra as enchentes, o Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IAC), presidido famoso Comandante João de Abreu, fez saber que aquele aeroporto internacional já recebeu uma autorização para operar em regime experimental e que o certificado final será passado durante o primeiro trimestre do próximo ano.

Há um trabalho de fundo que devemos desenvolver, nomeadamente para testar, calibrar e certificar os equipamentos de ajuda à navegação e as infra-estruturas que garantem a comodidades dos passageiros, incluindo a capacidade dos bombeiros e serviços de ambulância”, disse.

Expectativas por gerir

Por seu turno, o Conselho Municipal de Nacala entende que o estabelecimento daquele aeroporto internacional no seu perímetro de jurisdição é um marco importantíssimo para o seu próprio desenvolvimento, na medida em que vem se associar a outras iniciativas já estabelecidas.

Rui Chong Saw, novo edil de Nacala, que entende muito bem de negócios, por ser empresário, disse ao nosso jornal que esta infra-estrutura é um símbolo de desenvolvimento do município que se associa ao porto de águas profundas que a cidade alberga e ao Corredor de Nacala.

Estes e outros projectos que aqui ocorrem têm a vantagem de atrair investidores e turistas que, de forma directa e indirecta, geram emprego e promovem o nosso desenvolvimento, sublinhou Chong Saw que acredita que, daqui a uns seis meses, aquele aeroporto terá actividades concretas que resultarão no desenvolvimento do turismo, negócios, entre outras actividades.

Cerca de uma hora depois de aterrar, o Embraer-145 das LAM voltou à pista e acelerou para os ares, levando consigo os primeiros passageiros que faziam a rota de regresso, ou seja, Nacala-Maputo. Duas horas depois, as redes sociais estavam prenhes de imagens do aeroporto que o Presidente Armando Guebuza inaugurou ontem e da foto de família que foi promovida à chegada a Maputo.

Texto de Jorge Rungo

jrungo@gmail.com

Fotos de Carlos Uqueio

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