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Entreguem as armas à Polícia

Por admin

O Governo anunciou esta semana que duzentos guerrilheiros da Renamo já se entregaram, sendo que grande parte são provenientes das províncias de Manica, Sofala, Tete e Zambézia.

Igualmente foi reafirmado que, todos os guerrilheiros, cujo número não é conhecido, uma vez que a Renamo nunca apresentou a sua lista, que se apresentarem às autoridades moçambicanas não serão alvo de qualquer forma de represália e serão reintegrados no quadro do programa de assistência social implementado pelo Ministério dos Combatentes.

Na semana passada, na Assembleia da República, o Executivo reafirmou, através do Ministro do Interior, a sua determinação de prosseguir com os esforços visando o desarmamento dos homens residuais da Renamo tendo em vista a manutenção da paz, ordem, segurança e tranquilidade públicas em todo o território nacional, em prol da liberdade e bem-estar dos moçambicanos. 

Basílio Monteiro disse aos deputados que o desarmamento das forças residuais da Renamo é irreversível e tem em vista recolher todas as armas e artefactos de guerra em mãos alheias e ou na posse das entidades não autorizadas.

No seu entender, a justificação deste partido segundo a qual as suas forças residuais estão protegidas pelo Acordo Geral da Paz (AGP) não faz sentido, tendo aproveitado a ocasião para colocar os pontos nos “is” sobre o assunto.

Segundo afirmou, esta recorrente alegação da Renamo configura um exercício de manipulação de opinião pública, porquanto o número 6 do Protocolo Cinco, do AGP refere-se às garantias específicas para o período que vai do cessar-fogo à realização das eleições de 1994.

 

Em nosso entender e nesta linha de pensamento, os deputados da Renamo que estão na Assembleia da República deviam-se colocar na vanguarda para dissuadir os seus homens armados a entregarem as armas e integrarem-se na sociedade. É que os deputados da “perdiz” agora se colocam numa posição incómoda: fazem debates políticos no Parlamento em nome do povo, em nome da democracia, por um lado, e mantém refém a vontade do povo de ter paz efectiva, porque são um partido político armado, mantendo homens armados nas matas, por outro lado.

Afirmam no pódio do Parlamento que defendem um Estado de Direito, porém no mato, alimentam a existência de um Estado autocrático, controlado através do uso de armas para impor a sua vontade em detrimento da vontade do povo.   

Com efeito, a existência de partidos armados sabotam o caminho rumo à construção plena do Estado de Direito, até lhe inverte a marcha. Como já referimos noutras ocasiões, é que as armas impõem o silêncio ditado pelo vencedor de ocasião, vencedor este que pretende impor o direito da força, recusando a força do direito. Os partidos passam a ser exércitos que se preparam para a guerra. Se se sentam à mesa do diálogo, levam as metralhadoras a tiracolo. A atmosfera envolvente é tecida pelo medo, em vez de favorecer a convivência pacífica. O medo paralisa e destrói, enquanto a convivência pacífica impulsiona a paz e o desenvolvimento. O medo gera a turbulência na sociedade, a convivência pacífica é condição para a construção da liberdade.

Por isso, os próprios deputados da Renamo deviam percorrer de lés a lés, de agora em diante, as matas, convencendo os seus homens a entregarem as armas, de modo a serem reintegrados como moçambicanos que são e que são livres de viverem onde quiserem neste enorme país, respeitando as leis como qualquer um de nós.

Temos, todos nós, que acabar com a actual situação em que a espada substitui o diálogo. Uma Renamo armada atinge gravemente o Estado de Direito plasmado na Constituição da República, Constituição essa que a Renamo aprovou em ambiente de consenso, sendo por isso dever dos seus próprios deputados trazer à razão e à luz aqueles que agem nas trevas e na razão da força. Esta devia ser a preocupação central actual da “perdiz”. Trabalhar no sentido de ser um partido normal, sem armas a tiracolo.

 Depois disso, a outra grande preocupação da Renamo devia ser trabalhar para se apresentar aos moçambicanos como alternativa credível de governação. Trabalhar arduamente, como faz qualquer formação política com princípios democráticos, de modo a, pacificamente, chegar ao poder, se essa for a vontade dos eleitores.

Como referiu semana passada o Ministro do Interior, os princípios fundamentais do Acordo de Roma passaram a fazer parte da filosofia do texto constitucional, e acrescentamos nós que este não é um texto em circuito fechado, mas que admite multiplicidade de interpretações que devem ser feitas em diálogo permanente e constante por todas as forças de cidadania, a começar pela Assembleia da República, órgão legislativo por excelência e constituída de acordo com as regras de qualquer sistema democrático, fundado no sufrágio universal.

Há quem não concorde com este sistema, mas foi o escolhido e até exaltado pelos homens da “perdiz”. A favor do sistema houve consenso no Parlamento e não apenas a maioria de votos dos participantes. Por outro lado, a Renamo (como parece já o fez) pode propor uma revisão constitucional em matérias que achar relevantes e pertinentes.

Os Acordos de Roma tiveram o seu mérito. Tiveram um mérito maior por terem colocado fim aos 16 anos de guerra dilacerante. É tempo de olharmos com olhos bem abertos para o futuro do país, futuro esse que exige grande empenho de todos nós. Exige consensos. Pensar no que queremos que seja Moçambique daqui há 20, 30, 50 anos. O que devemos fazer para chegar lá? O que podemos fazer para que haja confiança e reconciliação nacional, etc. etc.

Gritar sistematicamente a ladainha de Roma, gritar sistematicamente aos quatro ventos pela revisão dos acordos de Roma, como se isso fosse possível e como se estes acordos já não permeassem o texto constitucional que pode ser repensado, acrescentado ou modificado, mas em ambiente de diálogo democrático, parece caminhar para trás. É gritar apenas para enrouquecer.

É tempo de a Renamo trabalhar em projecto de desenvolvimento para o país, a curto, médio e longo prazos. O país não conhece o programa de governação da Renamo. Não sabe o que pensa sobre os grandes problemas nacionais e qual a solução que apresenta para cada um deles. Que soluções para sairmos da pobreza? Que soluções para a Justiça, pedra basilar de toda a convivência democrática e da tranquilidade dos cidadãos? Que soluções para o ensino? Que pensa da liberdade de expressão e de informação? Para onde vai levar a economia? As relações com o empresariado? Como vai encarar o sindicalismo? Que pensa da produtividade, da banca, da necessidade dos investimentos e respectivas fontes, da agricultura, base do sustento nacional, do papel do capital estrangeiro para o desenvolvimento de Moçambique? Que programa para combater a corrupção? Qual o seu pensamento em política externa? Que nos diz sobre a SADC, sobre a União Africana, etc.?

Em relação a algumas destas matérias, a Renamo apenas reage quando elas são levadas a debate pelo Governo no Parlamento e aí então podemos ouvir alguma argumentação renamista. É pouco para um partido que quer ser governo, um dia.

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