Internacional

Basta de esperar pela chuva

O presidente Filipe Nyusi foi o convidado de honra a quem o Chefe de Estado do Zimbabwe, Robert Mugabe emprestou “o martelo” para inaugurar a 105ª edição da Feira Agrária de Harare (Agriculture Show ou simplesmente Agri-Show). Na ocasião, o estadista moçambicano repisou que os dois países vão se empenhar para fazer com que a irrigação seja uma realidade, porque “não podemos continuar a esperar pela chuva para semear”.

A Feira Agrária de Harare ou Agri-Show, como eles chamam, é um show de verdade, que mobiliza milhares de pessoas de todos os quadrantes do Zimbabwe para a capital do país. Para este ano, por exemplo, a Sociedade Agrária do Zimbabwe, que organiza o evento, contabilizou cerca de 200 mil visitantes, o que é por si um feito extraordinário.

Aliás, este número visitantes se torna ainda mais adocicado quando se leem as notícias publicadas rotineiramente pela imprensa ocidental, as quais procuram “denunciar” um Zimbabwe sem eira nem beira por causa da crise económica e social na qual o país está mergulhado por causa da reforma da terra havida por volta do ano 2000 e que culminou com a expropriação da terra aos fazendeiros britânicos que andavam por aqui.

O que torna o evento algo inusitado aos olhos de forasteiros é o facto de quase 90 por cento do que é exibido serem empresas e produtos locais, havendo uma meia dúzia de empresas estrangeiras e países expositores. Mesmo assim, a afluência ao local é massiva e vai do amanhecer ao pôr-do-sol. É um formigueiro humano.

O tema escolhido para a edição deste ano é “Promovendo a produtividade agrícola gerindo as mudanças climáticas”, lema que coincide com uma altura em que o Zimbabwe enferma de seca que começa a complicar as contas das autoridades locais.

Aliás, a questão da necessidade de se investir na irrigação tem estado a nortear os discursos do próprio presidente Filipe Nyusi, o qual entende que não faz sentido que um país como Moçambique continue, com mais de 30 milhões de hectares de terra arável, tenha apenas 5.4 milhões de hectares, correspondentes a 15 por cento, para produzir a depender da chuva. “Isso não faz sentido”.

INVESTIMENTO

PRECISA-SE

Como os dois países estão irmanados na busca de soluções para este e muitos outros dilemas do sector agrário, o presidente Robert Mugabe fez questão de deixar que fosse o presidente Filipe Jacinto Nyusi a discursar e a proceder à abertura daquela vital feira.

O nosso presidente tinha o humor à flor da pele e procedeu como se estivesse em casa. Visitou o recinto onde o evento decorreu, fez todas as perguntas que quis aos expositores, recebeu explicações, inclusive do próprio presidente Mugabe e, no final, sublinhou que valeu a pena. “O balanço é bastante positivo”.

O que leva o nosso Chefe de Estado a repisar que valeu a pena ter ido àquela feira é que Moçambique está a abordar o tema agricultura e um dia antes de ele partir para Harare esteve a debater a visão do governo sobre esta matéria com representantes do sector produtivo.

O que vimos aqui completa o nosso raciocínio e permite que o sector da agricultura em Moçambique possa se inspirar na experiência deste país que trabalha intensamente e realiza a produção com sucesso”, disse no final da visita.

Na verdade, entre as questões que o presidente Nyusi queria “beber” da experiência do Zimbabwe constavam matérias ligadas à gestão da terra porque o Zimbabwe, à semelhança de Moçambique, tem cidadãos que possuem grandes extensões de terra e que não exploram na totalidade.

Por outro lado, o nosso presidente queria entender como é que os camponeses zimbabueanos conseguem ter níveis altos de produtividade, como está estruturada a sua cadeia produtiva e de valor, entre outras matérias afins.

Depois das explicações, o presidente Filipe Nyusi disse que “No passado esta feira era apenas para agricultura e pecuária mas agora a indústria está a acompanhar e isso ajuda a fechar a cadeia de valor. A área de transporte também é exibida, a de comunicação é uma das que tem grande sucesso e relevância e a banca também acompanha a actividade agrícola. Tudo isto funciona de forma integrada”.

De uma forma geral, o presidente Nyusi regressou a Maputo na manhã de ontem com a certeza de que os dois países podem cooperar na gestão da terra, incremento da produção, investimentos a serem feitos na agricultura, tecnologias e investigação pecuária e agrária.

Foram vários os aspectos que saltaram à vista da delegação moçambicana que acompanhou o Chefe de Estado a esta primeira visita de trabalho ao exterior, incluindo o facto de o sector de Educação estar também a aplicar-se para fazer com que as escolas a incuta a mentalidade produtiva, orientada para a agricultura e também o agro-processamento nas crianças.

