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Maputo: onde existe tudo de bom

Por admin

Maputo completou, no dia dez de Novembro, 128 anos de elevação à categoria de cidade. domingo aproveita o ensejo para ressoar a importância deste lugar, assumida, e nem sempre cabalmente correspondida, por cidadãos vindos de diferentes locais do país, à procura melhores condições de vida na grande capital. É o que apresenta nesta reportagem.

Romão Miguel, de 24 anos, natural de Namacurra, Zambézia, imigrou para Maputo, em 2009, aos 18 anos carregando uma mala cheia de sonhos. De acordo com as suas declarações, a materialização dos seus desejos passa(va) necessariamente por se estabelecer na cidade capital. De qualquer modo, a sua mudança foi precipitada por um acidente de percurso: “a minha namorada ficou grávida, tornou-se urgente mudar de vida”. Com parcos recursos, fez-se transportar num autocarro, da cidade de Quelimane a Maputo e enfrentou dificuldades de vária ordem, até chegar à terra onde, na sua óptica, teria “tudo de bom”. Já no tão almejado destino, conseguiu empregar-se num contentor de venda de produtos alimentícios, na cidade de Maputo, onde auferia o salário de 1500 meticais, um valor que o submetia a algumas restrições, mas “era dividido para o seu dia-a-dia e para as despesas da sua família em Namacurra ”.

Romão apertou o cinto até esta altura em que, mesmo trabalhando para um novo patrão, “sou guarda duma residência na Matola”, toca a vida por conta própria vendendo crédito. Esta nova actividade anima-o e reforça a possibilidade de um dia crescer na vida, não obstante o facto de enfrentar no seu dia-a-dia um grande obstáculo que se chama preconceito. “As pessoas (os naturais de Maputo e não só)chama-nos de xingondos, às vezes agridem-nos, principalmente quando se aproxima a época festiva, e arrancam-nos o que conseguimos reunir para o benefício das nossas famílias”, denuncia.

De facto, o tema preconceito é antigo e ostenta barba branca. E, ainda recuando no tempo, buscam-se rótulos atribuídos aos originários de cada província de Moçambique. A título de exemplo, aos zambezianos ligava-se o trabalho doméstico; aos originários de Inhambane o de carpintaria, construção civil e limpeza ( este sobretudo aos Machopes). Hoje em dia a realidade dissolve essas concepções. Prova disso é Albino Muholove, de 26 anos, natural de Zavala, província de Inhambane, que trabalha como sapateiro. Antes de migrar para Maputo “era estudante, pastor e machambeiro”. Decidiu mudar-se, em 2007, “à busca de melhores condições de vida e, igualmente, atrás do conhecimento, pois depois de fazer a sétima classe, tornou-se complicado continuar com os estudos em Zavala, já que a escola onde frequentaria as classes subsequentes distava a vinte quilómetros da minha residência”.

Para Albino, Maputo “era o sítio dos sonhos, onde toda a gente luta para chegar”. Nesta província, e por conta própria, iniciou a actividade de venda de água gelada no bairro de Maxaquene A, até que em 2008 resolveu trabalhar para um patrão “numa barraca vendendo bolinhos (‘ti fiosse’)”. Ficou neste emprego até 2010 quando começou a pôr em prática a sua arte de consertar sapatos. Para seu gáudio, actualmente, Albino colhe ganhos advindos desta actividade. “Adquiri um terreno, construi uma casa em Boane, continuei a estudar (frequenta a 12ª classe) e pus a minha esposa também a estudar). De qualquer modo, apesar do sucesso a olhos vistos, não se sente realizado por estar distante da sua terra natal, Zavala. “Queria desenvolver a minha arte na minha zona de origem, seria gratificante”, considera.

Num sentido contrário, encontra-se Maria Neves, de sessenta anos, natural de Cabo Delgado. Dona Maria não se arrepende pela escolha que fez: assentar-se na capital do país, desde o ano de 1980. Simplesmente queixa-se da falta de um espaço amplo e próprio para levar a sua vida em paz e com segurança desenvolvendo a sua actividade como modista. “Sinto falta de um espaço próprio. O meu trabalho é feito num lugar que não me pertence. Esse facto me constrange, gostaria de ter o meu canto”. Mesmo assim, dona Maria encara Maputo como um lugar bom para viver. “Consigo sustentar a minha família, pagar as minhas contas, sem contar que é uma cidade bonita, encantadora…”, elogiou.

Outro imigrante, Samuel Ucucho, de 40 anos, saído lá das bandas de Vilankulo, conta que aos dezoito escolheu Maputo para desenvolver actividades que trouxessem um ganho sob o ponto de vista económico, tornando desse modo, a sua vida próspera. Nessa altura, apartado das actividades escolares, “parei de estudar na sétima classe”, resolveu pedir emprego numa padaria, na Machava, Maputo, onde trabalhou por quase dois anos. Mais tarde, prestou serviços numa pensão, na cidade de Maputo, actividade que seria interrompida aquando da morte do seu patrão. A alternativa restante foi encher-se de coragem e tomar uma decisão que mudaria a sua vida: “Em 2001, vendi os quinhentos blocos que tinha feito para construir a minha residência, com o dinheiro conseguido atravessei a fronteira para a Suazilândia onde comprei dois televisores preto e branco, dez cadeiras plásticas e uma mesa para posterior revenda”. Era o início de um negócio que, em 2003, seria substituído pela actividade de venda de materiais de construção. 

Abri a minha ferragem e actualmente sigo nesta lida satisfeito com os ganhos”. Contudo, engana-se quem pensa que a vida nas grandes cidades não é feita de grandes esforços. Pelo menos é o que Ucucho deixa patente no recado que endereça aos jovens que pretendem ou migram para a metrópole. “Para vencer é necessário trabalhar arduamente e afastar-se de vícios como beber, fumar e muitas mulheres”, aconselha. Recado dado e, provavelmente, assimilado por seu conterrâneo Armindo Ngale, de 53 anos, natural da Massinga. “Não vim a Maputo para brincar. Saí de Inhambane em 2009 com o objectivo de melhorar a minha vida e da minha família”. Com efeito, trabalhando como zelador do estabelecimento comercial do seu primo, Armindo Ngale afirma ter conseguido juntar uma certa quantia que lhe permitirá construir uma boa casa para a sua mulher e filha lá na Massinga. Enquanto isso, vangloria-se por viver longe do aperto “aqui em Maputo fico sempre com dinheiro no bolso, contrariamente ao que acontecia lá na província. Em Maputo vive-se bem!”, garante. 

Carol Banze
carolbanze@yahoo.com.br
Fotos de Inácio Pereira

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