Desporto

Sou candidato porque o voleibol precisa de mim

Camilo Antão, assumindo interesse de renovar mandato na federação

Camilo Antão, gestor do voleibol moçambicano há quase três décadas, assume interesse 

de continuar a dirigir a Federação Moçambicana de Voleibol, por isso é candidato à sua própria sucessão nas eleições marcadas para o próximo dia 16 de Fevereiro.

Ligado ao voleibol desde o período colonial, Camilo Antão foi jogador, treinador e actualmente é gestor da modalidade que jurou amor, daí não estar ainda preparado para deixar o lugar que ocupa para outros.

Aliás, conforme sublinha nesta entrevista ao nosso jornal, o voleibol moçambicano ainda precisa da sua experiência para progredir, e não será ele a trair uma especialidade que tanto adora.

 

Sr. Camilo Antão, quais foram os seus primeiros passos no voleibol?

Nasci aqui em Moçambique e durante o tempo colonial apercebi-me que o voleibol era apenas praticado de forma elitista, não havia prática feminina e escolas de base. Só se jogava no Liceu Salazar (Escola Secundária Josina Machel) e também no António Enes (Escola Secundária Francisco Manyanga). Depois da independência nacional, em 1977, iniciei a minha profissão de professor em Maputo e Quelimane. Juntei-me a um grupo de entusiastas do voleibol e a nossa luta era tornar a modalidade abrangente através da movimentação de escalões de iniciação. A mulher começou a jogar ao lado do homem, só havia pares mistos. Não havia competições internacionais, anos depois iniciámos intercâmbios a nível da Zona VI. Em 1980 foi criada a Federação Moçambicana de Voleibol. Fui estudar na Alemanha e no meu regresso continuei ligado ao voleibol até hoje.

Parece que não quer largar o poder. Há eleições em Fevereiro. Vai recandidatar-se?

Correcto, vou recandidatar-me para mais um mandato de quatro anos porque o voleibol moçambicano ainda precisa de mim.

Como é que precisa de si? Afinal qual é a sua motivação?

Tenho longa experiência, excelentes relações com o presidente da federação internacional. É uma questão de paixão por Moçambique, pela profissão que estudei e até hoje estudo o voleibol. Dedico-me bastante e tenho uma ligação forte com a Zona VI, com a África e também com a federação internacional, onde o trabalho é muito profissional e sério.

Está a dizer que quer continuar para não deitar fora a sua experiência?

Não faz sentido ser reconhecido internacionalmente e não ajudar o seu próprio país. Daqui a quatro anos vou descansar. Fui duas vezes presidente da Zona VI e agora sou vice-presidente para a área de competições. Na federação internacional sou gestor de competições internacionais eleito em Novembro de 2012. Deixe claro que não fui indicado, fui eleito.

 

SEM MOTIVAÇÃO FINANCEIRA

 

Ser dirigente, muitas vezes, pensa-se que é fonte de dinheiro. Não é essa a sua principal motivação?

A minha motivação não é financeira, de querer aparecer nos jornais, mas é o que sei fazer e tenho reconhecimento da federação internacional. O voleibol precisa de mim nos próximos quatro anos, até os Jogos Olímpicos de Rio de Janeiro. Depois disso, poderei continuar nos organismos de África e do mundo. Acho interessante continuar a transmitir a minha experiência.

O presidente da federação só pode ser um dirigente experiente?

O que acontece hoje, em várias federações, não é admissível no mundo moderno um presidente de uma federação não ter tempo para a modalidade que dirige. Eu trabalho no sistema DDR, que significa Disciplina, Disponibilidade e Rendimento. Fazer despachos não interessa no voleibol, quem não tem tempo não vai render, não pode um vendedor de coca-cola ser presidente da federação, mesmo você, se tivesse só cinco minutos para esta entrevista, não iria render nada.

Parece que já está a falar do seu adversário?

Não me referi a nome de ninguém, mas os regulamentos são claros, um atleta ou treinador não pode ser gestor. A acumulação de cargos na mesma associação desportiva é incompatível. É complicado e é o que acontece com o meu amigo Khalid. É incompatível.

Há quase duas décadas que é presidente da federação. Diga-nos o que já conquistou?

