Economia

Medidas arrojadas para sair da crise

Os empresários da província de Tete afirmam que o país precisa tomar medidas audazes para sair da presente crise económica, causada por factores internos e externos. Segundo eles, a paz, o estabelecimento de efectivos vínculos de negócios com os grandes projectos e redução de custos variáveis nas empresas e instituições públicas e privadas podem ajudar a afugentar a crise.

Também há quem fala em cortes mais profundos em despesas como combustíveis, subsídios, viagens, entre outros. 

Tete é a província moçambicana que mais sequelas está a ter da presente crise económica gerada, entre outros, pela baixa drástica dos preços das principais matérias-primas, ou commodities como os anglo-saxónicos chamam, da alta do dólar e até mesmo de bens alimentares.

Até há pouco menos de dois anos esta província era um dos maiores destinos de investimentos bilionários promovidos por empresas mineiras e que tinham um efeito multiplicador na economia local, a ponto de surgirem hotéis e restaurantes de primeira, supermercados e lojas de requinte, negócios de viaturas e imobiliários nunca antes imaginados.

Nos últimos oito anos, a pesquisa e descoberta de estrondosos jazigos de carvão mineral, do mais valioso que existe na face da terra, que estava a ser desenvolvidas pela Vale, Jindal, ICVL, Minas de Moatize, Minas de Nkondedzi, Minas de Rovúbuè, entre outras, propiciou o surgimento de novas Pequenas e Médias Empresas (PMEs) das já referidas empresas, muitas delas da categoria de Pequenas e Médias Empresas (PME’s).

Só a Vale realizou investimentos estimados em centenas de milhões de dólares a que se somam as aplicações das restantes empresas, que superaram tranquilamente os cinco biliões de dólares em pesquisas e estabelecimento das empresas em diferentes pontos daquela província.

Dados em nosso poder indicam que, por causa desta avalanche de dólares, foram criadas e estabelecidas mais de 50 empresas de construção civil e de engenharia dedicadas exclusivamente à prestação de serviços de pesquisa de carvão.

Consta que a Vale Moçambique, sozinha, tinha contratado mais de 500 motoristas para todo o tipo de máquinas, a ICVL precisou de 300 motoristas e a Jindal contratou uns 200. Aqui não se incluem técnicos de diferentes áreas que igualmente foram contratados para descobrir onde o carvão está, qualidade, quantidade, entre outros.

Durante aqueles oito anos, a lei económica da procura e da oferta funcionou em pleno em todas as áreas possíveis. Era tanta a demanda por bens e serviços que os preços aumentaram até a vida da própria população local se tornar difícil.

Dispararam as rendas de casa que, em muitos casos passaram a ser cobradas em dólar americano. O famoso cabrito de Tete, que era adquirido pela módica quantia de 300 a 500 meticais por cabeça, foi extrapolado para assustadores 1500, 2000 e por vezes 2500 meticais sem poucas hipóteses de regateio.

Os poucos hotéis até então existentes tinham contractos com empresas mineradoras e permaneciam em estado de “lotação esgotada” o ano inteiro. Só por isto, muitas famílias passaram a dispensar as suas habitações para os expatriados e a fazerem uma receita com a qual nunca tinham sonhado antes.

O parque imobiliário cresceu, a lista de restaurantes, cafés, bares, oficinas, salões de cabeleireiro, supermercados, piscinas, serviços de táxi, parques de venda de viaturas e equipamento industrial, lavandarias e centros de formação técnico profissional surgiram como cogumelos. E competiam ferozmente entre si. 

É preciso perceber que Tete é uma província diferente”, afirma Edson Lino, coordenador provincial para as PMEs, que sublinha que a diferença reside no facto desta parcela do país possuir um imenso potencial no subsolo, mas também ao nível da agricultura, pecuária, pesca, geração de energia, e por aí em diante.

