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Apagão perto do fim

A chuva que teima em cair na província da Zambézia há muito que deixou de ser bem-vinda. Destroçou famílias e destruiu infra-estruturas, mas, pior do que isso, não está a dar tréguas para a reconstrução da linha de transporte de energia eléctrica que alimenta a Zambézia, Nampula, Cabo Delgado e Niassa. Os técnicos que estão a realizar a obra garantem que se não fosse por causa da chuva que cai sem preguiça, em uma semana, o assunto estaria resolvido.

Pelo menos 350 mil clientes directos da Electricidade de Moçambique (EDM) estão há exactos 21 dias às escuras e a apelar aos deuses para que façam parar a chuva que cai energicamente na região de Mocuba, no interior da Zambézia. Só assim é que os técnicos da EDM poderão concluir a construção da linha de transporte alternativa.

As mais optimistas expectativas daqueles técnicos indicam que o fornecimento da corrente eléctrica para aquelas quatro províncias poderá ocorrer até quarta-feira desta semana, porém, tudo depende do “cessar-fogo” que a chuva deve obedecer a partir de hoje porque, de contrário o tempo de espera e os prejuízos podem se estender por mais enervantes dias e noites.

Porém, estas preces parecem cair em saco roto porque as nuvens vão e voltam cada vez mais carregadas e deixam cair mais chuva que obriga à interrupção dos trabalhos. “Construir linhas de energia é nossa especialidade. Faríamos isto em uma semana, mas a chuva está a complicar tudo”, disse Gildo Sibumbe, Presidente do Conselho de Administração (PCA) da EDM.

Na sexta-feira passada, por exemplo, o sol apareceu em Mocuba, entre nuvens dispersas, como quem veio para ficar. As diversas equipas da EDM animaram-se e rapidamente puseram mãos à obra na perspectiva de acelerar o trabalho que já tem duas semanas de atraso.

Com o apoio de um helicóptero cargueiro, os materiais foram levados até aos pontos onde devem ser implantados e estava tudo doce. Até as 13 horas o sol andava por ali a oferecer um raro brilho ao dia. Naquele intervalo assistimos a várias operações, incluindo de levantamento e implantação de torres de madeira por aquele meio aéreo.

Entrevistamos à vontade a todos os que quisemos, incluindo aos três tripulantes daquele aparelho que nos revelaram que “o principal constrangimento é a chuva, que vem com vento e trovoada. Também temos as condições do piso que são completamente desfavoráveis às equipas de solo. Sem isso, a nossa parte terminaria em dois dias. Queremos tudo menos chuva, vento e trovoada”, disse Corand Daffle, coordenador da tripulação pertencente à Trans-África Projects.

De seguida, embarcamos naquele helicóptero e voamos à baixa altitude até Mocuba (cerca de 10 minutos de voo) e, já com o local do pouso à vista, observamos que uma imensa nuvem negra progredia rapidamente em direcção àquela cidade trazendo consigo milhões de hectolitros de água.

Poucos minutos depois, chovia a cântaros com direito a vento e trovoada, exactamente aquilo que as equipas da EDM não querem ter por estes dias. A tarde caiu assim mesmo com a chuva a fazer das suas até à madrugada de ontem, impedindo a progressão dos trabalhos por terra e por ar. Por volta das 10 horas de ontem, o sol voltou “sorrindo” entre as nuvens dispersas, mas muitos já não confiam nele… de tal sorte que por volta das 14 00 de ontem as nuvens voltaram a assaltar os céus e derramaram mais chuva interrompendo, uma vez mais, os trabalhos de reposição da linha alternativa.

CADA MINUTO CONTA

Desde o dia 12 de Janeiro, data em que 10 torres de transporte de energia sucumbiram à pressão exercida por centenas de destroços de casas, árvores, entre outros materiais, a EDM despachou técnicos da Direcção de Transporte Centro-Norte (DTCN) para resolverem o assunto com a maior brevidade possível.

Mal aportaram a cidade de Mocuba, aquelas equipas se depararam com um quadro de devastação e inundação das vias de acesso que tornou penoso o estabelecimento do acampamento que serviria de base logística para a meticulosa operação de construção da linha alternativa.

Apesar de disporem de viaturas com a mais robusta tracção às quatro rodas, aqueles técnicos viram parte das viaturas enterrarem e patinar pelo caminho, dada a sinuosidade da via que estava profundamente degradada pela chuva. Aqueles 15 quilómetros foram percorridos em largas horas com recurso a reboques aqui e acolá, entre outros.

