Sai, sai, sai… Você não apita bem

Já disse que a ultima edição do torneio de futebol que anualmente promovo no povoado de Tunduzi, regulado de Denguma, distrito de Morrumbala, província da Zambézia, só teve um jogo porque gente esfomeada não aguentava jogar.

Esqueci de dizer que o conflito armado, em volta do proclamado quartel-general da Renamo, na zona de Sabe, que me parece ter a dimensão igual a do próprio distrito, também esta a parar com o desporto, o futebol.

Pronto, vamos ao assunto de hoje, o jogo de três árbitros. O primeiro foi mandado embora do campo por assinalar penalte contra a equipa de casa que perdia por um a zero. Foi corrido pelos pais dos jogadores assim:sai, sai, sai…Você não apita bem. Vamos te enviar para Sabe. Sabe é onde decorrem combates militares entre as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique e homens armados da Renamo, donde a população cedo fugiu. E onde se diz que a Renamo tem estado a efectuar julgamentos à sua maneira, com espancamentos e chambocadas, misturando ladroes, adúlteros e outros prevaricadores que lhe são endereçados pelos seus adeptos, alguns residindo na vila sede.

Temendo porrada no local de jogo ou tortura no Sabe, o aludido árbitro se retirou do campo. Veio ter comigo. Apertei-lhe a mão e lhe disse: BOM TRABALHO! Bom trabalho porque o penalte era penalte de verdade Pena não ter sido executado. Ele fazia parte da comitiva da equipa visitante. Complicado!

O segundo árbitro, residente numa zona próxima do local do jogo, queixou-se de estar a ser insultado e ameaçado de porrada pelos jogadores da equipa visitante, muito mais por ter admitido empate e por ter estado a interromper a partida a seu bel-prazer.

 Abandonou o apito e saiu do campo. Quando veio me informar dos motivos da sua demissão, lhe agradeci com OBRIGADO, porque na verdade estava a estragar o jogo. O jogo continuou, mas não podia prosseguir sem árbitro.

Entrou em cena o terceiro árbitro. O jogo conheceu novo empate (2-2). A equipa visitante marcou o terceiro golo. O árbitro de imediato apitou para o fim do jogo. Não sei como, o homenzinho desapareceu do local sem que alguém desse por isso. É que, corria o risco de espancamento pelos adeptos da equipa de casa muito furiosos pela derrota. Afinal, também era da comitiva visitante. Voltei a vê-lo a noite numa das casas de pasto a beber tentação com os seus amigos, dentre os quais jogadores vencedores do único jogo do meu torneio.

Esse árbitro e seus amigos me perguntaram: Sabe que no Sabe há combate armados e que cerca de nove mil alunos e seus professores não voltarão às salas de aulas este ano? Respondi que sim. E disse para ele: o que não sabia é se os árbitros de Morrumbala também são comprados para favorecer uma determinada equipa. E depois recordei-me que aquela minha gente tinha fome de tudo, dinheiro, comida e paz.

Manuel Meque