Desporto

Morreu o “Velho Capitão”

Neto de um america­no e de uma princesa moçambicana, Mário Wilson nasceu (17 de Outubro de 1929) para o futebol de pé descalço nas ruas de Lourenço Marques (actual Maputo). Os seus dotes trouxeram-no para Lisboa, pri­meiro para o Sporting, mas foi na Académica que viveu os me­lhores anos da sua carreira e ali seria imortalizado com o epíteto de “Velho Capitão”.

Pendurou as chuteiras para assumir o papel de treinador, orientando o Ben­fica, o seu outro grande amor, a par da “Briosa”, e da selecção nacional, mas conheceu muitos outros bancos técnicos. Foi ínti­mo de Agostinho Neto, Marceli­no dos Santos, Daniel Chipenda e apoiante de primeira hora dos movimentos independentistas africanos. Morreu na segunda­-feira passada aos 86 anos, na sequência de uma pneumonia.

Durou cerca de um mês a viagem que levou Mário Wilson de Moçambique para Portugal (Lisboa). A bordo do "Mouzinho de Albuquerque", o jovem de 19 anos, deixava para trás o Des­portivo de Lourenço Marques, filial do Benfica, para alinhar ao serviço dos “leões”. Um passo de gigante para o neto do co­merciante Henry Wilson, que um dia também cruzou o oceano para encontrar no Catembe o amor da sua vida, no rosto da fi­lha de um dos primeiros régulos (chefes tribais) da região. O jo­vem Wilson iria também entrar na aristocracia sportinguista, onde teria a missão de suceder ao “rei” Peyroteu, o mais bri­lhante dos “cinco violinos”.

Não se vai demorar muito tempo com o “leão” ao peito. Apenas duas épocas. Mas dei­xa a sua marca. Será o melhor marcador da equipa na tempo­rada de estreia (1949-50) e o se­gundo goleador do campeonato; ajudará à conquista do campeo­nato no ano seguinte. No Spor­ting será também adaptado a defesa central, posição onde se irá fixar e que iria solidificar na Académica numa longa relação de 12 anos como jogador.

Em Coimbra, irá igualmente despertar para a política, inspi­rado pelo ambiente subversivo contra o regime ditatorial que se respira na cidade estudantil. Partilhará a mesma República com Almeida Santos, o já fale­cido ex-presidente da Assem­bleia da República, mas também priva com grandes figuras dos movimentos independentistas das antigas colónias africanas portuguesas, como já havia acontecido na capital, onde aprofundou uma íntima amizade com Agostinho Neto, com quem partilha casa.

Encerra a carreira nos relva­dos na temporada de 1962-63, permanecendo ligado à Acadé­mica, como técnico-adjunto, no­meadamente de José Maria Pedroto, com quem tem uma rela­ção conflituosa, substituindo-o no cargo de treinador principal em 1964. Vai viver momentos de glória à frente da “Briosa”, com quem se sagra vice-campeão nacional na época de 1966-67, algo inédito na história do clube.

O Benfica, o outro grande amor confesso de Mário Wilson, surge no percurso do técnico em 1975, aos 46 anos. Ao serviço das “águias” será o primeiro treinador português a ser cam­peão, logo na época de estreia. Irá regressar inúmeras vezes ao banco “encarnado”, como “bombeiro de serviço”, con­quistando a Taça de Portugal em 1979-80 e 1995-96.

Entre os inúmeros jogado­res que lançou estão Álvaro Magalhães e Pedro Henriques. Duas gerações diferentes de futebolistas, mas o mesmo carinho pelo “mister Wilson”. “Conheci-o com 19 anos na Académica e foi ele que me ensinou valores como educa­ção, disciplina e equilíbrio. Fora de campo era um amigo. Foi o melhor treinador que tive em termos humanos”, lembra o agora também treina­dor Álvaro Magalhães.

Era um homem com um discurso empolgante, tanto nas galas como nos treinos”, garante Pedro Henriques, agora comentador desportivo: “Nos anos em que o Benfica atra­vessava períodos de crise, só ele nos fazia ficar contentes. Era uma maravilha.”

No seu currículo o antigo trei­nador teve uma passagem em 1978 como seleccionador nacio­nal e regressa à Luz e ao Benfica na época de 1979/80, conquis­tando a Taça de Portugal.

Mais tarde, e depois de ter conhecido um período negro na sua vida de treinador, ao ponto de ter de emigrar e treinar o FAR de Marrocos, Mário Wilson regressa ao Benfica para traba­lhar ao lado de Artur Jorge.

Com a saída de Artur Jorge do clube da Luz, o "Velho Capi­tão" passa a liderar a equipa e volta a vencer a Taça de Por­tugal. Aliás, Mário Wilson ficou conhecido entre os benfiquistas como um verdadeiro pronto­-socorro, o bombeiro de servi­ço, sempre disponível quando o Benfica precisava dos seus serviços.

A carreira do "Velho Capi­tão" foi longa. Contabilizou 44 épocas como treinador e 986 jogos. Terminou o seu percurso na época de 1998/99, ao serviço do Alverca. Para sempre, como fez questão de dizer publica­mente, o futebol deixou-lhe dois amores eternos: o Benfica e a Académica.

Antes, Mário Wilson, ainda no activo como atleta, já fora treinador-adjunto do mestre Cândido de Oliveira, de Biri e do próprio Pedroto.

Mário Wilson, já treinador de reconhecida valia, treina outros clubes importantes do futebol português, como Belenenses, V. Guimarães e Boavista, mas é no Benfica, onde chega em 1975, para render o inglês John Mor­timore, que atinge o ponto mais alto da sua imensa carreira de treinador, sagrando-se campeão nacional e deixando, por sua vontade, o cargo de treinador dos encarnados.

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