Editorial

Arregaçar as mangas trabalhar e produzir resultados

Na tomada de posse dos ministros e governadores, o Presidente Nyusi voltou a dar importantes recados sobre o que ele quer e não quer na sua acção governativa. Tinha o feito antes, quando ele próprio tomou posse a 15 de Janeiro na Praça da Independência e voltou a fazê-lo esta semana.

Aos ministros e vice-ministros, para lhes dissipar quaisquer atitudes de orgulho, vaidade, arrogância, prepotência, disse-lhes logo “nós estamos aqui para servir o povo e não o contrário”. E acrescentou: “a vossa indicação para dirigir os diversos sectores económicos e sociais não significa sermos os únicos, ou os melhores. Ela traduz a nossa confiança na capacidade e competência que cada um de vós tem vindo a demonstrar nas áreas específicas”.

O Presidente orientou no sentido de haver uma maior capacidade de interacção entre os governantes e os cidadãos de todos os estratos sociais. Reiterou o que tinha dito na sua tomada de posse, afirmando que “este é um novo ciclo de governação que certamente implica novas atitudes colectivas e individuais

A cultura do trabalho deve ser o motor de cada um de nós. É nossa responsabilidade assegurar que a preguiça dos nossos subordinados não seja o reflexo da atitude dos nossos superiores, ou resultado das péssimas condições de trabalho. Temos que ser e dar exemplo de que o trabalho árduo, justo e ético, ao serviço do povo, é a nossa responsabilidade máxima”, disse Nyusi aos ministros e vice-ministros.

Aos governadores disse mais ou menos a mesma coisa. Que devem vencer o orgulho, a vaidade, a teimosia, a arrogância e a prepotência: “saibam comunicar de forma efectiva, sem preconceitos, isto é, sem vaidade nem arrogância, mas com genuína simplicidade, aglutinem o povo”.

As palavras-chaves do novo Presidente são: novo ciclo de governação, servir o povo, trabalho, ética governativa, integridade, harmonia, proactividade, imparcialidade, humildade, honestidade, resultados.

Dizia um velho professor de Filosofia, ciência cujo nome reivindica o amor à sabedoria através do conhecimento que vai saboreando, que nada há de mais prático que ter ideias claras. Nós estamos inteiramente de acordo. Talvez por isso mesmo é que a Constituição quis dignificar o direito à informação reconhecendo-lhe a categoria de direito fundamental do Homem. Por outras palavras, o Homem, para ser Homem, precisa de informação como de pão para a boca.

Por isso, nestes seus três discursos públicos: o da sua investidura, o da tomada de posse dos ministros e vice-ministros e o da tomada de posse dos governadores provinciais, o Presidente Nyusi expõe as ideias sobre o que quer do seu Governo claramente. São ideias claras como a água. Límpidas. Perceptíveis até para os mais ou menos surdos e pensamos que os recados tem chegado nitidamente aos destinatários. Na sociedade civil, até os mais cépticos aplaudiram os seus primeiros discursos.

À talhe de foice, podemos aqui voltar a reflectir sobre vários aspectos que têm merecido a nossa atenção ao longo da existência deste jornal. São temas candentes e que podem ou não servir como subsídios na actual acção governativa.

AGRICULTURA

Por exemplo, sobre a Agricultura, agora transformado em Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar, já escrevemos aqui há uns tempos que não falta terra, nem água, em Moçambique e que era um escândalo chegarmos à conclusão de que com o país rico que temos, não sejamos capazes de acabar com a fome. Falta conhecimento, falta trabalho, falta estudar a natureza para dela extrair aquilo que ela nos oferece, sendo por isso necessário limar tudo isso para que se possa produzir a contento e possamos nos alimentar sem os problemas que actualmente enfrentamos e que nos levam a importar até tomate da África do Sul.

EDUCAÇÃO

Na Educação, agora Educação e Desenvolvimento Humano, estão à frente duas figuras cujas ideias sobre o sector  domingo conhece na sua essência. São pessoas apaixonadas pelo ensino e pela melhoria da sua qualidade. Mas os problemas actuais do sector estão aí. Agora vão recomeçar as aulas por todo o país, ficando ainda de fora, a todos os níveis, muitas crianças e adolescentes, por falta de escolas, de professores ou de lugares nas escolas. Todos nós estamos conscientes e o Governo também que sem educação não há desenvolvimento, a começar pela cidadania, já que esta assenta na liberdade humana e esta tem como pressuposto o conhecimento, conhecimento este que em linha de máxima se obtém e estrutura na escola. É um dado que ninguém contesta e que impõe aos governantes uma linha prioritária de actuação.

É que a igualdade de oportunidades tem como alicerce a escola. Em termos de lógica pura quer dizer que, no concreto das situações, ainda não conseguimos realizar essa igualdade de oportunidades, o que significa à priori que o Estado de Direito em construção ainda mete muita água pelas brechas abertas nos seus próprios fundamentos.

