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O poder das fibras

Por admin

Texto de Bento Venâncio e Fotos de Inácio Pereira e Carlos Uqueio

Diabetes é doença caracterizada pela elevação da glicose (açúcar) no sangue (hiperglicemia). Afecta 720 mil moçambicanos. Como reduzir açúcar de modo a que estes doentes melhorem?

Na falta da insulina natural (que ajuda a reduzir açúcar no sangue), cientistas inventaram injecções de insulina, que têm ajudado bastante nos centros de saúde.

Uma experiência bem recente anima o debate nos “corredores” da Medicina, tudo isto porque há quem diga que o quiabo é o melhor remédio natural para a diabetes. A explicação é simples: tem grande concentração de fibras que ajudam a baixar os níveis de glicose no sangue, a partir do intestino.

Ano antepassado estudantes ganharam um prémio num programa de televisão brasileiro (da Rede Globo) ao provarem que a água do quiabo controla a diabetes.

Três anos antes, um estudo publicado no Journal of Pharmacy and Bio-allied Science já colocava a hipótese de o quiabo ser potencial fonte alternativa para tratamento da diabetes, pois reduzira, de forma significativa, a glicemia em animais testados em laboratório.

Mas o que são fibras, o tal “material milagroso” do quiabo? Estamos falar de substâncias cujas moléculas não são digeridas e nem tão pouco absorvidas pelo organismo. Não adicionam nutrientes nem calorias.

Mesmo assim seu consumo é fundamental, porque agem como uma vassourinha, absorvendo excessos (açúcar, gordura) e “varrendo” para fora de corpo o que não necessita.

A presença de fibras nos alimentos ajuda, assim, a manter o corpo em equilíbrio, proporcionando melhor funcionamento do sistema gastrointestinal, contribuindo substancialmente no controlo do peso, retardando o esvaziamento gástrico, provocando maior sensação de saciedade, prevenindo doenças cardiovasculares e até ajudando a manter bons níveis de colesterol e glicose.

Segundo nutricionistas, frutas, legumes, verduras, leguminosas (feijão, soja, grão de bico) oleaginosas (castanhas, nozes), cereais integrais ( granola, pães, arroz, farelo de trigo) são ricos em fibras, constando do cardápio de muitos cidadãos moçambicanos diabéticos.

Nas páginas que se seguem, tentamos explicar de que forma o quiabo pode ajudar doentes com diabetes.

O “milagre” do quiabo

A “bomba” estoirou no Brasil. Caprichosamente, três meninos demonstraram, no ano antepassado, que a água do quiabo pode ajudar no tratamento da diabetes, uma doença crónica que afecta milhões de pessoas no mundo. Nada mais simples: levas três ou quatro quiabos, cortas em pequenas rodelas, colocando-as na água fria logo em seguida. Só deves beber a mistura dia seguinte.

Este tratamento tão simples para uma doença que é bico-de-obra para a Medicina (não tem cura) está a apaixonar milhares de cidadãos diabéticos que revelam, na sua maioria, que têm visto os níveis de glicemia (açúcar no sangue) a baixarem de forma considerável, o que contribui para o melhor controlo da sua doença.

A verdade é que desde então os manuais de Medicina estão a ser virados e revirados na busca de uma explicação para este fenómeno.

Os médicos, sem subestimar o potencial do quiabo, alertam para a necessidade de os cidadãos diabéticos continuarem a confiar nas unidades sanitárias onde o controlo da diabetes e mais seguro e efectivo.

E o “nervosismo” começou mesmo no Brasil, onde o assunto foi aflorado, destacando-se a Sociedade Brasileira de Diabetes que “vê com grande preocupação a divulgação por grandes veículos de comunicação, formas alternativas de tratamento do diabetes, especialmente para as pessoas em uso de insulina”.

A Sociedade Brasileira de Diabetes recomenda as medidas da praxe: pessoas portadoras de diabetes devem manter uma alimentação saudável, uma actividade física regular, uso de medicamentos prescritos pelo médico, incluindo insulina (se necessário) e visitem um serviço de saúde para realização de exames periódicos e consultas com outros especialistas quando necessário: cardiologista, oftalmologista, nefrologista etc.

