Reportagem

AGRICULTURA: Distritos dizem “adeus” à enxada de cabo curto

A enxada de cabo curto está a ficar para a história nas quatro províncias onde opera a Agência de Desenvolvimento do Vale do Zambeze. Conforme testemunhamos, foram criados 44 parques de máquinas com um total de 169 tractorese respectivosacessórios.Os resultados desse investimento podem ser vistos um pouco por toda a parte. Porém, falta fechar a cadeia produtiva assegurando a comercialização e o processamento.

O sofrimento de alguns camponeses que usavam enxada de cabo curto começou a ser aliviado em 2013, altura em que iniciou a implementação do programa de mecanização agrária no Vale do rio Zambeze, com a locação de 169 tractores e seus implementos agrários.

Sob os auspícios da Agência do Zambeze, em parceria com o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar (MASA), este programa está a beneficiar mais de 10 mil pequenos produtores estabelecidos em distritos identificados como tendo elevado potencial agrícola das províncias de Tete, Sofala, Zambézia e Manica.

Neste âmbito, foram estabelecidos 44 parques de máquinas que são geridos por igual número de camponeses seleccionados por via de concurso público, os quais prestam serviços aos produtores locais, com destaque para a abertura de campos agrícolas, lavoura, sementeira e sacha. Por outro lado, estes gestores criaram 215 postos de emprego directos.

A nossa Reportagem apurou que compete a estes gestores assegurar a manutenção das máquinas e, mediante a sua utilização, que é paga pelos camponeses que o solicitam, procede-se ao pagamento do valor gasto na compra do equipamento.

O período estabelecido para se amortizar a dívida é de cinco anos e depois passa-se o título de propriedade dos tractores para os gestores. A distribuição destas máquinas é feita de acordo com a potencialidade de cada distrito.Para a materialização destes projectos, a Agência do Zambeze trabalha com a Sociedade de Investimentos (Gapi) e a FinAgro para financiar os produtores interessados em adquirir tractores, aquisição de sementes ou expansão de campos.

 

A nossa equipa de Reportagem apurou que existiram gestores que não honravam com os seus compromissos com vista a amortização da dívida, o que obrigou a Agência do Zambeze a confiscar as máquinas e atribui-las a outros gestores. “Os gestores têm que cumprir com o acordo de forma efectiva, por isso são avaliados mensal e trimestralmente, em encontros conciliados com as reuniões técnicas de balanço que decorrem em cada término da campanha agrícola”, disse o Coordenador de Programa de Mecanização de Agência de Zambeze, Adamuge Cebola.

Num outro desenvolvimento, Cebola disse que está em processo a implantação de algumas unidades de assistência técnica no distrito de Caia, Província de Sofala, Nicoadala, na Zambézia, Chiúta, em Tete,e Guro, em Manica, com o término previsto para o fim do ano em curso. Enquanto isso não se concretiza existem brigadas móveis que trabalham directamente com os gestores de máquinas.

O objectivo é transformar os parques de máquinas em futuras empresas de mecanização agrícola, que vão prestar serviços no Vale do rio Zambeze, através de gestores de máquinas. Para tal, sistematicamente os gestores tem recebido treinamento para encarar esta oportunidade como um negócio, sem contar que podem adicionar outros serviços como venda de insumos agrícolas”.

VOZ DOS PRODUTORES

Domingo percorreu cerca de 280 quilómetros da cidade de Tete ao distrito de Marávia. Trata-se de uma região fronteiriça com Zâmbia. Pelo percurso, na localidade de Incanha, no distrito de Marávia, interpelamos David Andissene, co-gestor de parque de máquinas do irmão Cofi Andressene, com três tractores que assiste mais de 40 pessoas e cobra 1.500 meticais para lavrar a terra.

Para além de prestar serviços de mecanização, David Andissene está a produzir milho e outras culturas numa área de 120 hectares. O nosso interlocutor referiu que esta área aumentou depois que recebeu os tractores e espera colher cerca de 270 sacos de 50 quilogramas, que lhe vão render aproximadamente um milhão de meticais. “De algum tempo para cá está actividade tem sido rentável”.

No local, a nossa Reportagem constatou que os tractores que estes gestores receberam há três anos já estão em péssimas condições, com cadeiras rasgadas e pneus cheios de remendos. Além de um tractor que está inoperante devido a falta de pneus. domingo apurou que um pneu grande de tractor custa aproximadamente58 mil meticais.

David Andissene afirmou que devido ao uso do equipamento agrícola alguns camponeses têm estado a aumentar os campos de cultivos. Aliás, estes tractores entram para o mato e muitas vezes tem que derrubar árvores diversas, o que tem dado cabo dos pneus.Na campanha agrícola passada lavramos cerca de 52 hectares onde produzimos gergelim. Na presente campanha fizemos a limpeza em 90 hectares e estamos a produzir milho, porque o Governo prometeu comercializar a produção através do Instituto de Cereais de Moçambique”.

 

Por sua vez, Taisson Manda, residente no distrito de Marávia, produtor e beneficiário dos serviços de mecanização prestados pelo David Andissene, disse que este é o primeiro ano a lavrar uma porção considerável de terra usando tractor. Antes disso, desenvolvia a sua actividade num espaço de um hectare, uma vez que usava a enxada de cabo curto.

“Quando consegui dinheiro aderi os serviços de mecanização agrícola e houve a necessidade de se alargar o campo de cultivo de um para 21 hectares, onde semeio milho, porser uma cultura rentável”.

