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ATÉ SEMPRE, “XAKITO NA NYARRA”! MÚSICO DE INHARRIME

Por Idnórcio Muchanga

“Melhor é a boa fama do que o unguento precioso, e é melhor o dia da morte do que o do nascimento” Eclesiastes 7:1

A Associação Distrital dos Músicos de Inharrime está de luto. Acaba de perder definitivamente uma das melhores senão a melhor e maior voz e autoridade no que à música popular e em particular de expressão “txitxopi” diz respeito. A notícia da morte de “XAKITO NA NYARRA” (que traduzido para português seria “Chaquito Eu Arranho”, na madrugada do passado dia 22 do corrente mês, só não caiu como uma bomba porque foi daquelas mortes que Gabriel José Garcia Márquez, escritor, jornalista, activista e político colombiano, apelidaria de “Uma Morte Anunciada”, pois de uns tempos a esta parte ele foi diversas vezes dado como morto. Viria a perder a vida no Hospital Provincial de Inhambane, após ter sido transferido do Hospital Distrital de Inharrime onde estivera de baixa durante duas semanas. Idolatrado na sua terra natal, contrariou assim o princípio segundo o qual “Os Santos da Terra não fazem Milagres”. Era, em Inharrime, tido e achado como verdadeiro “astro”. Não obstante, não conseguiu constituir-se em excepção relativamente à forma penuriosa em que muitos da sua classe vivem e terminam os seus dias. Sofrendo duma doença prolongada e degenerativa, passavam já uns três meses que “XAKITO NA NYARRA” não aparecia nos palcos a abrilhantar, não só com a sua voz melodiosa, mas, sobretudo, pelo conteúdo das suas canções, muitas delas educativas, mas outras satirizantes de roçar e ferir susceptibilidades. Nas principais actividades culturais oficiais e em espectáculos particulares em Inharrime, ele era o cabeça-de-cartaz. A cerimónia fúnebre do malogrado, muito comovente, decorreu no seu casebre construído de material local e tradicional (cobertura de capim gigante e parede de caniço com o duro chão de areia), na povoação que terá testemunhado a sua vinda a este tumultuoso planeta em Txirambweni, uma aldeia que dista vinte quilómetros da vila-sede do distrito (aproximadamente quarenta minutos de automóvel), numa estrada de macadame. Carregada de muita emoção, quem não soubesse de quem se tratava, e passasse por ali naquele momento, poderia pensar tratar-se do enterro de alguma personalidade que teria ocupado uma alta posição nas esferas política ou governamental, tendo em conta o mar de gente que inundou literalmente todo o espaço limpo onde vivia o malogrado, sendo que para mim aquele foi o segundo enterro concorrido que testemunhei em toda a minha vida no distrito, tendo sido o primeiro no longínquo ano de 1961 quando acompanhámos os restos mortais de um administrador que morrera afogado na praia de Zâvora em pleno dia Primeiro de Janeiro. Com uma pequena margem de erro, posso afirmar que participaram na cerimónia aproximadamente um milhar de pessoas de todas as idades, com destaque para músicos locais e seus fãs. Reconheci na multidão o chefe da Repartição Distrital da Cultura que acredito estaria em representação do Governo Local. Mas afinal quem foi “XAKITO NA NYARRA”, que conseguiu arrastar uma enorme multidão no seu último adeus? De seu nome verdadeiro Benedito Sérgio Banze, à data da sua morte tinha 34 anos de idade, tendo iniciado a sua carreira como corista e dançarino do não menos famoso “Chapion”, o auto-intitulado dono de Inharrime “Ngani ni nga n'gola Nyarimi”. Nascido na povoação que agora acolheu os seus restos mortais, rapidamente conseguiu superar o seu mestre e mentor. Em vida gravou muitas músicas que hoje são recorrentemente tocadas em todas as festividades e cerimónias sociais. Temas como “Do wa Do Dyanani Ndole” (Esconde Esconde), “Na wuya” (Estou a regressar) e, sobretudo, o “Salani maxaka na tsula Nzumani” (adeus família vou para o Céu), esta última que seria um verdadeiro grito de despedida, por ter sido tocada durante todo o tempo que durou a cerimónia fúnebre, dilacerando os corações de todos os presentes, ao ponto de provocar o desmaio da viúva do malogrado. Infelizmente, e como aconteceu com muitos dos seus colegas de profissão, também “XAKITO NA NYARRA” cantou e encantou durante a sua breve estadia na terra mas partiu para o além em “absoluta penúria”, pois no seu casebre enquanto esperávamos pela derradeira despedida, as mulheres, como sempre, socorreram-se das suas multicoloridas kapulanas enquanto nós, homens, assentamos os nossos traseiros no duro chão. À mãe de “XAKITO NA NYARRA”, aliás Benedito Sérgio Banze, meia-irmã da minha falecida sogra, vão os meus sentimentos de pesar. Paz a sua Alma!

Por Kandiyane Wa Matuva Kandiya
nyangatane@gmail.com

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