Por último, a Sociedade Brasileira de Diabetes esclarece que tratar diabetes não significa somente tratar a glicemia, mas tratar também o colesterol, a pressão arterial, a obesidade, o hábito de fumar e todos factores de risco para a doença vascular.

SITUAÇÃO EM MOÇAMBIQUE

Em pleno momento das redes sociais, a notícia chegou rapidamente ao país, onde três por cento da população (720 mil habitantes) vive com diabetes.

As pessoas sofregamente apegaram-se ao quiabo e vão testemunhando que sua água influencia na redução dos níveis de glicemia no sangue.

Trata-se de uma informação que pode ajudar milhares de doentes crónicos no país. Só para termos uma ideia sobre esta doença crónica, catorze mil pessoas tratadas por ano em todas as províncias.

Para se debruçar sobre o assunto, domingo ouviu Armindo Tiago, endocrinologista moçambicano que trabalha no Hospital Central de Maputo. Disse à nossa Reportagem que sempre acreditou que os medicamentos são produzidos na base de plantas existentes na natureza.

Inseriu o quiabo no potencial já demonstrado pela moringa e pelo malambe (fruta do embondeiro) que a sabedoria popular reputa como remédios naturais para diabetes e uma série interminável de doenças.

“ Podem ajudar, mas reconheço a incapacidade de explicar”,diz-nos o endocrinologista, ressalvando que seria gratificante que todas substâncias fossem estudadas de forma científica para se apurar o respectivo princípio activo.

“Nesta base seria saudável um dia a Medicina sublinhar, comprovadamente, que partir do quiabo há um medicamento para tratamento de diabetes melitus”, salientou.

MUDAM-SE OS TEMPOS,

MUDAM-SE AS VONTADES

A famosa frase de Luís Vaz de Camões, poeta português, tem enquadramento na explicação da multiplicação de casos de diabetes no país.

Armindo Tiago, único médico especialista no país e presidente da Associação Moçambicana de diabéticos desde 2011, disse à nossa Reportagem que a doença afecta mais pessoas nas zonas urbanas.

A diabetes entre moçambicanos

A diabetes é doença crónica. A sua expansão no país resulta, dentre outros factores, de mudanças no estilo de vida.

Para Tiago, único médico especialista do ramo no país, a diabetes pode ser prevenida mediante a prática de actividade física regular. “Há 30 anos tínhamos um estilo diferente do de hoje. No passado andávamos a pé até chegar a cidade”, disse

Com a proliferação de chapas e com as tantas facilidades na compra de viatura própria, os moçambicanos perderam o hábito de caminhar, ficando previsivelmente expostos à diabetes.

Na senda de mudanças de estilo de vida, nossos concidadãos passaram a consumir mais gorduras, fumo e bebidas, revelando tendência para aumento de peso.

Ressalvou, contudo, que mesmo nas zonas rurais a tendência é de mudança, pois os hábitos alimentares são diferentes dos de ontem. “Daqui a pouco não haverá grande distância entre campo e cidade”, disse.

O nosso entrevistado sublinha que é importante respeitar a sabedoria popular, segundo a qual “prevenir é melhor que remediar. “Diabetes não tem cura. É para toda a vida”, avisou.

Referiu que é fundamental assegurar a combinação de alimentação saudável e actividade física regular.

É preciso lutar contra sedentarismo, privilegiando actividade física regular durante pelo menos quatro dias por semana. É preciso andar a pé. Subir escadas”, explicou.

Discorrendo sobre alimentação saudável apontou a necessidade de não se consumir nutrientes em excesso. Ou seja: é importante se evitar os chamados  fast-food, os hamburgers, que contribuem para aumento de calorias, causando a obesidade. Com gordura, a insulina não funciona bem. Resistência insulínica. Os receptores não recebem adequadamente.

Refira-se que a obesidade causa resistência a insulina. As células do nosso corpo passam a responder cada vez menos presença de insulina.

Por outro lado, o sedentarismo (falta de exercício físico) é também contribuinte para a resistência insulínica. É importante entender que as células musculares são grandes utilizadoras da glicose (açúcar) no sangue e que quando fazemos exercícios estas células absorvem a glicose muitas vezes até sem se precisar de insulina.

Falando ainda sobre alimentação saudável, o nosso entrevistado esclareceu que é importante a combinação adequada de nutrientes: carbohidratos, gorduras e proteínas.

