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Relatórios cor-de-rosa

Por admin

O “Notícias” escreveu na sua edição de ontem que o Chefe do Estado reprovou o informe sobre a execução do Plano Económico e Social apresentado pelo executivo provincial durante a sua estada em Cabo Delgado. Segundo se relata, o mesmo não foi aceite devido às discrepâncias entre os números na sua posse e os descritos no relatório.

Ao seu estilo, o Presidente privilegia que os responsáveis deixem de circunlóquios e apresentem objectivamente os assuntos e neste caso interpelou vários administradores locais sobre o que esperavam produzir durante a presente safra, e estes apresentaram números contraditórios em relação aos que o Chefe de Estado tinham em mão, tendo alguns denotando um desconhecimento do que os seus distritos têm de produzir.

Umas das coisas que se questiona é saber se, como faz um bom gestor, os interpelados não têm nos seus gabinetes cartilhas onde se destacam as principais tarefas e as principais metas. O PES e a sua execução em cada local e a enumeração do que se fez e do que falta fazer.

No caso da produção agrícola, na abertura da campanha no ano passado em Mocuba pareceu ter ficado claro que uma das principais tarefas para todos é a produção de comida, tendo sido especificado o que cada zona devia produzir, que culturas deviam ser privilegiadas e que metas se devia atingir. Certamente houve mais orientações específicas.

Por isso questionamos como a informação pode chegar ao nível mais baixo se à partida, ao que parece, o próprio administrador não a domina e não está preparado para disseminá-la de maneira eficaz e eficiente?

Esta forma de o Presidente buscar informação verídica e real está a surpreender até os que nos Ministérios e Departamentos Centrais se  acomodavam e se escondiam em relatórios cor-de-rosa elaborados para o momento: serem lidos quando o dirigente máximo de qualquer instituição chegar. Nestes informes, o próprio apresentador não sabe o que está a dizer, mas está convencido que está a agradar o dirigente, uma vez que o informa sobre os sucessos que não existem havidos aqui e ali.

O efeito da interpelação de gestores e dirigentes das áreas está a mostrar outra vertente. Está a mostrar quem conhece de facto o que faz e quem não sabe o que faz. Quem é de facto competente e faz o seu trabalho como deve ser. Conhece as suas metas e as estratégias a usar para lá chegar e quem não sabe nada e está a estorvar o esforço de todos por ele não fazer coisa nenhuma.

Dos relatórios cor-de-rosa, vem-nos o exemplo de um dirigente, há meia dúzia de anos em que apresentou no seu informe, como números efectivos da sua província, aquilo que eram números nacionais duma determinada área. Poucos perceberam o embrulho da situação na altura. Mas, se um dirigente chega a apresentar dados do país como dados provinciais, algo está mal na forma como se elabora os relatórios.

O caso de Cabo Delgado certamente não é o único e andará agora muita gente aflita em acertar relatórios para espelhar apenas a realidade, nada mais além da realidade. Fica a ganhar o distrito, fica a ganhar a província, fica a ganhar o país e ficam a ganhar as nossas estatísticas.

É que temos que colocar de fora dirigentes que têm uma nítida inclinação de  considerarem o poder como um seu património, e caminharmos para uma nova ordem que lhes impõe o poder como serviço, tornando-os na prática empregados do povo ou dos cidadãos. Quando no acto de tomada de posse, o Presidente Nyui afirmou que “o povo é meu patrão” parece que ninguém percebeu o alcance da coisa.

O facto é que o dirigente vai para o poder para resolver os problemas dos outros, para servir o cidadão. Uma das formas de o servir é retratar a realidade seja ela cinzenta e intervir para modificá-la para melhor. Não sozinho, obviamente, mas com aqueles que o problema lhes afecta, porque muitas vezes esses têm as melhores soluções, porque já reflectiram sobre ele várias vezes.

Colorir relatórios só atrasa a solução dos problemas das populações que queremos que sejam resolvidos e atrasa o nosso país. Temos que ter em conta que somos uma população maioritariamente camponesa sobre a qual pesa, predominantemente, o estigma da pobreza e esta população colhe-se, com mais precisão e facilidade, no espaço distrital. Em vez de colorir relatórios, temos, pelo contrário incentivar as pessoas para trabalhar. Da pobreza para o desenvolvimento, sai-se através do trabalho com características de rentabilidade, sejam elas ao nível do empresariado, ao nível cooperativo, familiar ou individual. O trabalho é a causa eficiente da produção, sendo o capital um seu instrumento, se bem que imprescindível. O relatório deve espelhar o trabalho feito, realizado e não sonhos deixados na gaveta. Por isso, precisamos de caminhar com os pés bem assentes na terra.

 

 

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