A investigadora do Centro dos Estudos Estratégicos e Internacionais, Iraê Lundim aconselha as partes em conversações a ter em conta que os moçambicanos estão fartos de viver na incerteza,
pelo que há que olhar com firmeza e seriedade para o diferendo que opõe os dois antigos beligerantes.
Segundo afirmou, neste momento o país vive num regime de excepção pelo que se for necessário, tal como aconteceu nos anos de 1988 a 1992, pode-se dialogar sem se respeitar escrupulosamente a constituição.
“Isso aconteceu entre os anos de 1988 a 1992, veja que nessa altura havia uma Constituição, mas fizemo-lo porque estávamos numa situação anómala. O Estado foi dialogar com a outra parte e não perdeu nada, pelo contrário ganhou uma vez que ganhou a paz. As leis existem sim, mas não é inconstitucional revê-las para o bem dos moçambicanos, disse Iraê Lundim para quem o próprio pacote eleitoral pode ser revisto apesar de ter sido aprovado recentemente,
No seu entender, neste momento, em que as pessoas vivem momentos de aflição, o diálogo afigura-se importante tendo em conta o clima de desespero que abalou os moçambicanos devido aos recentes acontecimentos de Muxúnguè, província de Sofala, que provocaram a morte de cidadãos inocentes e alguns elementos da FIR.
“Acho pertinente este diálogo entre a Frelimo e a Renamo para se atenuar o clima de excepção que vivemos desde os ataques de Muxúnguè, que vieram demonstrar que ao longo dos vinte anos da vigência do AGP ainda não conseguimos desarmar as mentes, sobretudo a tensão entre os protagonistas do acordo quando se aproxima o período eleitoral”, disse Iraê Lundim, reiterando que a Constituição deve ser observada mas não como entrave para se alcançar o consenso.
Sobre a questão dos homens armados da Renamo, a nossa fonte afirmou que tal situação estava prevista num dos protocolos do AGP. “Segundo o líder da Renamo, o presidente Chissano teria dito que não havia condições de se constituir um exército de trinta mil homens, na razão de 50 por cento para cada lado, daí que tenham sido incorporadas poucas pessoas, mas realmente isso está escrito no AGP. Pelo que é preciso avaliar por que é que até hoje a Renamo se sente prejudicada, e isso só é possível com um diálogo sério e frutífero”.
Acrescentou que o acordo previa que os homens fossem incorporados numa força especial para a protecção dos dirigentes da Renamo, acto que não aconteceu, “pelo que se pode discutir para ver qual é a possibilidade de acomoda-los, mesmo que não seja na FIR, uma vez que esta força tem outros atributos”.
Sobre a exigência de paridade na composição da Comissão Nacional de Eleições (CNE), aquela investigadora afirmou que tal situação era desnecessária numa altura que a maioria dos moçambicanos já tem domínio dos processos eleitorais, contudo ressalvou que como forma de salvaguardar o processo democrático devia-se se aceitar a pretensão da Renamo.
“Eles têm a percepção de que as eleições ganham-se na CNE, embora isso seja discutível, mas não vejo nenhum problema de se aceitar esse pedido, até porque a Frelimo não teria nada a perder uma vez que as eleições ganham-se nas assembleias de voto e não nos órgãos eleitorais”,afirmou.
No que diz respeito à distribuição da renda, a nossa interlocutora chama atenção para a necessidade de se respeitar as intervenções do Chefe do Estado nos seus comícios durante as Presidências Abertas, segundo as quais ela ainda vai levar tempo para que se reflicta na vida dos cidadãos.
“Essa questão é interessante porque é verdade que a riqueza que temos não é suficiente de uma maneira global e ainda vai levar tempo, até porque o Presidente Guebuza tem se referido a esse aspecto. Mas também sabemos que os sócios dos grandes empreendimentos são pessoas ligadas à nomenclatura, o que faz surgir uma burguesia ínfima ligada à Frelimo e é aqui onde a Renamo sente-se excluída, então penso que esta discussão também é legítima”,explicou, sublinhando que este partido, diferentemente dos outros, tem responsabilidades acrescidas na construção da democracia multipartidária.
Aliás, segundo ela, “gostemos ou não, foi ela (Renamo) que fez a guerra até se chegar ao AGP e hoje, por voto, tornou-se na segunda força política contra outros tantos que não têm nenhuma expressão, exceptuando o MDM que é a terceira força política, então, não se pode generalizar, até porque este partido tem uma história que lhe liga ao país”.
Em relação à alegada partidarização do Estado, afirmou que, segundo a lei fundamental, os cidadãos podem se filiar aos partidos políticos voluntariamente. “Acho que o que a Renamo pretende assim como os outros partidos é ver as suas bandeiras hasteadas nas suas sedes, ter a liberdade de fazer as suas reuniões sem intimidação. Então penso que neste momento há excesso de zelo por parte de algumas autoridades administrativas, que não percebem bem que na democracia é preciso ter um partido no poder e outros na oposição.”