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Novo Código Penal vai ao encontro das expectativas da sociedade

Por admin

– consideram organizações e personalidades ouvidas pelo domingo

Personalidades e organizações da sociedade civil ouvidas pela nossa Reportagem sublinharam que estão satisfeitas com a entrada em vigor da nova Lei Penal moçambicana, pois tinham a expectativa de ver erradicadas todos os preconceitos de género e o estabelecimento da igualdade de tratamento entre homens e mulheres. Disseram ainda que queriam ver reflectido na lei o respeito pelos direitos das crianças.

domingo ouviu um representante da Plataforma para Defesa dos Direitos Humanos, uma rede de organizações da sociedade civil, que expressou satisfação pelo facto de alguns preconceitos sexistas e disposições inconstitucionais terem sido removidos do actual Código Penal moçambicano.

Terezinha da Silva, membro da plataforma, disse que o novo respeita a Plataforma de Acção de Beijing, de 1995, que destaca temas como: as mulheres e a saúde; a violência contra as mulheres; os direitos humanos das mulheres.

A nossa entrevistada destacou o reconhecimento do direito das mulheres de tomarem decisões sobre sua sexualidade e pela recomendação feita para modificação da lei que penaliza as mulheres que praticam aborto.

A Plataforma de Defesa dos Direitos Humanos propõe , entretanto, uma definição clara  para a “criança” no novo código, de acordo com a Convenção dos Direitos da Criança(aprovada na 44ª sessão da ONU, 1989, ratificada por Moçambique em 1990), que considera crianças os menores até 18 anos de idade.

Para aquela rede de advocacia em direitos humanos, a definição de 18 anos para menoridade deve acompanhar formulação de artigos que penalizam crimes de violação, que deviam ter natureza pública.

Outra vitória da rede de organizações de advocacia de direitos humanos relaciona-se à tipificação de abuso sexual como crime, matéria que era ignorada pela antiga legislação penal.

As mesmas organizações defendem, contudo, que urge a necessidade de se reclassificar os crimes de abuso sexual de menores em semi-públicos, públicos e particulares devido à particularidade dos mesmos e à realidade do país.

Tudo isto porque , em termos práticos, nos crimes considerados particulares pela lei penal em vigor no país, os ofendidos quando são menores acabam por nunca apresentar queixa, ou se a violência é praticada por um membro da família, os outros nunca apresentam a queixa. Para além disso, a prática tem demonstrado que a dependência económica em relação ao perpetrador dificulta ainda mais a apresentação da queixa por parte da vítima ou familiares.

Por outro lado, tendo em conta que o Governo Moçambicano ratificou a Convenção dos Direitos da Criança em 1990, que propugna o Princípio da Protecção Integral e Prioridade Absoluta, organizações da sociedade civil mostram-se satisfeitos pelo facto de as penas terem sido agravadas quando a vítima for uma criança.

DESPENALIZAÇÃO DO ABORTO:

LUFADA DE AR FRESCO

Organizações da sociedade civil consideravam bizarra a lei punitiva (art. 358 do  antigo Código Penal) que penaliza criminalizava o aborto. A sua despenalização até as primeiras doze semanas de gravidez destaca-se como grande vitória para movimentos feministas como a WLSA Moçambique e Fórum Mulher que tanto advogaram sobre a matéria.

Contudo as próprias organizações fazem lembrar que o direito à escolha e à interrupção voluntária da gravidez (aborto) não pode ser visto como um método anticoncepcional. Aborto é um incidente na vida de uma mulher. Nenhuma mulher faz um aborto de forma alegre, constitui sempre um momento traumático na sua vida.

A substituição dos “crimes contra a honestidade” por “crimes contra liberdade sexual” ressalta como outra vitória retumbante.

Personalidades por nós ouvidas defendem que os crimes sexuais devem ser de natureza pública e não semi-pública, pois embora tais crimes atinjam o foro íntimo das vítimas, a perseguição do crime é de interesse público, tendo em conta que os agentes do crime podem coagir ou convencer, por diversas formas, a vítima ou as pessoas.

A revisão é um processo contínuo

– Teresinha da SilvaCoordenadora Nacional do WLSA Moçambique

Terezinha da Silva, coordenadora nacional do WLSA, disse que a revisão de uma lei é processo contínuo e mostrou-se satisfeita com o novo Código Pelal, não obstante carecer ainda de aprimoramento.