Ao todo, Taisson Manda investiu mais de 480 mil meticais e espera ganhar o dobro desse valor, com a comercialização de cerca de 70 toneladas que prevê produzir, nesta época agrícola.

Num outro desenvolvimento, o produtor disse que para a comercialização daquelas culturas tem dependido de compradores singulares, uma vez que não há nenhuma instituição pública ou privado que compra o milho ou hortícolas naquela região. O mais caricato, segundo Manda,é que a dado momento faz a troca de produtos agrícolas por peças de vestuário diverso. “É difícil ver algum rendimento a trabalhar nestes moldes”.

Como se não bastasse, à falta de mercado para comercialização dos produtos agrícolas, os produtores também enfrentam dificuldades em relação a aquisição de sementes, o que lhes obriga a se deslocar a Zâmbia.

“São detalhes que o governo deveria observar. Se nessa época alguém resolve percorrer estes280 quilómetros para nos vender sementes, as quantidades que traz nunca chegam para todos. Esgota num ápice. Temos ainda o agravante da falta de mercado, o que nos faz recorrer a países vizinhos e saímos a perder por causa da moeda”.

Fabião Miguel, produtor e gestor de máquinas agrárias no distrito de Vanduzi, na província de Manica, tem quatro tractores e quatro tractoristas, dos quais dois permanentes e dois sazonais. Diferente de outros distritos, nesta região produz-se muito o milho denominado “beby-corn ou beby milho”, entre outras culturas. A aposta neste tipo de milho deve-se ao facto de existir uma empresa local que compra aquele tipo de milho em cada campanha.

Apesar de produzir desde 1982, só em 2015 é que o nosso interlocutor começou a operaro parque de máquinas, quando recebeu os tractores e os seus acessórios nomeadamente alfaia,semeador, pulverizador, tanque para o depósito de combustível, trelado, lamina, plataforma de colher milho, entre outros.

Este agricultor e gestor de máquinas explicou que antes de trabalhar a terra com equipamento mecanizado produzia num espaço de apenas um hectare, mas actualmente aumentou para cinco hectares, sendo que dois hectares são dedicados a produção de milho e o resto da área para o cultivo de repolho e batata Reno.

Para além de usar as máquinas nas machambas pessoais, presta serviços a outros pequenos agricultores, que lhes cobra cerca de dois mil e quinhentos meticais para lavrar um hectare.

De acordo com Miguel a procura de máquinas tem vindo aumentar. Só na campanha de 2015/16 assistiu cerca de mil e quinhentos pequenos produtores, e na época de 2016/17 houve muita procura porque os camponeses aumentaram os campos de cultivos.“Antes do término da campanha 2016/17 já lavrei mais de 664 hectares e isso faz com que o tractor fique um dia inteiro no campo, enquanto antes só ficávamos 30 minutos. A requisição dos tractores atinge o pico nos meses de Novembro e Dezembro. Por isso, os que tenho não são suficientes para responder a demanda do distrito de Vanduzi”, disse Fabião Miguel, para depois acrescentar que naquela região procura-se muito o tractor e o respectivo semeador. Segundo conta, os produtores que solicitaram os seus serviços nesta época agrária tiveram uma boa produção “Fiz isso para estimular a produção de forma a ter mais clientes. Com esse tipo de compasso conseguimos colher cerca de sete toneladas de “baby corn. No entanto, com o dinheiro que ganho consigo cobrir todas as despesas e ainda pagar os 20 por centos à Agência do Zambeze”.

 

Por seu turno, o director do Serviço Distrital de Actividades Económicas (SDAE), Caetano Benedito, no distrito de Nhamatanda, na província de Sofala, disse que a campanha agrária de 2016/17 começou a preparar-se tendo em conta as chuvas que afectariam aquela região e sensibilizou-se a comunidade para não produzir nas áreas baixas.

Como resultado, planificou para se colher 138 mil hectares para uma produção de 427mil toneladas e neste momento aquele distrito tem uma área colhida de 42 mil hectares numa produção de 139 toneladas de produtos diversos. “Está em campo a cultura de mapira e hortícolas. O nosso distrito produziu muito os cereais. Temos44 tractores fornecidos pela Agência do Zambeze. Há dias estávamos a fazer entrevista a candidatos que pretendem ficar com dez máquinas para o desenvolvimento agrário”.

Segundo o director de SDAE, as áreas preparadas por tractores, a tendência dos camponeses é de aumentar os campos a cada campanha. “Pretendemos alastrar estes serviços de mecanização para mais localidades, porque até o momento os parques que existem só estão nos distritos”, avisou.

Na província da Zambézia, no distrito de Nicoadala, uma região potencialmente produtora de arroz, domingo procurou Horácio Lemos, gestor de máquinas agrícola, na empresa Zambézia Agro-pecuária (ZAP), que só presta serviços da mecanização agrária. Contou-nos que o seu parque tem seis tractores e que na campanha passada lavrou cerca de mil e quinhentos hectares.

Nesta província, os camponeses costumam deixar as actividades para os meses de Novembro e Dezembro, o que tem dificultado na resposta à demanda. Até o ano passado, cobrava pelo serviço cerca três mil meticais por hectare para preparação do  solo e mais dois mil meticais para sementeira.

Para recompensar os custos do tractor e amortizar a dívida com a Agência do Zambeze, temo-nos esforçado mais. Para tal, criamos dois turnos, um de no período da manhã e outro a tarde para o trabalho não ser interrompido”, explicou.

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