Somente duas mil viaturas que circulam pelas estradas do país são movidas a gás natural. O governo pretende que a conversão de carros a diesel e gasolina ajude a reduzir a pesada factura de importação de combustíveis fósseis que varia entre 100 e 150 milhões de dólares mensais. Porém, o preço da conversão, receio de explosões, a inexistência de bombas de abastecimento e de oficinas de conversão fora de Maputo está a travar a popularização da iniciativa.
O parque automóvel nacional cresceu em 832 por cento de 1990 a 2012 e já conta com mais de 500 mil viaturas registadas, segundo o Instituto Nacional de Transportes Terrestres (INTT). Entretanto, deste universo, apenas duas mil automóveis, o equivalente a escassos 0.4 por cento, são movidos a gás natural que é um recurso natural abundante no país.
Note-se que especialistas do sector afiançam que Moçambique tem potencial para se tornar no terceiro maior produtor mundial de Gás Natural Liquefeito (GNL), a seguir ao Qatar e Austrália pois, as reservas comprovadas de gás natural em Moçambique rondam 100 Triliões de Pés Cúbicos (TCFs).
Porém, a produção interna deste recurso continua insignificante uma vez que ainda está confinada à exploração do subsolo de Pande e Temane, na província de Inhambane. O consumo nacional também não vai por aí além e a maior parte do gás é exportado para a África do Sul.
Apesar de se reconhecer a importância fulcral que este combustível pode gerar uma poupança que pode chegar aos 66 por cento, o país continua a despender entre 100 e 150 milhões de dólares mensais com a importação de gasolina, diesel, petróleo de iluminação, jet, entre outros produtos petrolíferos.
Informações em nosso poder indicam que do total do combustível importado, estimado em 900 mil metros cúbicos, cerca de 500 mil metros cúbicos (60 por cento) são consumidos na zona Sul do país, com particular incidência para as cidades de Maputo e Matola
Embora o governo se manifeste preocupado com o enorme fardo que a factura de combustíveis representa para o orçamento, os esforços para a popularização do uso de gás natural em viaturas está a ser travado pelo custo alto da conversão dos motores, receios de explosões, falta de oficinas especializadas, inexistência de bombas de abastecimento fora de Maputo, entre outros.
O projecto de conversão foi lançado com popa e circunstância em 2008 e entregue à responsabilidade de seis oficinas mas, passados cerca de nove anos, apenas duas mil viaturas foram convertidas, o que dá uma média de 222 carros por ano, ou seja, só 18 viaturas por mês.Este sistema está a ser implementado em várias partes do mundo e, no caso do Paquistão, por exemplo, já existem mais de 2.5 milhões de veículos movidos a gás natural a que se somam outros milhões que circulam no Irão, Argentina, Brasil. Curioso é que alguns dos países que incentivam o uso do gás veicular nem sequer tem reservas equiparadas às que foram descobertas no nosso país.
CONVERSÃO COMPLEXA
Parte da lentidão que se assiste na transformação das viaturas se deve ao facto do processo ter iniciado com a tentativa de troca de viaturas a diesel que, pouco depois, se concluiu que apresentavam um nível alto de complexidade, pelo que a ideia foi adiada.
Um dos mecânicos envolvidos nessa operação relatou que a troca de diesel para gás pode ser feita, “mas o processo é longo, complexo e oneroso porque primeiro devemos converter o veículo de diesel para gasolina e depois fazemos uma segunda conversão da gasolina para o gás natural”.
Jorge Dimene, mecânico afecto à oficina Auto Dodje, que também faz este tipo de transformações explica que o processo começa com uma pré-avaliação do estado do veículo que só deve ser feita em oficinas especializadas.
É nesta pré-inspecção onde se apreciam as especificações técnicas da viatura e, quem tem uma viatura Mitsubishi Pajero GDI, Toyota Noah, ou carro com motor VVTi, fica a saber que a modificação é, por enquanto, pouco provável. “Também damos explicações prévias sobre o kit que será aplicado, custo do equipamento e da mão-de-obra, entre outros”.
Entre os componentes que são colocados nas viaturas, destacam-se as botijas de gás (os técnicos chamam-lhes cilindros) que podem pesar um mínimo de 68 quilos e um máximo de 123 quilogramas. Por causa destas peças, algumas viaturas devem receber um reforço na suspensão e amortecedores.
Edmundo Matesso, técnico administrativo da Autogás explica também que depois da conversão, e estando em andamento, é possível fazer a mudança da alimentação de gasolina para gás, e vice-versa, através de um interruptor que isola as condutas de cada um dos tipos de combustível. Aliás, os depósitos de gasolina e de gás são independentes.
Em função do kit que é usado que, entre outros, engloba um redutor, válvula de pressão, bico de enchimento, tubo de baixa pressão, fichas dos injectores, colector, tubo alta pressão e o próprio cilindro, número de cilindros e do tipo de viatura, o solicitante desembolsa cerca de 55 mil meticais.Para além disso, a viatura passa a ter um manómetro próprio para o gás e, pesar do novo sistema, os técnicos recomendam que o automobilista abasteça com alguns litros de gasolina para manter os dois activos.