“Aprovado o novo Código Penal devia seguir a revisão da Lei da Sucessão e Herança,apontou a nossa entrevistada.

Terezinha da Silva integrou a Plataforma para Defesa dos Direitos Humanos na advocacia em torno da Revisão do Código Penal, uma rede informal de diferentes organizações.

Sublinhou que a grande lacuna do novo código prende-se á questão das minorias sexuais, embora a lei deixe de criminalizar relacionamentos íntimos entre pessoas com mesmo sexo.

“De uma forma geral estamos satisfeitos com a última versão promulgada pelo Presidente da República”, disse Teresinha da Silva, acrescentando que o novo código traz conceitos inovadores em domínios como crimes ambientais, contra violência aos animais e até elimina a bigamia.

Saudou a despenalização do aborto até as primeiras doze semanas de gravidez. Agora o aborto será seguro e será praticado nas unidades sanitárias. Quero destacar o trabalho feito pelo Ministério da Saúde. Cerca de 11 por cento das mortes nas maternidades eram por abortos mal sucedidos, referiu.

– Tomás Timbane, Bastonário da Ordem dos Advogados

Para Tomás Timbane, a existência de um Código Penal que se ajuste à realidade é um aspecto positivo porque permite que seja um instrumento normativo que olhe para a nossa realidade actual, tipificando os diversos tipos de crime.

“Naturalmente que poderá haver lacunas, mas o importante é que saímos do código que estava desajustado a realidade do país. Este Código trás medidas alternativas à prisão, até então, a única alternativa era a prisão”, disse o bastonário.

Timbane destacou ainda o facto de à alternativa à prisão estar prevista a aplicação de uma multa, “um avanço extremamente positivo”.

Lembrou, entretanto, que o nosso sistema não está preparado para a aplicação dessas penas alternativas, salientando que o Código Penal devia ser acompanhado com a revisão do Processo do Código Penal, um instrumento que pode de certa forma permitir a aplicação das penas alternativas.

O outro aspecto a ter em conta, segundo o nosso entrevistado, é que Moçambique ratificou muitos instrumentos internacionais que no actual Código entram em choque, como por exemplo, a questão da idade para a criança considerada menor.

António Frangoulis, jurista e docente universitário

António Frangoulis disse que o código é bem-vindo na medida que vai animar o debate. “Havia uma necessidade de termos um novo instrumento normativo que correspondesse ao estágio do desenvolvimento do país”, referiu.

Ressalvou que, naturalmente, não vão faltar os problemas, “mas estes são os condimentos necessários para animar o debate”, sublinhou.

Para o docente universitário não restam dúvidas que estamos perante um documento que vai tornar acessos os debates, pois, levantam-se muitos problemas como por exemplo, as lacunas em relação a criança considerada menor.

“No Código a violação de um menor de 12 anos é considerada crime hediondo, naturalmente que é um escândalo social, mas há crimes mais alarmantes como por exemplo, esquartejar alguém que neste código é classificado como sendo homicídio voluntário”, ressaltou.

O nosso entrevistado levantou a questão relacionada com o crime de rapto em que alguém rapta uma pessoa com a intenção de cobrar resgate e , entretanto, a vítima apanha um susto e perde a vida. “Aqui o raptor não tinha intenção de matar a vítima, mas esta acaba perdendo a vida como consequência do rapto, então, estamos perante um homicídio que não é voluntário”, argumentou.

Relativamente às penas alternativas, um produto do novo código, Frangoulis disse que é um exercício que vale apenas esperar para ver o que de facto vai acontecer. “Não sei se vai ser aplicável à nossa realidade sob ponte de vista social em que um criminoso terá que conviver com a sociedade, Será que esta não vai rebelar-se?”, questionou.

“O código é bem-vindo. As lacunas existentes podem ser condimentos necessários para animar o debate no sentido de aperfeiçoar cada vez mais o Código Penal. Não podemos chamar um trabalho perfeito, mas pode ser melhorado com um debate acesso durante a sua aplicação, o que significa que estamos perante um documento- base que ao longo do tempo vai sofrer revisões”, finalizou.

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