Pequenas e médias unidades de processamento de madeira, na região sul do país, vivem momentos de desespero. Em causa está, entre outros factores, uma aparente escassez da principal matéria-prima, a madeira. Fala-se já do encerramento de muitas unidades e outras que, a curto e médio prazos, poderão fechar as portas.
A crise chegou sem aviso prévio. A madeira que era comprada a 600,00 meticais passou a ser vendida a 1300,00 meticais, o que representa um aumento acima de 100 por cento. A prancha de “Pinho” sofreu uma variação de custo numa escala de 300 para 675,00 meticais. O barrote passou de 125 para 375,00 meticais.
A nossa Reportagem foi à rua e junto dos que operam na área procurou saber deles como têm sobrevivido nos últimos tempos. José Amone, por exemplo, um operador de longa data, com uma unidade de processamento localizada no bairro George Dimitrov, vulgo “Benfica”, na qual, há longos anos, processa, faz corte, moldura, plaina e desengrossa madeira, disse-nos que os operadores estão a enfrentar dificuldades no processo de aquisição de madeira que é o principal recurso para a sobrevivência da actividade.
A pouca madeira que chega ao mercado, segundo Amone, tem sido comprada a preços especulativos, alegadamente porque os custos operacionais sofreram um agravamento no mercado.
ATAQUES NO MEIO DA CRISE
Os operadores afirmaram que a crise no processamento da madeira começou com a crise política que o país está a viver desde meados de Abril passado. A obtenção de madeiras como “Umbila”, “Jambirre”, “Chanfuta”, “Pinho” e o “Moco”, que era uma actividade de rotina, tornou-se um “bicho-de-sete-cabeças”.
Uma das razões para o agravamento de custos está relacionada com o receio dos camionistas transportarem aquela matéria-prima e correrem riscos de sofrerem ataques de bandos armados, como ocasionalmente têm vindo a ocorrer ao longo da Estrada Nacional Número Um (EN1), particularmente na região central do país.
No final do mês, temos enormes prejuízos. Cada um desenrasca à sua maneira, desabafou José Amone.
Luís João, dono de um estaleiro de venda de madeira no “Benfica”, disse que recebe aquele recurso extraído com particular incidência nas províncias de Nampula e da Zambézia.
Afiançou-nos que os camionistas não aceitam transportar madeira, porque têm medo de os homens armados atacarem ao longo da EN1, sobretudo na zona de Múxunguè. São poucos os transportadores que se fazem à estrada para adquirir madeira, daí que o preço da matéria-prima que chega ao mercado é fixado tendo em conta esses pressupostos.
Um metro cúbico de madeira, que antes custava 25.000,00 meticais, está agora a ser comercializado a 27.000,00 meticais, um custo que leva os operadores a lançarem “SOS”.
Parar não dá, uma vez que precisamos de alimentar as nossas famílias; temos de sobreviver. Mesmo vendendo pouco, temos de trabalhar, afirmou Luís João.
Carlos Afonso, proprietário de uma carpintaria que existe há cerca de 20 anos no “Benfica”, não esconde o seu desespero face ao que está a acontecer no ramo de actividade que abraçou.
Temos tido dificuldades na aquisição de madeira. Os ataques afectam-nos. O metro cúbico que custava 18 mil agora está a 30 mil meticais. Vamos trabalhando para viver apenas. É diferente de ficar em casa de braços cruzados, comentou Afonso.
Alberto Manjate, importador baseado na zona da Machava, Município da Matola, disse que adquire madeira nas províncias de Manica e da Zambézia, no centro do país.
Conta que aquele ramo de actividade depende de alguma experiência, sob pena de as unidades de processamento de madeira fecharem as portas.
Para o caso concreto da Machava, muitas unidades de processamento encerraram as suas actividades, sendo que algumas optaram por abraçar outros serviços ou as instalações foram vendidas tendo, no mesmo espaço, surgido armazéns ou parques de viaturas.
Este é um negócio que só serve para manter. Não dá para muita coisa. Esta é uma indústria falida, disse Manjate.
Hamed Trace, proprietário da “Olimpic Trading”, uma unidade de processamento de madeira, localizada na Matola, disse que também tem enfrentado dificuldades para adquirir madeira.