Com o acampamento estabelecido, era necessário transportar os materiais da cidade de Mocuba até ao local onde a obra devia decorrer. Outra dor de cabeça. Os tais materiais são todos eles pesados. Postes de madeira com mais de 10 metros de comprimento, rolos de cabo de alumínio com cinco quilómetros de comprimento e toneladas de peso, isoladores de vidro e de borracha que devem ser montados o mais limpo possível, ganchos metálicos, roldanas, escadotes, cordas diversas, entre outros.

Mesmo com o apoio de camiões e tractores, o transporte daqueles equipamentos foi frustrado pelo péssimo estado das vias que exigia obras de engenharia para as quais os técnicos da EDM jamais estiveram preparados para lidar. Era preciso encontrar soluções rápidas porque do outro lado do país a vida parou e os prejuízos só se avolumam.

Terá sido na sequência destes factos que se contractou uma empresa rotulada de especialista em construção e manutenção de estradas terciárias que rapidamente enviou os seus técnicos para inspeccionar a via. No regresso aqueles disseram “é dinheiro, sim, mas, lamentamos informar que não estamos em condições de meter os nossos camiões aqui”. Bateram com a porta e sumiram.

Por ironia, e apesar de todo o esforço até aqui empreendido, aquela via prevalece intransitável e só com recurso ao helicóptero é que está a ser possível o transporte dos materiais. “Cada minuto conta. É tempo de acabar. Reconheço o empenho e manifesto a confiança do governo de que vão continuar a se dedicar, como sempre fizeram, para que se reponha a ligação eléctrica para as quatro províncias afectadas”, disse Pedro Couto, ministro dos Recursos Minerais e Energia, que visitou o local na sexta-feira passada.

Aliás, para chegar ao ponto onde as obras estão a decorrer, Pedro Couto ensaiou uma viagem de carro. Depois de percorrer uns oito quilómetros nos quais sobraram solavancos e escorregadelas em poças de lama, alcançou um pequeno acampamento improvisado no meio da floresta.

Daqui em diante nem tractor passa”, avisaram os empreiteiros que aceitaram o desafio de reabrir aquela via. O ministro conformou-se com a realidade e regressou a Mocuba onde apanhou um helicóptero para chegar ao ponto onde estão a ser erguidas as torres de madeira que servirão de alternativa.

Duzentos homens no terreno 

A construção da linha alternativa para fornecer energia às províncias da Zambézia, Nampula, cabo Delgado e Niassa está a obrigar a todos na EDM a despirem os seus galões e a vestirem a pele de técnicos para que o fornecimento de corrente volte a ser uma realidade no mais curto espaço de tempo possível.

Por exemplo, dois administradores executivos da empresa, nomeadamente Agostinho Mugoda, da área de produção, transporte e telecomunicações, e Isaías Rabeca, do pelouro de distribuição e serviços ao cliente, residem actualmente em tendas montadas no acampamento improvisado na área onde estão a decorrer as obras. Eles coordenam as actividades e vão dando moral às equipas que, em muitos casos, desesperam perante os avanços e retrocessos da obra.

A par destes, a operação agora em curso em Mocuba conta com dois directores de transporte das linhas Centro-Norte e linhas do Norte, chefes de departamento das regiões Centro-Norte e Norte, e técnicos provenientes das áreas de Nampula, Beira, Chimoio, Quelimane e Maputo.

Todos estes dirigentes executam as tarefas como técnicos comuns. Ninguém inventa nada. Obedecem aos procedimentos e funcionam como importantes reforços de campo, uma vez que se está perante uma obra cuja complexidade exige cuidados especiais.

No total, a EDM destacou 200 trabalhadores, entre efectivos e eventuais que permanecem ali a trabalhar ao mesmo tempo que bradam aos céus para que não chova. “Estamos a iniciar o lançamento dos cabos porque já temos 29 pórticos montados, dos 45 que a linha deve ter. Se não chover, creio que poderemos concluir a obra e ligar a corrente em poucos dias”, disse Orlando Missa, director da rede de transporte da EDM.

O que de facto está a afligir a todos os que trabalham neste projecto é a probabilidade permanente de chuva pois, faz imenso calor e, volta e meia, chove a bem chover e o chão, já “saciado” se torna um grande inimigo de quem caminha ou atravessa a via de carro.

Temos a indicação de que o trabalho vai andar a uma velocidade maior porque contamos com o helicóptero de carga mas, é importante lembrar que há factores naturais que podem afectar o prosseguimento dos trabalhos, pelo que temos que ser cautelosos nas nossas expectativas”, repisou o ministro Pedro Couto.

Texto de Jorge Rungo, em Mocuba

jrungo@gmail.com

Fotos de Jerónimo Muianga

 

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