Salientou a importância de uso de gordura saudável, destacando o azeite como exemplo.  “Gorduras de origem animal são piores. Melhores de origem vegetal”, elucidou.

Por outro lado, o consumo de carnes vermelhas deve ser reduzido.

Antes saboreávamos a urina

Como já explicamos atrás, diabetes é doença crónica que tem como razão a fraca produção de insulina.

A insulina é responsável pela absorção de açúcar em excesso na corrente sanguínea.

Resultado: a sua falta faz com que a concentração de açúcar aumenta no sangue, o que faz com que a urina dos diabéticos seja doce. “Há muito tempo, os médicos viam-se forçados a provar a urina dos doentes para diagnosticar diabetes”, conta-nos Armindo Tiago, endocrinologista.

Explicou que hoje a melhor forma de apurar a doença é o doente urinar no chão. “Basta ver formigas em torno do xixi, há diabetes”, rematou.

Os sinais da diabetes

O excesso de urina, chamado em Medicina de poliúria, é um dos primeiros sinais e sintomas do diabetes. Quando há uma elevada concentração de glicose (açúcar) no sangue, o corpo precisa arranjar meios de eliminar este excesso. O caminho mais fácil é pelos rins, através da urina.

Como não podemos urinar açúcar puro, o rim precisa diluí-lo com água para poder eliminá-lo. Portanto, quanto maior for a glicemia (concentração de glicose no sangue), mais urina o paciente eliminará.

MUITA SEDE

Se o paciente diabético urina em excesso, ele perderá mais água do que era suposto, ficando desidratado. A sede é principal mecanismo de defesa do organismo contra a desidratação.

O paciente diabético que não controla sua glicemia, seja por má aderência ao tratamento ou simplesmente porque ainda não descobriu que tem diabetes, acaba por entrar em um ciclo vicioso. O excesso de glicose aumenta a quantidade de água perdida na urina, fazendo o paciente urinar com grande frequência. A perda de água causa desidratação, que por sua vez desencadeia uma sede excessiva. O paciente bebe muita água, mas como a glicose continua muito alta no sangue, ele mantem-se urinando a toda hora.

O CANSANÇO

O cansaço crónico é outro sintoma comum do diabetes e ocorre por dois factores: desidratação, explicada no tópico anterior. A glicose é a principal fonte de energia das células; é o “combustível” do nosso organismo. Quem promove a entrada de glicose do sangue para dentro das células é a insulina, que na diabetes é inexistente ou não funciona bem. Portanto, a diabetes se caracteriza essencialmente pela incapacidade do organismo em transportar glicose para as células, reduzindo a capacidade de produção de energia do corpo.

Perda de peso

A perda de peso é um sintoma muito comum . Como não há glicose para gerar energia, as células acabam tendo que gerá-la a partir da quebra de proteínas e dos “stocks” de gordura do corpo.

Portanto, o corpo sem insulina não gera músculos nem gorduras e ainda precisa consumir as reservas existentes.

 Fome excessiva

Como as células não conseguem glicose para gerar energia, o corpo interpreta este fato como se o paciente estivesse em jejum. O organismo precisa de energia e o único modo que ele conhece para obtê-la é através da alimentação.

Uma das características do emagrecimento do diabético é que ocorre apesar do paciente alimentar-se com frequência. O problema é que a glicose ingerida não é aproveitada e acaba sendo perdida na urina.

Visão embaçada

Um sintoma muito comum da diabetes é a visão turva. O excesso de glicose no sangue causa um inchaço do cristalino, a lente do olho, mudando sua forma e flexibilidade, diminuindo a capacidade de foco, o que torna a visão embaçada. A visão costuma ficar turva quando a glicemia está muito elevada, voltando ao normal após o controle da diabetes.

Cicatrização deficiente

O excesso de glicose no sangue, quando corre de modo crónico, causa inúmeros distúrbios no funcionamento do organismo. A dificuldade em cicatrizar feridas ocorre por uma diminuição da função das células responsáveis pela reparação dos tecidos, diminuição da proliferação celular e dificuldade em se gerar novos vasos sanguíneos.

Bento Venâncio

Fotos de Inácio Pereira e Carlos Uqueio

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