Não se trata de uma crítica, mas de uma constatação rumo ao futuro, já que, no presente, o que está feito está feito, e não se pode dar um salto de um dia para o outro. Os governantes não possuem uma varinha mágica para fazer surgir escolas e professores onde umas e outros são necessários como o pão para a boca. Há fome de pão por esse país fora e há fome de Educação, circunstâncias que se influenciam reciprocamente.

A instrução, ao nível básico tem que se transformar, a partir de agora, numa autêntica cruzada mobilizante, angariando e mobilizando fundos, meios e braços para que nos anos seguintes não exista nenhum distrito no nosso país onde as crianças fiquem sem estudar por carência de estruturas escolares.

Uma criança que não estuda, por falta de meios, é mancha que nos devia envergonhar e devia envergonhar as autoridades. Trata-se de violações objectivas de um direito protegido constitucionalmente. E já que a tónica da governação assenta nos distritos e nas localidades ao nível do discurso político, a escola constitui um excelente termómetro para medir a temperatura da governação.

FUNCIONAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

Talvez seja lícito afirmar que o nosso Estado atravessa uma crise em termos de institucionalização das instituições. As crises, sendo sintoma de desarticulação, são, ao memo tempo, aviso à navegação, para a urgência de tal institucionalização. Institucionalizar significa, neste contexto, enraizar o sistema democrático que escolhemos para a gestão da coisa pública, em função da razão democrática dos cidadãos, razão esta que é a pedra de toque de todo e qualquer poder legítimo.

Evidentemente que as crises de articulação num sistema jovem como o nosso são mais frequentes, devido à história, história que não é apenas passado, mas se reflecte no futuro, na medida em que o presente não é mais que o passado ultrapassado. Os lastros positivos ou negativos em que os acontecimentos históricos se desenrolaram continuam com um seu dinamismo actuante no momento presente, o que nem sempre facilita as coisas.

Viemos de um passado em que tivemos que construir o Estado, ou seja, a organização obrigatória para o desenvolvimento dos cidadãos. Com a independência, a falta de Estado fez-se sentir e, dada a predominância dos dirigentes na construção dessa organização, confundiu-se, com frequência, o poder enquanto serviço, com o poder enquanto património dos dirigentes. Houve uma nítida inclinação por parte dos dirigentes para considerarem o poder como um seu património, enquanto a nova ordem jurídica lhes impunha o poder como serviço, tornando-os na prática empregados do povo ou dos cidadãos.

POLÍCIA

Muito tem se feito na área de formação da nossa Polícia, mas os nossos polícias, em geral, são de escassa formação genérica, muitos quase nem sabem ler, nem escrever. A maioria não tem meios para cumprir as missões de que são incumbidos, os bandidos que perseguem são dotados de meios muito superiores aos seus. Para além dos meios imprescindíveis para o desempenho das tarefas de que são incumbidos, recebem salários de miséria, o que lhes vai tornar o crime demasiado apetecível para saírem das péssimas condições em que vão vegetando. Já dizia o velho Demóstenes, sábio e experiente, que ninguém resiste a um burro carregado de prata, sobretudo quando essa resistência é posta à prova todos os dias, em comparação com outros funcionários do Estado que prosperam a olhos vistos, sabendo os próprios polícias que esses funcionários que, por vezes, até são chamados a guardar, enriquecem sem causa.

Acontece, mesmo, serem chamados a proteger roubos que eles próprios sabem que são roubos, roubos estes, ou desvios (para usar uma linguagem eufemística) protagonizados por superiores que não se cansam de lhes pregar uma conduta ética.

Dizer, por conseguinte, que a Polícia é filha do povo e reflecte, mesmo a nível ético, as condições desse mesmo povo, constatação esta que torna o remédio bastante mais difícil, embora não impossível.

Seria demasiada petulância da nossa parte aconselhar soluções, as quais dependem de um estudo aprofundado e de uma vontade férrea de operar as mudanças necessárias, mas enquadradas pela convicção de que se trata, de facto, de um assunto prioritário do Estado e não apenas do Governo, embora este seja o primeiro responsável.

 A tranquilidade do cidadão comum entrou em turbulência, não cumprindo o Estado a missão que lhe incumbe de garantir condições de tranquilidade, mediante uma ordem capaz de gerar o desenvolvimento.

TRANSPORTES

Um dos deveres do Estado consiste na criação de condições (leia-se, no caso, transportes públicos) a fim de que os cidadãos possam exercer-se no dia-a-dia das suas vidas. Se o Estado faltar a este dever primário e elementar, a sua estrutura jurídica de Estado de Direito e de justiça social, consagrada com a devida ênfase na Constituição da República, fica seriamente comprometida e o combate, em boa hora entusiasticamente lançado contra a miséria, sofrerá um rude golpe.

Oque se passa actualmente nas grandes cidades como Maputo e Matola é que as pessoas são transportadas como se de gado se tratasse por não haver transporte condigno. Fazem-se transportar nos chamados “my love”. Que volta e meia as despeja no alcatrão, quando em andamento o taipal abre-se. Isto é desumano e urge inverter. Não obviamente com medidas administrativas, mas com soluções concretas que eliminem o problema. Se houver um meio de transporte melhor, ninguém se atrelará na carroçaria.

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