DEPOIS VEIO A TEMPESTADE

Carlos Cardoso, presidente do Conselho Empresarial da provincial de Tete, uma entidade satélite da Confederação das Associações Económicas (CTA), recorda que Tete registou um crescimento bastante significativo porque ali se instalaram grandes projectos.

A chegada destes projectos ajudou a alavancar as empresas locais porque estas suportavam o desenvolvimento dos grandes empreendimentos. Essa relação só foi possível depois de conseguirmos estabelecer o espírito de Conteúdo Local em que se orienta as grandes empresas a darem primazia à aquisição de bens e serviços junto das empresas locais e só depois importarem”, disse Carlos Cardoso.

Afirma ainda que para se chegar a este entendimento foram necessárias várias sessões de trabalho com os gestores das grandes companhias até que elas percebessem que existe capacidade interna produção e de fornecimento.

Por outro lado, Carlos Cardoso, também aponta que um dos constrangimentos que marcou o início das relações entre as empresas de Tete e os grandes projectos foi a falta de capacidade financeira que sempre caracterizou as empresas nacionais e da falta de abertura dos bancos para financiar iniciativas empresariais despidas de garantias.

As empresas nacionais não tem esse alicerce e tivemos que optar por trilhar por alguns caminhos que a própria banca está a abrir, nomeadamente com a criação de um sistema de informação no qual a nossa agremiação fornece às instituições financeiras para indicar quais as empresas que são credíveis. Ou seja, o banco consulta à associação. Isto, de certa forma dá resultados positivos”, disse.

Por esta mesma via, foi aberta a possibilidade de as empresas locais que tenham contractos com os granes projectos, passarem a beneficiar de adiantamentos de fundos por parte da banca. “É uma garantia para a banca e essa situação ajuda as pequenas e médias empresas”.

Apesar de todos estes avanços, a partir de uma certa altura o preço do carvão mineral despencou no mercado internacional, o que deu origem a uma desaceleração do crescimento económico, com impactos na manutenção de postos de trabalho e consequente instabilidade a nível social.

Perante esta realidade, Edson Lino, coordenador provincial das PME’s de Tete, defende que “os moçambicanos devem começar a produzir e a pensar seriamente em apostar em actividades que possam ser sustentáveis”.

Segundo ele, é necessário que o sector privado e, também, o público, comece de imediato a reduzir os custos do seu funcionamento. Para Edson Lino, o país precisa de tomar medidas arrojadas, mas igualmente necessárias. “É um desafio que os gestores precisam assumir”.

Refiro-me aos custos variáveis, como poupar combustível, viagens, subsídios de representação e salários de pessoal de todo para que seja possível ter algum capital que ajude a evitar o colapso”.

Carlos Cardoso, por seu turno, afirma que existe entre os empresários de Tete a consciência de que a presente situação é passageira e que o preço de carvão vai voltar a crescer, tanto é que existem alguns sinais de vontade de investimento directo estrangeiro. Porém, o constrangimento é a instabilidade político-militar. “A paz é crucial”.

Temos cerca de 300 empresas registadas, mas sabemos que há muitas mais e queremos que todos constem na nossa base de dados para que possamos conhecer melhor os problemas e procurarmos soluções para que os negócios continuem a acontecer”, disse Cardoso.

REALIDADE DELICADA

PARA O TRABALHADOR

Enquanto os empresários procuram soluções para manter as empresas a funcionar, Edson Lino afirma que os trabalhadores também devem dar todo o seu contributo “Porque a situação é má para todo o mundo. Há exemplos que nos chegam do Brasil, China e até mesmo de alguns países europeus como Portugal e Grécia”.

Assim sendo, Lino defende que com a classe trabalhadora deve assumir o compromisso de trabalhar mais para reverter o actual quadro de crise. Aliás, segure que, tal como os quadros de topo, que na sua perspectiva devem ter salários mais consentâneos com a realidade social e económica, os trabalhadores também devem ter uma visão diferente em relação às chamadas horas-extra, a dedicação ao trabalho, o rendimento e eficiência.

Texto de Jorge Rungo
jrungo@snoticias.co.mz

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