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Cheias deixam Mocuba em pedaços

Por admin

A chuva que teima em cair na província da Zambézia está a comprometer os trabalhos de reposição da linha de transporte de energia eléctrica para as províncias da Zambézia, Nampula, Cabo Delgado e Niassa. Todos os meios humanos e materiais necessários para a concretização da empreitada já estão no terreno, mas chove e o piso prevalece lamacento. Veículos com tracção às quatro rodas patinam e se atolam. A saída reside no uso de meios aéreos que tardam a chegar. 

Cerca de 150 trabalhadores da Electricidade de Moçambique (EDM) estão acampados no interior do distrito de Mocuba há cerca de duas semanas a engendrar planos para repor o fornecimento de energia eléctrica às províncias da Zambézia, Nampula, Cabo Delgado e Niassa.

Engenheiros e técnicos da EDM, alguns dos quais com pergaminhos inquestionáveis, bateram com o queixo no chão ao ver o tamanho do estrago feito pela água das chuvas que transformou o rio Lucungo num impiedoso “serial killer” (assassino em série), daqueles que até espezinham infra-estruturas ao estilo do personagem de ficção científica “Godzila”.

Pelo menos 10 torres de transporte de electricidade em Alta Tensão (AT) vergaram e uma delas foi trucidada a ponto se de tornar irreconhecível, como se tivesse sido destruída por uma violenta explosão de uma bomba, quando na verdade foi apenas a fúria da água do Licungo que lavrou por ali.

Na verdade, o rio Licungo é um vizinho muito amigo da vila municipal de Mocuba. Parte da população busca ali a água que necessita para o seu consumo, toma banho, lava a roupa e ainda pesca naquele curso de água que passa a maior parte do ano trancafiado no seu leito.

Tal como o Instituto Nacional de Meteorologia (INAM) previu no final do ano passado, a região Centro e Norte do país registou chuvas acima do normal que afectaram o vizinho Malawi, cujos cursos de água procuram chegar ao mar através do território moçambicano, mais concretamente, através da província da Zambézia.

A província do Nissa também beneficiou de chuvas intensas, sobretudo em Cuamba e Mecanhelas, a par dos extensos distritos de Gurúe, Namarrói e Lugela que, em conjunto, contribuíram de forma esmagadora para o aumento do volume de água que correu para os rios Lugela e Licungo.

Porque é em plena cidade de Mocuba onde estes dois rios se encontram “e se abraçam”, os estragos ganharam forma, tamanho e peso, com milhões de detritos a serem arrastados em direcção ao Oceano Índico, com incidência para troncos de árvores, chapas de zinco, barrotes, estacas e bastante capim.

No seu percurso bastante acelerado, alguns destroços foram barrados pela ferragem de uma das torres. “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”, bem diz ditado e a torre não resistiu ao empurrão e tombou arrastando consigo outras nove, nomeadamente, uma na margem norte do Licungo e sete na margem sul.

Incrivelmente, a torre que “sucumbiu” à força da água ficou tão amolgada que não se aproveita. As cantoneiras ficaram contorcidas como se tivessem passado pelas mãos de um escultor surrealista, daqueles que produz obras que todos se perguntam “o que é isto?”. As outras nove torres caídas podem ser parcialmente aproveitadas, o que depende de uma avaliação que deverá ser feita por peritos da EDM.

Para além das torres, as linhas de transporte de energia também ficaram completamente danificadas numa extensão de cinco quilómetros, o que obriga a EDM a repor 15 quilómetros de linha, tendo em conta que aquela linha é composta por três cabos.

Chuva e vias de acesso atrapalham

Com as torres deitadas ao chão e a linha de transporte rebentada e completamente inutilizada, as populações das províncias da Zambézia (parte Norte), Nampula, Niassa e Cabo Delgado começaram a enfrentaram semanas de total escuridão que comprometem o curso normal da vida até hoje.

Actividades nos sectores da saúde, comércio, indústria, serviços entre outros estão comprometidos e só contabilizam prejuízos. Por exemplo, a própria EDM diz que perde cerca de 200 mil dólares por dia e o cidadão já começa a pagar o dobro e até mesmo o triplo pela aquisição de produtos básicos que já escasseiam nas prateleiras e bancas.

Para agravar o quadro, a chuva teima em não oferecer alguma trégua para que os tractores possam iniciar os trabalhos de melhoramento da via que vai até ao local onde as torres estão tombadas. Segundo Agostinho Mugoda, administrador de Produção, Transporte e Telecomunicações da EDM, “o único obstáculo para a reposição da linha é a via de acesso que não oferece condições de segurança para que possamos levar os materiais até aos locais onde a linha deve ser reposta”.

Com efeito, a nossa equipa de Reportagem deslocou-se até ao local e testemunhou a degradação daquele caminho que, em grande parte da sua extensão, é estreito (só pode passar um carro de cada vez) e as bermas são perigosas ravinas, o que torna praticamente impossível a passagem de veículos pesados carregados de materiais igualmente pesados.

Por causa da chuva e da intensa lama que se formou ao longo daquele troço, de cerca de 15 quilómetros, a viatura em que seguíamos saiu dos trilhos sete vezes e foi se acomodar perigosamente no lodaçal, obrigando a gincanas diversas para a sua restituição ao caminho certo.

Segunda linha precisa-se

Esta avaria serve de lição para a Electricidade de Moçambique (EDM)”, afirma o Presidente do Conselho de Administração (PCA) da EDM, Gildo Sibumbe, para quem é preciso iniciar um novo ciclo de investimentos para que situações do género não voltem a acontecer.

Entre os investimentos cruciais, consta a construção de uma segunda linha de transporte de energia que deve partir da subestação de Chimuarra, no Sul da Zambézia, até Nacala, em Nampula, uma vez que a linha actualmente existente, conhecida por “Linha Centro-Norte”, que parte do Songo, em Tete, e vai até Nampula, é tida como uma das mais longas do mundo.

Fontes a que tivemos acesso indicam que aquela linha percorre cerca de mil e 200 quilómetros até à cidade de Nampula, faz mais 300 quilómetros até Awasse, no Norte de Cabo Delgado e ainda deriva para Lichinga onde chega depois de percorrer mil e 100 quilómetros.

As mesmas fontes indicam que da subestação do Songo até Chimuarra a “Linha Centro-Norte” segue duplicada o que faz com que as actividades de manutenção ou avarias ocorram numa linha sem que seja necessário interromper o fornecimento de corrente eléctrica.

Porém, a “música muda de ritmo” de Chimuarra até Mocuba onde a linha é única, pese embora com cabo duplo, o que por outras palavras equivale a dizer que a energia chega a Mocuba com estabilidade e segurança, apesar de susceptível a apagões por ser única.

De Mocuba para frente, nomeadamente, Nampula, Nacala, Pemba, Cuamba, Lichinga, entre outros locais, a linha é única e simples, o que não oferece nem segurança e muito menos estabilidade. Aliás, é por esta razão que a população daquela região se queixa regularmente de cortes e restrições, pois, toda esta linha opera em sobrecarga.

A solução passa pela construção de uma segunda linha entre Chimuarra e Nacala e centrais de produção em Nacala, Lúrio ou Palma”, afirma Gildo Sibumbe que assumiu o cargo há poucos meses e que aponta que o Governo já angariou o financiamento necessário para a segunda linha que deverá consumir a volta de 600 milhões de dólares.

Jorge Rungo

jrungo@gmial.com

Fotos de Jerónimo Muianga

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