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Dezasseis anos a reassentar 1600 famílias

Por admin

O reassentamento da população que vive no Parque Nacional do Limpopo (PNL) é o processo mais longo em curso no país. Começou a ser cogitado no ano 2000, isto é, há 16 anos, e o plano era reassentar 1600 famílias, mas até ao momento apenas 400 famílias viram suas casas erguidas.

Em entrevista ao nosso jornal, Bartolomeu Souto, director Nacional de Áreas de Conservação, no Ministério da Terra e Desenvolvimento Rural (MITADER) aponta que falta construir 1200 casas e fazer um senso de outras 300 famílias porque o tempo passou e os agregados cresceram. Para tal, são necessários mais três anos para concluir o processo.

O reassentamento daquelas famílias foi cogitado por volta do ano 2000, quando os governos de Moçambique, África do Sul e Zimbabwe criaram o Parque Transfronteiriço do Grande Limpopo, na perspectiva de melhorarem a integridade dos ecosistemas, harmonizar os processos de gestão ambiental e remover as barreiras artificiais que impediam a circulação natural da fauna.

Porque o Parque Nacional do Limpopo era o único envolvido no processo que tinha população humana, o governo moçambicano assumiu que iria reassentar as 1600 famílias para viabilizar o alcance daqueles objectivos, incluindo o desenvolvimento turístico. Entretanto, de lá a esta parte, apenas umas 400 famílias tem casas erguidas.

O director da DNAC, Bartolomeu Souto concedeu-nos uma entrevista na qual aborda algumas questões atinentes a este processo e também versa sobre o relacionamento com o vizinho Kruger Park, o estágio actual da fiscalização, entre outros. Aqui temos alguns excertos da conversa.

Quantas pessoas vivem nos parques nacionais e reservas?

Temos cerca de 56 mil pessoas a viver dentro das áreas de conservação em todo o país, o Parque Nacional das Quirimbas, em Cabo Delgado, tem cerca de 20 mil porque é uma área muito grande, abarca muitos distritos.

E no Parque Nacional do Limpopo (PNL) que se pretende que seja outra jóia nacional a seguir ao Parque Nacional da Gorongosa (PNG)?

Especificamente no PNL temos cerca de 1600 famílias e o governo já tomou uma decisão de reassentá-las. O processo de compensação está em curso mas, para isso, são necessários recursos

Essa decisão foi tomada por volta do ano 2000. Passam muitos anos. O que está a falhar?

São recursos para executarmos esta transferência garantindo uma a compensação justa.

Mas, contava-se com o apoio financeiro do Banco Alemão para o Desenvolvimento (KfW)…

Sim. Mas, os recursos são limitados. Negociamos mais fundos há pouco e, neste momento, estamos em condições de terminar o processo

Negociaram quanto?

Acabamos de mobilizar 25 milhões de dólares que serão cedidos em duas tranches. Uma de 18 milhões e outra de sete e julgamos que com isso vamos concluir o reassentamento.

Vão concluir quando?

Nos próximos três anos teremos concluído.

Mais três anos? O que lhe leva a acreditar que desta vez terminam? O que vai acontecer?

As casas serão construídas por uma empresa que concorreu no ano passado e este ano estamos a terminar os procedimentos do concurso. Vamos assinar o contrato com a empreiteira vencedora e, ao longo deste segundo semestre as obras vão iniciar.

Já tinham sido erguidas várias casas com a colaboração do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC)…

Sim.

Quantas foram feitas?

Seiscentas casas. Usamos fundos do Estado e do Banco Alemão. O INGC esteve a liderar o processo no período em que o governo entendeu que devíamos usar a experiência deles e foi envolvendo as comunidades na construção.

E essa experiência foi abandonada?

… Agora optamos por trazer uma empresa que vai diminuir o envolvimento do Estado e colocar a empresa a acelerar esta questão.

Quantas casas serão construídas?

Neste momento estamos a prever cerca de 1200 casas para além das 400 feitas com a colaboração do INGC.

Feitas estas 1200 casas fecha-se o processo?

Os números que tínhamos no início do reassentamento devem ser actualizados porque a situação mudou.

Mudou?

Pois, porque a população aumentou. E ainda há algumas aldeias onde precisamos fazer sensos, porque a realidade alterou.

Mais sensos? Já fizeram tantos. Para quê mais?

Quando passa muito tempo é preciso fazer um novo senso. Estimamos que haja mais 300 famílias. As famílias cresceram e é preciso acomodar essas mudanças.

PRECISAMOS TERMINAR COM SUCESSO

Que empresa vai construir as 1200 e eventualmente 1500 casas?

Ainda não foi contratada, por isso não posso indicar o nome.

Quando a nossa Reportagem visitou o PNL observou que havia famílias que estavam a construir casas de alvenaria. A compensação será feita tendo em conta as casas antigas de pau a pique ou estas novas?

