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Formalização do “xitique” divide opiniões

por admin

Há milhões, muitos milhões de meticais a circularem foram do sistema financeiro formal. Alguns destes estão nas mãos dos chamados grupos de Poupança e Crédito Rotativo (PCR), ou simplesmente “xitique”.

 O Banco de Moçambique e o governo entendem que está na hora de trazer essa dinheirama toda para o lado de cá do sistema financeiro. O que sustenta esta ideia é o facto de alguns grupos de “xitique” estarem a gerir poupanças e fundos de crédito superiores a três milhões de meticais, o que só amplia os riscos de assaltos para os portadores de tão cobiçadas algibeiras.

Este assunto voltou a ser objecto de debate na cidade de Maputo por parte de representantes de diferentes organismos que lidam com Poupança e Crédito Rotativo (PCR), os quais não conseguiram chegar a um entendimento sobre a pertinência e o roteiro a seguir para levar os grupos de mamanas que integram os PCR a guardarem o seu “xitique” nos bancos.

É que, o movimento de “xitique” ganhou uma dimensão tal que nem o Banco de Moçambique, e muito menos o governo, conseguem ficar incólumes a ver “a banda a passar” pois, com o financiamento do Fundo de Apoio à Reabilitação Económica (FARE), que é uma instituição subordinada ao Ministério da Planificação e Desenvolvimento (MPD), organizações como a KUKULA, Agência de Desenvolvimento de Manica (ADEM), OPHAVELA, Visão Mundial e outras, criaram e assistiram a cerca de dois mil grupos que envolvem mais de 30 mil pessoas, a maior parte das quais mulheres, em mais de 20 distritos.

Estes grupos pouparam até ao momento cerca de um milhão e meio de dólares americanos, o equivalente a cerca de 45 milhões de meticais, e com o valor tiveram uma carteira activa de empréstimos no valor de cerca de 375 mil dólares, ou seja, perto de 11 milhões e 250 mil meticais, para aplicar em diversas actividades do desenvolvimento social e económico nas diferentes regiões onde residem.

Não obstante a adopção dessas práticas promissoras, as comunidades tem estado a ganhar consciência, também, sobre a necessidade de estabelecer um mecanismo de segurança, do tipo Fundo Social, para fazer face aos choques inesperados que podem acontecer durante a vigência do ciclo de poupança e empréstimo, tendo acumulado nesse processo cerca de 20 mil dólares americanos, o aproximado a 600 mil meticais”, indica Salim Valá, secretário permanente do Ministério da Planificação e Desenvolvimento (MPD).

Por outro lado, com os fundos obtidos através da participação nos grupos de PCR, as populações tem estado a desenvolver actividades económicas como o comércio, o artesanato, pequena indústria, agricultura, entre outras, o que contribui para o aumento do rendimento das famílias, para a criação de postos de trabalho e permite que os agregados familiares melhorarem as suas condições nos domínios da educação, habitação, saúde, nutrição, água e saneamento, comunicação, entre outras.

Do lado do governo, a ideia que persiste é de que os operadores de PCR estão a ganhar um grande relevo ao cobrirem a lacuna criada pela fraca expansão de serviços financeiros pela extensão do território nacional que, até agora, só cobrem 63 distritos do país e, na sua maioria, estas instituições formais não ligam à mínima para as necessidades de grupos de renda baixa.

Salim Valá, afirma ainda que nos últimos anos houve um intenso trabalho visando o desenvolvimento e fortalecimento do sistema financeiro e na identificação das prioridades para melhorar o acesso aos serviços financeiros, particularmente à população do Moçambique mais profundo.

Todavia, estamos convictos de que, com o esforço e empenho colectivo, com uma boa governação financeira e com a participação efectiva de todos os parceiros envolvidos na empreitada, estaremos em condições de mobilizar mais energias e sinergias com vista a fazer face à difícil situação de pobreza que o país enfrenta e, deste modo, alcançar os nossos objectivos programáticos de criar o bem-estar e o desenvolvimento humano”, disse.

Apesar de toda a vontade e interesse do Banco de Moçambique, do governo e de várias instituições subordinadas, algumas organizações não-governamentais que criam e assistem aqueles grupos mantém um pé atrás quando o assunto é atrair os PCR para a banca formal. A primeira pergunta que fazem e que não encontra respostas consistentes é “será que os grupos querem?”, tendo em conta que muitos destes operam a muitos quilómetros do raio de cobertura das instituições financeiras.

Para adensar o debate e fazer com que o presídio fique ponha a “mão no queixo”, outras vozes se levantam para reiterar que os integrantes de grupos de PCR não só vivem longe dos bancos como também não entendem para que servem tendo em conta as exigências que estes fazem para a abertura e gestão de contas, a começar pela necessidade de posse de documentos de identificação, que poucos possuem no meio rural.

Por outro lado, paira o entendimento de que estes grupos de “xitique” são formados em função de afinidades e de confiança mútua e que a eventual introdução de formalismos bancários tanto pode resultar no crescimento dos grupos, como também pode descambar num cenário apocalíptico de atritos, lágrimas e rangeres de dentes pois, os mais escolarizados, imbuídos de má-fé, podem tramitar a papelada em seu benefício.

Para a administradora do distrito de Moamba, na província de Maputo, formalizar estes grupos seria, em certa medida, ir contra algo de intrínseco dos grupos na medida em que estes sabem o que pretendem com o dinheiro que reúnem e há relações que se desenvolvem naquele meio que podem ser afectadas pelo formalismo.

Na minha opinião, as organizações que criam e assistem a estes grupos deviam investir na alfabetização em gestão financeira dos grupos, apenas isso, porque apesar de serem pessoas do campo, perseguem objectivos claros de melhorar a qualidade da sua vida através do “xitique”, disse.

Por seu turno, Maria Vicente, administradora de Marracuene, também em Maputo, os grupos que funcionam na sua área de jurisdição não pedem emprestado dinheiro aos bancos e, mesmo assim, resolvem os seus problemas e investem em coisas bastante palpáveis como na construção de casas e aquisição de móveis e electrodomésticos. “Formalizar, sim, mas, isso deve ser antecedido de um estudo profundo”, defende.

Quem entende o assunto com outra sensibilidade é a administradora do distrito de Gondola, em Manica, que tem em mãos mais de 80 grupos que, segundo ela, movimentam muito dinheiro, sobretudo no final do ano, quando se fecham os ciclos de poupança e crédito, o que expõe as famílias a riscos. “É por isso que defendo que se deve levar estes grupos ao sistema financeiro formal, mesmo que se trate de grupos que residem no mais profundo dos confins”.

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