Na África Subsaariana só quatro por cento da terra arável é que é irrigada. Não podemos continuar a esperar pela chuva para semear. Já sabemos o que devemos fazer para irrigar. Apenas precisamos mobilizar recursos para investir”, sublinhou.

UM ABRAÇO

AO ZIMBABWE

Quando o Chefe de Estado teve a oportunidade de se dirigir aos dignatários zimbabueanos naquela feira, expressou o seu agradecimento pelo convite e disse que a Sociedade Zimbabweana de Agricultura, promotora e organizadora deste evento económico.

Segundo o presidente Nyusi, aquela agremiação soube fazer uma amostra viva do vigoroso pulsar da agricultura zimbabweana, uma agricultura pujante que tem inspirado e servido de referência aos moçambicanos na garantia da segurança alimentar, não só do Zimbabwe, mas de todos os países da região.

O convite que nos foi endereçado explica mais uma vez o bom momento que as relações históricas e naturais que os nossos dois povos atravessam, alicerçadas nos laços tradicionais, culturais e linguísticas forjadas na nossa luta comum contra o colonialismo português e o regime minoritário da então Rodésia do Sul”, lembrou.

Disse ainda que ao longo de mais de 35 anos da vigência das relações de cooperação e de amizade entre o Zimbabwe a Moçambique, muita coisa foi feita e em diferentes domínios, designadamente na Politica e Diplomacia, Defesa e Segurança, Energia, Recursos Minerais, Transportes e Comunicações, Indústria e Comércio, Turismo, Governos Locais, Educação e Cultura, Justiça, Migração e Autoridade Tributaria entre outras.

Tudo isto, conforme referiu o presidente Nyusi tem estado a permitir dar corpo a concretização da vontade comum de ver os dois países a progredir economicamente.

Também repisou que o continente africano é historicamente rico em recursos e constitui a principal fonte global de importantes minérios, e outro tipo de matérias-primas que sustentam a economia mundial.

Lamentamos, porém, que esta riqueza africana contraste com o desempenho do nosso continente no comércio internacional que se situa entre dois e três por cento e com produção agrícola que contribui somente em 10 por cento do volume mundial total”, indicou para de seguida rematar que é preciso operacionalizar o discurso africano que reza que é preciso encontrar “soluções africanas para problemas africanos”.

Com a troca de experiências havida ao mais alto nível, o presidente Nyusi entende que será possível promover em Moçambique a atividade agro-pecuária de grande envergadura e expandir a cooperação bilateral para a esfera econômica no geral, que é indispensável para a criação de estabilidade sócio–económica dos dois países.

As potencialidades agro -pecuárias, o conhecimento e a experiência de gestão agrária que o Zimbabwe possui foi sempre para nós, uma referencia, pois dão a prova de que a aposta na agricultura e na intervenção ao nível da cadeia de valor, os nossos países podem ultrapassar os problemas de segurança alimentar, criar mais empregos e através da agricultura produzir rendas para as nossas populações”, disse.

Filipe Nyusi disse ainda que é de todo o interesse de Moçambique partilhar estas experiencias com o Zimbabwe, sobretudo nesta fase em que a criação de emprego, produtividade e competitividade constitui uma das principais prioridades definidas pelo governo moçambicano para este ciclo de governação.

Nóstambém desdobramo-nos em ações de promoção de ligações de mercado, em que as feiras agro-pecuárias são um eixo de expressão dessa estratégia de desenvolvimento que o governo implementa em parceria com os produtores agrários e outros intervenientes na cadeia agrária”, frisou.

Tais medidas, segundo o presidente de Moçambique, tem estado a surtir efeitos positivos, sobretudo através da maior inserção dos pequenos produtores nos mercados, a dinamização da agro-indústria, o incentivo ao movimento associativo e cooperativo agrário e rural e a identificação de novos mercados para produtos não tradicionais como soja, gergelim, macadâmia, “baby corn”, páprica, entre outros.

Antes de deixa o território zimbabueano, Filipe Nyusi deixou um aceno dizendo que tem o desejo de, ao abrigo da iniciativa “Programa Compreensivo para o  Desenvolvimento da Agricultura em África” (CAADP), e particularmente através da nossa cooperação bilateral,  ver aprofundadas as  relações de cooperação nas áreas de investigação, na troca de experiências entre agricultores do Zimbabwe e de Moçambique,  no domínio das boas práticas agrícolas e pecuárias e na promoção de mercados e feiras agrícolas e nos mecanismos de financiamento e seguro agrário.

Texto de Jorge Rungo

jrungo@gmail.com
Fotos de Armando Munguambe

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