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“Mesmo os não-recenseados quererão votar”- afirma a académica Mariana Figueira

A académica Mariana Figueira, docente e assistente de qualidade na Universidade Católica de Moçambique (UCM) na cidade da Beira, província de Sofala, prevê que a afluência dos eleitores às urnas, esta quarta-feira, no país, “vai ser muito grande”, a tal ponto que mesmo os que não se puderam recensear no momento oportuno “vão desejar ir votar”.

Desta vez, não haverá o nível de abstenção que tivemos em 2009 ou nas eleições autárquicas. Agora, penso, que vai haver filas intermináveis à boca das urnas. Mesmo aqueles que não se recensearam por alguma razão, vão-se arrepender e desejarão ir votar, mas não poderão fazê-lo por força da lei”, disse aquela académica. Eis a entrevista em jeito de pergunta e resposta.

Fora dos discursos políticos, como é que vê o processo eleitoral cuja campanha chega hoje ao fim?

Este processo eleitoral, comparativamente aos anteriores, parece-me que foi positivo, na medida em que cresceu a consciência política dos cidadãos, que parecem compreender agora o que é pluralidade política, o que é tolerância política. O que é ter um vizinho que convive connosco, mas que não é necessariamente do nosso partido. Por isso, tivemos poucos tumultos ou incidentes entre simpatizantes dos partidos. Nesse aspecto, melhorou-se muito! Acho que há uma grande consciência nas pessoas de que a política não se faz com força, mas sim a política faz-se num ambiente de paz.

Mas, na sua opinião, a que se devem as situações de violência? É desespero das pessoas ao ver que o seu partido não vai ganhar?

Depende de como as pessoas analisam estas situações. Podem convergir vários factores. Pode haver várias motivações. Mas já é salutar o facto de este ano ter melhorado bastante esse espírito de não-violência, porque nos processos anteriores assistíamos a isso praticamente durante todo o período das campanhas. Desta vez, contam-se pelos dedos de uma só mão os casos de violência. Se formos a ver, as pessoas que fazem isso, aparentam ser membros deste ou daquele partido. Alguns porque querem manchar o nome desse partido optam por essa violência. Outros por comportamento tendencialmente violento ou intolerante.

Mas fora isso, podemos avaliar positivamente esta campanha que hoje termina. Decorreu num ambiente calmo, posso dizer de festa, em que as pessoas optaram pela paz. Cada um, que pertence a um determinado partido, fala do seu partido, do manifesto eleitoral, de forma livre e aberta.

O que acha da Beira? No ano passado, nas eleições autárquicas, eram dois os principais partidos. Desta vez são três. Sabemos que a Renamo tem algum enraizamento aqui. O que acha que vai acontecer?

Falando da Beira… até posso falar de Sofala, em geral. Há algum tempo, havia um desespero por parte daqueles que pertencem a Renamo, pois esta não se apresentava nos processos eleitorais. Todos aqueles que são eleitores e que pertencem ou simpatizam com o partido Renamo estavam confusos e não sabiam o que fazer. Por isso, por estarem no meio de desespero, em algum momento pensavam que a única alternativa para a oposição, era votar no MDM. Essa era uma das saídas para eles. Mas depois dos acordos sobre a cessação das hostilidades, parece haver uma tendência de todos os que eram da Renamo e que simpatizavam com o MDM por ausência da Renamo, parecem ter uma tendência de quererem voltar para o partido Renamo. Isso é simples de explicar. É só ver a própria génese do MDM, é só ver a própria história do MDM, a sua formação. Foi formado com o pessoal que saiu dum determinado partido que é a própria Renamo e por algum momento essa situação que aconteceu poderá virar o próprio voto ao contrário. Estes dois vão dividir o eleitorado do campo da oposição.

E acha que o eleitorado da Frelimo não terá tendência de balançar de lado?

Acho que o eleitorado da Frelimo poderá manter-se ou até aumentar. Mas vai depender muito da análise do discurso que lhe está a ser passado pela própria Frelimo. Uma das coisas cuja explicação deve ser reiterada é a questão do termo “continuidade”, cujo conceito está a ser agora problematizado. O candidato Nyusi explicou esta semana a abrangência do termo, dizendo que o actual Presidente está a terminar o mandato e ele, se for eleito, pegará o leme para continuar. Então isto é que é continuidade. Se de facto continuidade representa isso, então fica claro como água.

Também temos que ter em conta a questão das hostilidades. Isso poderá ter criado mágoas em algumas famílias que de algum momento se sentem tocadas pelo conflito político-militar que passou. Então, a questão é, como é que vai ser o comportamento dessas famílias na mesa de votação em relação àqueles que elas acham que são os culpados pela sua dor?

Mas há um ditado que diz que não devemos viver do passado, o melhor é esquecê-lo e olhar para o futuro, olhar para a frente, pois águas passadas não movem o moinho…

Olhando para o futuro… Só que o próprio tempo de assinatura dos próprios acordos de cessação das hostilidades e o dia marcado para a votação, me parece ser um período curto para esquecer uma dor. Podemos dizer hoje que estamos em festa, mas se o tempo fosse um pouco mais, seis meses antes da votação, que é a 15 de Outubro, talvez até lá estas famílias tivesse a cabeça fria para raciocinar diferente.

O que acha que pode acontecer neste processo, aqui na Beira?

Não acredito naqueles que dizem que aqui na Beira o MDM poderá levar vantagem. Mas porquê é que digo isso? Porque é aquilo que eu disse logo no início desta conversa, que muitos dos frustrados da Renamo refugiaram-se para MDM e agora eles poderão votar ao contrário. Para mim espero ter muitas surpresas para ver aqui na Beira.

O que achou dos discursos políticos que foram passados nestes 45 dias pelos actuais candidatos presidenciais?

Comparando Daviz Simango e Filipe Nyusi. O Filipe Nyusi leva vantagem. O candidato Nyusi, de facto, ele mostra que domina os “dossiers” e que nos pode levar para um bom caminho. Tem maior aproximação ao eleitorado e explica como vai ser depois de nós votarmos nele. Nos outros dois candidatos, o discurso se centra no passado, nos ataques às coisas que foram sendo feitas ao longo dos anos da governação da Frelimo. Tem um discurso de falar mal de tudo!

O que tem a dizer em relação às abstenções?

Acho que desta vez, não haverá o nível de abstenção que tivemos em 2009 ou nas eleições autárquicas. Nas eleições autárquicas, a ausência da Renamo pode até ter influenciado a situação. Agora, penso, que vai haver filas intermináveis à boca das urnas. Mesmo aqueles que não se recensearam por alguma razão, vão-se arrepender e desejarão ir votar, mas não poderão fazê-lo por força da lei.

Alfredo Dacala

Foto de António Luís

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