Jorge Dimene refere que as viaturas mais fáceis de converter são as que usam colectores metálicos, pois o trabalho é feito manualmente, ao contrário dos carros chamados sequenciais são mais complexos, pois deve se aplicar injectores de gás no conversor e todo o trabalho é feito com ajuda de computadores.
“Quando o sistema foi lançado convertemos diversas viaturas, principalmente de transporte de passageiros e carrinhas escolares, isso porque sai mais em conta principalmente por causa do preço do gás. Mas agora verificamos uma redução, acreditamos que seja por causa da actual situação que o país está a atravessar”, sublinha.
Conforme apurámos, depois da mudança de sistemas é estipulado um tempo (uma espécie de garantia) que serve para o proprietário habituar-se ao novo sistema, observar o desempenho da viatura, entre outro tipo de acompanhamento.
“Aconselhamos os nossos clientes a tomar algumas medidas de precaução, nomeadamente passar a estacionar a viatura num local arejado, não deixar fechado por muito tempo numa cave e não deixar com vidros totalmente fechados”, aconselha Dimene.
VANTAGENS SEM COMPARAÇÃO
domingo conversou com automobilistas que estão a usar Gás Natural Comprimido (GNC) que se mostraram satisfeitos com o sistema. Um deles é o Vanaldo Chamale, motorista de transporte semi-colectivo de passageiros na rota Baixa-Xipamanine que, apesar de estar a usar o sistema há pouco menos de um mês, considera que este é incomparável.
“A minha despesa com a gasolina reduziu bastante. Agora consigo encher o tanque com 500 ou 700 meticais. É um sistema bom, só peca por nos tirar da rota porque não podemos abastecer em qualquer bomba. Seria muito bom se tivéssemos bombas noutros lugares”.
Por seu turno, Armando Isaías, motorista da rota Costa do Sol-Baixa disse que usa o sistema há mais de um ano e reitera que é muito económico. “É um sistema que facilita na gestão da receita”.
Por seu turno, Samuel Carlos, automobilista particular, disse usar o sistema há dois anos e que a conversão custou-lhe cerca de 50 mil meticais e garante que não se arrepende, pois antes gastava entre 2.500 a 3000 meticais por semana, mas agora usa apenas 600 meticais pelo mesmo número de dias.
“Não se pode comparar as vantagens de usar o gás. É melhor e recomendável, principalmente nesta época de crise que estamos a atravessar. Desde que comecei a usar este tipo de combustível nunca tive problemas. Apenas faço a manutenção de rotina”, disse.
Enquanto isso, Ernesto Dimene, também automobilista particular, afirmou que converteu a sua viatura em 2013 e até ao momento ainda não teve motivos de queixa, pois considera o uso do gás vantajoso, pois gasta cerca de dois mil meticais por mês, quando antes desembolsava 2500 meticais por semana para encher o tanque e percorrer as mesmas distâncias.
“Por exemplo, hoje paguei apenas 519 meticais para encher o cilindro e vou andar durante a semana toda. É algo que não acontecia”. A conversão custou-lhe cerca de 65 mil meticais, mas negociou o pagamento em prestações que só completou depois de um ano. “Valeu a pena”, sublinha.Para a Autogás, empresa que fornece e faz a gestão do gás veicular, deviam ser criados instrumentos legais que obrigassem a todas as instituições públicas a usar viaturas convertidas para estimular a poupança e a servirem de exemplo.
Até ao momento, conforme apontou, o Ministério da Juventude e Desportos manifestou o interesse em converter parte das suas viaturas e os ministérios dos Transportes e da Defesa já usam alguns carros convertidos, assim como o Comando Geral da Polícia da República de Moçambique (PRM) possui 24 viaturas da marca Hyundai convertidas.
Em relação aos receios que muitos automobilistas manifestam para aderir a este sistema, o mecânico Edmundo Matesso afirma que o gás natural é um combustível seguro desde que a viatura seja preparada em oficinas credenciadas e reforça que os acidentes até aqui verificadas na manipulação deste se devem a adaptações feitas por pessoas não competentes.
A Autogás defende que qualquer aumento de postos de abastecimento tem que ser gradual e deve ser feito em função da demanda que, presentemente está a obrigar à construção de um posto na vila de Namaacha e à avaliação as margens da Estrada Circular de Maputo e da Estrada Nacional Número Um.
Por outro lado, está a ser desenhado um projecto no distrito de Chókwè, na província de Gaza, que deverá ser o primeiro fora de Maputo (cidade e província). Conforme nos foi revelado, a aparente lentidão nos trabalhos de expansão dos postos de abastecimento se deve aos valores de investimento que variam entre um milhão a um milhão e meio de dólares americanos.
“Na Matola temos um posto da Autogás que devia ter arrancado no ano passado, mas só a ligação da tubagem anda na ordem de 100 mil dólares. Por isso é preciso acompanhar a evolução dos clientes”, destacou Matesso.
Texto de Angelina Mahumane