A compensação será feita em função da realidade da altura em que terminamos o senso. Podem ser construídas… depende de quem está a construir… portanto, essas 1200 já estão garantidas que vão avançar agora. Mas há um outro grupo de 300 casas que precisamos avaliar no senso que estamos a fazer.

Disse que “depende de quem está a construir”?

Não. Não é bem assim. Não depende de quem está a construir. Depende da altura em que está a construir. Quando fechamos o senso já não se pode construir.

Senhor director estamos a falar de casas de alvenaria que estavam a ser construídas e algumas até eram atribuídas a caçadores furtivos de rinocerontes…

Dentro do parque?

Sim. Dentro do Parque…

Mesmo assim, vamos funcionar com o senso. É o que nós fazemos.

Este tempo todo que foi consumido, com idas e vindas, muitas indefinições, não desgastaram a autoridade do Estado junto das comunidades?

Quando se determina que um reassentamento deve ocorrer, o recomendável é que seja feito o mais rápido possível para não prejudicar a ninguém. Mesmo as populações porque a partir do momento em que é feito o senso não se deve fazer beneficiações nas suas casas ou outros investimentos porque é um sítio que vai ser destruído.

Então confirma que prejudicou…

Prejudicou as pessoas e até mesmo os objectivos de conservação porque é difícil fazer a conservação naquelas condições e é por isso que vamos avançar usando a empresa de construção agora que nos parece ser o mais certo.

Para além do PNL qual é a outra área que está com um processo similar?

Não estamos a fazer reassentamento em mais nenhum lugar. Este é o primeiro dentro de uma área de conservação e é preciso terminá-lo com sucesso para depois pensarmos em fazer noutras áreas senão aumentamos as nossas dificuldades.

TEMOS BOAS RELAÇÕES COM O KRUGER

Como olha para a conversação no nosso país tendo em conta a presença humana dentro dos parques nacionais e reservas?

Não posso afirmar que a presença humana seja, em si, um problema para a conservação porque, afinal, a conservação é feita por pessoas. Depende das condições de cada local e dos objectivos que se pretendem da conservação. E isto não é um caso isolado de Moçambique. Em África temos várias áreas muito famosas com boa conservação e que tem pessoas lá dentro. Não é por existirem pessoas mas, se essas pessoas estiverem em locais frágeis que vão perturbar os ecossistemas, aí a presença humana se torna prejudicial por causa da sua forma de vida. Ou se essas pessoas estiverem situadas em corredores de migração de animais como elefantes. Portanto, a localização é que é um problema.

A nossa realidade mostra que quanto maior é a presença humana maior é o risco de caça furtiva, como se vê no PNL. O que diz disso?

Não é bem assim. Os caçadores furtivos são uma minoria porque uma aldeia pode ter apenas um caçador furtivo e ele ser problemático. Não assumimos que quando há muita gente há mais caça furtiva. Há lugares onde não vive ninguém, mas vão lá caçadores furtivos caçar. No Kruger Park (África do Sul) não vive ninguém, mas tem lá caçadores furtivos que invadem.

Os gestores do Kruger em algum momento quiseram voltar a levantar a vedação que separa o Kruger do PNL por causa da intensa caça furtiva ao rinoceronte. Como estão as relações com eles?

As nossas relações com o Kruger são óptimas. Sempre tivemos boas relações. Estamos a cooperar no combate não só no combate à caça furtiva. O Parque Transfronteiriço do Grande Limpopo foi criado para viabilizar o desenvolvimento local nos três países (Moçambique, África do Sul e Zimbabwe), promover o turismo, criar emprego e engajar as comunidades.

Todos acompanhamos que houve uma intensa actividade furtiva nos últimos tempos. Ainda se aventa a possibilidade de se trazer mais animais do Kruger?

A população de animais no Limpopo tem estado a crescer desde que estabelecemos o parque. Quando iniciamos o parque tínhamos cerca de 200 elefantes e o último senso que fizemos há cerca de 3 anos indicava cerca de 1000 elefantes. Quase que não tínhamos leões e hoje temos algumas observações apesar de não termos números exactos. Mas temos leões. Os animais que foram trazidos reproduziram. Não foi tão rápido por causa da caça furtiva. Mas, o nosso balanço é positivo. Excepto nos rinocerontes. Trouxemos 10 e devem ter ficado cinco. Mas, o rinoceronte está a sofrer pressão não apenas do lado de cá, mas também no Kruger.

Qual é o modelo de protecção que será implementado no PNL? Será feita uma vedação como os sul-africanos fizeram?

Vamos fazer vedações onde for necessário. O Limpopo já tem uma vedação para prevenir o conflito Homem-Fauna Bravia na parte Sul e que reduziu muito as investidas dos elefantes para essa zona.

Texto de Jorge Rungo
jorge.rungo@snoticicas.co.mz

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