Por toda parte se fala da pobreza do Desportivo de Niassa, clube que representa a maior província do país no Moçambola. Todos lamentam pela falta de apoios à colectividade, mas ninguém apoia.
Nascido no Bairro da Cerâmica, nas proximidades do Estádio Municipal 1º de Maio, o Desportivo de Niassa não consegue ter dinheiro para pagar salários e garantir comida para os seus jogadores, que muitas vezes vão aos treinos e aos jogos sem terem jantado ou almoçado.
A Associação Provincial de Futebol diz que já cumpriu a sua missão, que foi de ajudar o clube a ascender ao Moçambola, vontade colectiva das pessoas do Niassa e do Governo provincial. Por sua vez, a parte governamental, nesse caso a Direcção Provincial da Juventude e Desporto, diz, também, que já cumpriu a sua missão, que foi de atribuir dinheiro para que a equipa se inscrevesse e para testes médicos dos jogadores exigidos pela Liga Moçambicana de Futebol.
E o empresariado? Não acredita ganhar vantagens caso patrocinasse o representante da sua província, por isso prefere juntar-se aos que vão dizendo que o Governo deve manter-se na vanguarda de apoio ao Desportivo do Niassa, porque quando a província voltar a sair do Moçambola as pessoas vão se revoltar, perdendo o Governo o apoio popular.
Não é por acaso que dos distritos saem multidões para assistir aos jogos do Moçambola, em Lichinga, mesmo que as viagens e os ingressos custem muito dinheiro.
Onde andam os Amigos e Naturais do Niassa? Esses andam de costas e escondidos nas grandes cidades do país. Mas, aqueles que sofrem pela sua província não querem continuar a receber somente urnas.
E o silêncio do Governador Arlindo Chilundo também preocupa as pessoas do Niassa. Pensa-se que um seu gesto pela causa do futebol na província pode abrir portas donde podem sair ajudas para o seu representante no Moçambola.
Sem “Moçambola”
haverá revolta
– Adverte José Manuel, presidente eleito e demissionário
Para além da crise de falta de dinheiro, o Desportivo de Niassa vive outra crise, a de falta de direcção. O presidente eleito a 27 de Abril, José Manuel Gaisse, pediu demissão dia 10 de Maio e adverte que se a província sair do Moçambola a população se vai levantar.
Do encontro que mantivemos com Gaisse, em Lichinga, se produziu a presente entrevista.
– Tomei conhecimento que o senhor foi eleito presidente do Desportivo de Niassa. Que pensa fazer para tirar o clube da lama em que se encontra?
– Espero que já tenha tido conhecimento que apresentei demissão.
– Não é possível!
É com dor, angústia e mágoa que assumo não poder ser presidente do representante da terra que me viu nascer no Moçambola. Mas contra factos, não há argumentos.Quando fomos eleitos, eu dizia que é preciso ter coragem para perseguir o leão que atacou alguém. Moçambola tem custos e exigências. Toda agente faz apelos de apoio ao Desportivo de Niassa, mas não contribui. Jogadores precisam de comer para terem força de treinar e jogar.
DEIXARAM O CLUBE COMIGO
Quem é que devia apoiar e não apoia o Desportivo de Niassa?
A todos os níveis, as entidades locais não apoiam o clube. Um clube não pode viver sem fundos. O agravante é haver pessoas que olham para o clube como sua fonte de receita. Pela utilização do Estádio 1º de Maio, o Desportivo de Niassa deve pagar vinte por cento da sua receita ao município. Está-se a sacrificar um clube que nem dinheiro para alimentar seus jogadores tem. Então, com seriedade demiti-me e disse não aguento.
Será que quando se candidatou não conhecia a realidade do clube?
O clube vinha com uma direcção. Houve necessidade de reorganização. Fui convidado a ser novo presidente. Eu como moçambicano, como filho da terra, aceitei. Símbolo de Niassa é elefante. O elefante não é carregado por uma pessoa. Deixaram o clube comigo. Eu pensava que íamos trabalhar juntos.
O que é que encontrou e lhe fez desistir de ser presidente?
A nível interno os contratos de jogadores não estão claros. Nem uma cópia existe. O Moçambola está a decorrer! Há três meses que os jogadores não recebem salários. Não há fórmula de pagamento. São necessários 563 mil meticais para pagar salários a toda equipa. Não há fonte de receita. Quem pede apoio para o clube, não apoia. Seria bom que todos fôssemos os primeiros a contribuir.