Disse-nos que se não tivesse possibilidades para trabalhar a sua unidade já devia ter sido encerrada em Junho do ano passado, período em que a “crise” se agudizou no mercado.
Não estou a conseguir responder às encomendas, sobretudo para fazer portas. Para o caso da mobília, estou a conseguir trabalharporque tinha stock. Quando pergunto aos grandes operadores, eles dizem que a crise é geral, disse o entrevistado.
Euclides Casimiro, um operador que pertence a uma sociedade que se dedica à feitura de esquadrias e mobílias, queixou-se do facto de muitos clientes estarem a “fugir” devido aos elevados preços que estão a ser praticados no mercado.
As dificuldades aumentaram significativamente depois do início dos ataques. Sabemos que tarde ou cedo vamos fechar as portas mas, enquanto isso não acontece, vamos remando contra a maré, comentou Casimiro.
Momed Nassir, director técnico da Fábrica de Móveis Pandora, disse que a sua unidade está a trabalhar “só para manter”. Para nos elucidar referiu que se há 10 anos compravam madeira a preços que variavam entre mil e dois mil meticais, hoje a mesma quantidade está a ser vendida entre 20 e 40 mil meticais.
Daqui a nada a nossa empresa pode fechar porque os problemas são os mesmos que as outras unidades enfrentam. Há que dar atenção às indústrias nacionais. Aqui, nesta área, existiam 10 unidades mas hoje só ficaram duas ou três, afirmou Nassir.
Temos de aprofundar as reais causas
– defende Mateus Matusse, Director Nacional da Indústria
O Director Nacional da Indústria, Mateus Matusse, disse que é necessário realizar um trabalho de aprofundamento sobre as reais causas que poderão estar por detrás da eventual crise no sector de processamento de madeira.
Quanto aos reclamados apoios pelos operadores, Matusse explicou que o Gabinete de Apoio à Pequena Indústria (GAPI) possui uma linha de facilitação financeira que poderá ser requerida pelos interessados.
A fonte acrescentou que está em vigor, no país, um instrumento legal que concede isenção às indústrias processadoras, quando se trate de importar matérias-primas para o desenrolar das suas actividades.
O nosso entrevistado admitiu que alguns operadores podem desconhecer os conteúdos que os instrumentos legais aprovados concedem.
MINAG confirma redução de operadores
O Ministério da Agricultura confirma que, no ano passado, reduziu o número de operadores de exploração de madeira no país, devido à entrada em vigor de novas exigências para aquele tipo de actividade.
Com efeito, ao longo do ano passado, entrou em vigor o Decreto 30/2012, de 1 de Agosto, um dispositivo que define novos requisitos para a exploração florestal em regime de licença simples, bem como os termos, condições e incentivos para o estabelecimento de plantações florestais.
Terá sido, segundo Darlindo Pechisso, da Direcção Nacional de Terras e Florestas, com a entrada em vigor daquele instrumento legal que reduziu o número de operadores ao longo do ano passado.
Entre os vários requisitos inovadores, de acordo com os números 1 e 2, do Artigo 1, do Decreto acima referido, a exploração florestal em regime simples fixa como exigência a apresentação de um plano de maneio para uma área equivalente a 10.000 hectares e a sujeição ao pagamento de uma taxa anual, representando por ano um volume total de 500 metros cúbicos.
Apesar de a nossa floresta ter a capacidade de se auto-repor, o que traz de novo o dispositivo a que nos referimos é o facto de o operador ter de fazer constar no pedido um plano de maneio que contenha indicações sobre as formas de reposição da área concedida.
Apurámos junto da nossa fonte que actualmente estão a ser explorados cerca de 300 mil metros cúbicos por ano, enquanto a meta fixada situa-se na casa dos 516 mil metros cúbicos, o que equivale dizer que a exploração está abaixo do potencial permitido.
O mercado madeireiro está a ressentir-se da carência da principal matéria-prima, mas não é por falta de madeira por explorar na nossa floresta. Nós temos cerca de 26,9 milhões de hectares de floresta, argumentou Pechisso.
De salientar que o mercado de processamento de madeira da zona sul do país tem sido basicamente alimentado pelas regiões centro e norte.
Benjamim Wilson