A maior decepção da recém realizada Conferência do Futebol, é que o encontro pegou nas matérias pela rama. Não se foi às raízes, não por desconhecimento, mas porque, de uma forma geral aquele evento foi mais um reencontro de velhos amigos, uma ocasião para os estudantes das cadeiras do desporto nas faculdades fazerem desfilar as suas teses escolares, do que para se aprofundar e sugerir soluções reais, vividas e enquadradas.
Um tema deveras aliciante e digno de se sair com ideias claras, é a questão arbitragem versus violência nos campos. A reunião apontou os canos para a ineficácia da PRM, bebidas nos recintos desportivos e venda tardia dos bilhetes, como as causas.
De fora ficou a questão central: o suborno aos árbitros, seus compromissos com os poderosos, algo que o grande público não precisa de aprofundar muito para saber que existem.
São factores objectivos que propiciam essa violência e cuja solução passa por medidas corajosas, que impeçam os climas de suspeição que rodeiam os grandes jogos.
Aumentar os efectivos da PRM, envolver a FIR e outras medidas, sem ir ao âmago da questão, é como apagar uma fogueira com gasolina. Afastando simultâneamente os adeptos dos nossos campos.
ARBITRAGEM
NO CENTRO DO FURACÃO
Os males da sociedade em que vivemos, não param à porta do futebol. Bem pelo contrário. Muitos dos espectadores direcionam as suas iras e frustrações para os dias dos jogos, transformando-os em lugares próprios para proferir impropérios e até mesmo fazer demonstração da sua musculatura, em nome da paixão por um clube.
No centro de todo o furacão, com poderes ilimitados que lhe permitem mandar para o desemprego temporário um profissional da bola por umas jornadas ou mesmo decidir a sorte de um jogo já no período de compensações, está um homem que se vestia de preto e que agora já varia a cor do seu equipamento: o árbitro!
Quem deveria ser esta figura, que corresponde ao juiz que para julgar num tribunal, tem que ter formação académica sólida e dar provas de idoneidade moral?
Havia, em tempos, a assumpção de um conjunto de condições para se poder ser árbitro de futebol. Desde logo, mesmo sem ser obrigatório, os juízes vinham de ex-futebolistas, homens de cariz ponderado, conhecedores por dentro dos meandros do jogo da bola. Sabia-se da sua carreira, do seu carácter e da sua vida pessoal, a origem dos seus rendimentos e por aí fora.
Para além disso, havia a questão do seu aspecto físico, a tal ponto que se cultivava um andar pausado mas firme, gestos de autoridade bem ensaiados e uma “higiene vocabular” que desarmava desde logo qual quer “intimidade” com os atletas.
Vêm-me à memória um Abel Bastos na década 60; Arnaldo Salvado (pai), Freitas Branco, Baptista Junior, Gil Milando ou Ricardino Chongola, bem mais recentemente. Tudo gente que amava uma causa, que estudava arbitragem, sabia selecionar as amizades, vivendo longe do clima de suspeições que hoje minam este difícil “métier”.
PSEUDO PROFISSIONALIZAÇÃO?
Na Europa discute-se muito a profissionalização da arbitragem. Tendo em conta os números que por lá circulam, talvez faça algum sentido esse caminho. Por cá, não.
Desde logo a situação estável profissionalmente, deveria ser um dos requisitos obrigatórios para os candidatos a juízes, para lá da sua formação académica. A arbitragem não pode ser um refúgio para desempregados ou para os que mais nada sabem fazer na vida. A par disso, a CNAF e FMF têm que criar um conjunto de regras comportamentais para os juízes, sobretudo em vésperas de grandes jogos. Estou a falar de deslocações integrados nas caravanas das equipas que se vão defrontar, proibição à frequência das instalações dos contendores, declarações sobre as partidas e outras coisas mais.
Dir-me-ão que estas regras apenas são de fachada – e são mesmo – porque se o juiz quiser ser subornado, haverá outras formas bem mais sofisticadas de atingir esse objectivo. Isso é verdade. Mas também não é mesmo correcto que num sector tão sensível como este, para além de se ser íntegro, há também que aparecer junto ao público com essa imagem de integridade.