Quer dizer, preferiu abandonar o pobre doente!
Deixei o lugar de presidente à disposição. Não abandonei o clube. Vou continuar a apoiar em tudo. Posso dizer mais?
O quê?
O fundo da coisa, não é só falta de dinheiro. Todos temos que estar comprometidos com a causa do clube. A sociedade tem de olhar para o clube como sua coisa, incluindo o governo. Ter uma equipa no Moçambola é ter uma tábua de salvação.
Não acha que ao se demitir, antes de tomar posse, criou outra crise para o clube?
Acredito que não provoquei outra crise. Temos que sentar para uma melhor organização. Talvez seja uma chamada de atenção. O clube chama por nós. Temos que amparar o nosso representante no Moçambola.
Quem são os donos do clube?
O Desportivo de Niassa nasceu no Bairro da Cerâmica. Tem estatutos publicados no Boletim da República.
Tenho ouvido dizer que se fosse o Ferroviário a apurar-se ao Moçambola receberia apoio de todos. Pensa o mesmo?
Esperava-se que o representante do Niassa no Moçambola fosse o Ferroviário, mas, pelo que sucedeu na poule, não é. O Desportivo é uma equipa que saiu do nada, que a todo custo quer firmar-se no país. Temos que esquecer as cores das nossas camisolas e lutarmos para Niassa ter mais uma equipa no Moçambola. Das dezasseis equipas, esta nossa é a única que não tem patrocínio. Começou a treinar a uma semana antes do início do campeonato. Mesmo assim, não está tão mal na classificação.
Como lutar para ter mais equipas no Moçambola, se não querem prestar apoio a uma que lá está?
Havia muita sede de se ir ao Moçambola, até no fórum político.
Agora devem estar todos arrependidos!
Se este projecto falha, a população vai-se levantar, porque Niassa sempre quer estar no Moçambola.
Ao ser convidado a ser presidente, o senhor não foi tido como solução dos problemas do Desportivo de Niassa?
Antes analisamos isso e ficou patente que eu ia ajudar. Já dei trinta mil meticais para a equipa viajar. Sempre disse que não seria possível o clube viver somente do meu bolso. Está a faltar clareza. Sonhou-se muito alto.Resultado, hoje o jogador não tem comida. Vai ao jogo sem ter comido. As portas estão fechadas.
Quando foi eleito?
Fui eleito dia 27 de Abril na presença do governo provincial.
Quer dizer mais algo?
Onde andam os Amigos e Naturais de Niassa? É difícil! Mas acredito que melhores dias virão. As pessoas passam, os processos ficam.
Já agora, quem o demissionário?
Sou José Manuel Daisse, construtor, transportador e vendedor de combustíveis. Este ano vou completar cinquenta e três anos de idade.
Não é verdade
que Governo não apoia
– Rui Parsotam, chefe de Desporto na DPJD
domingo contactou a Direcção Provincial da Juventude e Desporto (DPJD) para saber se tinha alguma ideia de ajuda ao Desportivo de Niassa, clube que corre o risco de não conseguir permanência no Moçambique por não ter dinheiro para salários e alimentar os jogadores, estes que já começaram a desertar para outros clubes.
“Não é verdade que o Governo não apoia o Desportivo de Niassa. Já deu trezentos mil meticais, que serviram para inscrição da equipa no Moçambola e para testes médicos dos jogadores”, responde Rui Parsotam, chefe do Departamento de Desporto na DPJD.
“Nós como Governo não podemos assumir a equipa como nossa. Temos estado a ajudar todos os clubes da nossa província. Neste momento há um movimento que a DPJD está a liderar para que os agentes económicos apoiem a equipa” disse Parsotam.
A outra pessoa com quem abordamos a crise do Desportivo de Niassa foi a presidente da Associação Provincial de Futebol de Niassa, Maria Rajabo Munjune.
“Nós como associação fomos incumbidos pelo governo provincial a missão de envidarmos esforços para que tivéssemos uma equipa no Moçambola. Foi o que fizemos. Não nos foi dito que seriamos nós a pagar salários aos jogadores e aos treinadores, nem a missão de dar-lhes comida”, afirmou.
Manuel Meque
manuel.meque@snoticicas.co.mz