Primeiro, o importante é que exista a nível nacional uma realidade da prática de voleibol. Segundo, no voleibol de sala nota-se um equilíbrio a nível nacional, já não é só Maputo e Beira que disputam os campeonatos. Isso é reflexo do crescimento a nível nacional. Em terceiro, no voleibol de praia somos medalha de bronze, é um facto. Moçambique é terceiro melhor país de África e isso é fruto do trabalho da federação nos últimos anos.

Por que não há equilíbrio no voleibol de praia?

Não há equilíbrio porque a nível provincial não se está a trabalhar devidamente. É uma questão de trabalho porque temos bolas, praias e redes. Aqui em Maputo montámos dez campos na praia e na província isso ainda não se faz porque dá muito trabalho. São horas a montar os campos para depois levar outras a desmontar.

Não entendi bem, o que impede as províncias de trabalhar mais?

A intensidade de trabalho deles é reduzida, têm de trabalhar mais. Estão a subestimar a praia que temos, quando lá não se paga nada, não é como na sala.

Que apoio a federação tem canalizado para as associações provinciais?

Já demos bolas de iniciação e redes. Não demos dinheiro e eles têm de aprender a trabalhar nas condições existentes. Nem sequer temos sede, mas há que pôr as pessoas a jogar.

Por que não distribui às associações o dinheiro que recebe do ministério?

O orçamento para o voleibol provincial deve vir do Governo da província. Nós não estamos autorizados a receber dinheiro do Fundo de Promoção Desportiva e distribuir pelas províncias. Não temos dinheiro para pagar secretários, agentes de limpeza, mas para gastar em competições nacionais e internacionais. Muitas vezes utilizo o meu próprio dinheiro para as coisas acontecerem. Nos Jogos Africanos usei o meu dinheiro e até hoje o COJA não me pagou. Na deslocação para o campeonato africano da Argélia comprei seis passagens aéreas e até hoje ainda não me pagaram, demos um show e conquistámos o terceiro lugar.

Como explica que em femininos sejamos fortes em África e em masculinos não?

As nossas meninas são heroínas, têm mérito porque aceitaram trabalhar nas condições reais que existiam e ganharam. A segunda razão é que nós, como moçambicanos, não temos problemas culturais em mostrar pernas das senhoras e costas, por isso em femininos somos fortes que países bem colocados em masculinos como Argélia e Tunísia, que têm outros hábitos culturais.

 

RIO DE JANEIRO NO HORIZONTE

 

Onde é a sede da federação? É verdade que é na sua casa?

Não temos sede, trabalho em casa, na Faculdade e no Comité Olímpico. É preciso equacionar estas questões. O protagonismo é patente no ministério, infelizmente não a favor das federações e associações provinciais. Continuamos sem secretário técnico e aguardamos o lançamento do respectivo concurso público pelo ministério, o que pode acontecer daqui a dez ou dois anos.

O que é preciso para Moçambique qualificar-se aos próximos Jogos Olímpicos?

É necessário haver muito trabalho profissional e condições. Não quero falar de dinheiro. Digo que hoje, por exemplo, o voleibol de sala não tem instalações para treinar. Já iniciámos a preparação com o apoio do Comité Olímpico. Estiveram cá técnicos brasileiros e pretendemos que ajudem a seleccionar jovens para atacar os Jogos Olímpicos. Depois esperamos conseguir algumas bolsas para preparar os atletas fora do país.

O que pensa do movimento do voleibol nos clubes?

Não estou totalmente satisfeito porque é necessário mais trabalho de qualidade nos clubes. Há clubes que quase não se treinam, assim não pode ser. É preciso maior agressividade no marketing porque também há equipas que trabalham muito mas não têm patrocinadores.

Está satisfeito com o estágio do mini-vólei?

O mini-vólei é a receita para Moçambique crescer, porque abrange a iniciação e massificação. Temos muitas redes e bolas em distribuição pelo país mediante projecto; paralelamente, estamos a formar monitores em várias províncias para que o projecto seja uma realidade a nível das escolas. Quando tivermos um maior número de praticantes, vamos seleccionar os talentos e apoiá-los para que prossigam com as suas carreiras. Queremos ter um bom nível, por isso o treinamento deve ser a longo prazo. Há anos nos campeonatos nacionais apenas movimentávamos seniores, mas este ano tivemos juniores, fazemos isso também no âmbito do Plano Estratégico de preparação dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. 

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